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Atenção:

- Decreto extraído do site www.planalto.gov.br. Pode conter anotações pessoais, jurisprudência de tribunais, negritos e realces de texto para fins didáticos.

- Última atualização do texto legal em 02/07/2018.

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Decreto n.º 9.246, de 21 de dezembro de 2017

Concede indulto natalino e comutação de penas e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício da competência privativa que lhe confere o art. 84, caput, inciso XII, da Constituição, e considerando a tradição, por ocasião das festividades comemorativas do Natal, de conceder indulto às pessoas condenadas ou submetidas a medida de segurança e comutar penas de pessoas condenadas, 

DECRETA: 

Art. 1.º  O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido:

I - 1/5 (um quinto) da pena, se não reincidentes, e 1/3 (um terço) da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa;

- Atenção: Vide ADI 5.874/DF e notas abaixo.

II - 1/3 (um terço) da pena, se não reincidentes, e 1/2 (metade) da pena, se reincidentes, nos crimes praticados com grave ameaça ou violência a pessoa, quando a pena privativa de liberdade não for superior a 04 (quatro) anos;

III - 1/2 (metade) da pena, se não reincidentes, e 2/3 (dois terços) da pena, se reincidentes, nos crimes praticados com grave ameaça ou violência a pessoa, quando a pena privativa de liberdade for superior a 04 (quatro) e igual ou inferior a 08 (oito) anos;

IV - 1/4 (um quarto) da pena, se homens, e 1/6 (um sexto) da pena, se mulheres, na hipótese prevista no § 4.º do art. 33 da Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006, quando a pena privativa de liberdade não for superior a 08 (oito) anos;

Notas:

- O inciso trata do chamado "tráfico privilegiado", infração que os Tribunais Superiores tem considerado não equiparada a crime hediondo. Vide notas à Lei de Drogas nesse sentido. Ao julgar o HC n.º 118.533/MS, o STF afastou a hediondez do tráfico cometido nas condições do art. 33,  § 4.º, da Lei n.º 11.343/06. Na mesma linha, o STF cancelou a Súmula n.º 512, que tratava do tema.

- Vide art. 3.º deste Decreto.

V - 1/4 (um quarto) do período do livramento condicional, se não reincidentes, ou 1/3 (um terço), se reincidentes, desde que a pena remanescente, em 25 de dezembro de 2017, não seja superior a 08 (oito) anos, se não reincidentes, e 06 (seis) anos, se reincidentes;

VI - 1/6 (um sexto) da pena, se não reincidentes, ou 1/4 (um quarto), se reincidentes, nos casos de crime contra o patrimônio, cometido sem grave ameaça ou violência a pessoa, desde que haja reparação do dano até 25 de dezembro de 2017, exceto se houver inocorrência de dano ou incapacidade econômica de repará-lo; ou

VII - 03 (três) meses de pena privativa de liberdade, se comprovado o depósito em juízo do valor correspondente ao prejuízo causado à vítima, exceto se houver incapacidade econômica para fazê-lo, no caso de condenação a pena privativa de liberdade superior a 18 (dezoito) meses e não superior a 04 (quatro) anos, por crime contra o patrimônio, cometido sem grave ameaça ou violência a pessoa, com prejuízo ao ofendido em valor estimado não superior a 01 (um) salário mínimo. 

Parágrafo único.  O indulto natalino será concedido às pessoas condenadas a pena privativa de liberdade que, no curso do cumprimento da sua pena, tenham sido vítimas de tortura, nos termos da Lei n.º 9.455, de 7 de abril de 1997, reconhecida por decisão colegiada de segundo grau de jurisdição. 

Notas:

- Vide ADI n.º 5.874/DF: Em medida cautelar o Min. Luís Roberto Barroso, do STF, suspendeu em parte a incidência de parte do presente Decreto Presidencial. Ao ser reiterada a cautelar delineou, dentre outros pontos, as seguintes determinações (proferida em 12/03/2018, disponível no endereço http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313902271&tipoApp=.pdf):

"(i) suspender do âmbito de incidência do Decreto nº 9.246/2017 os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP, tendo em vista que o elastecimento imotivado do indulto para abranger essas hipóteses viola de maneira objetiva o princípio da moralidade, bem como descumpre os deveres de proteção do Estado a valores e bens jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal;

(ii) determinar que, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 1º do Decreto nº 9.246/2017, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos, balizas que condicionam a interpretação do inciso I do §1º do art. 2º do Decreto nº 9.246/2017;

(iii) suspender o art. 10 do Decreto nº 9.246/2017, que trata do indulto da multa, por violação ao princípio da moralidade, ao princípio da separação dos Poderes e desviar-se das finalidades do instituto do indulto, ressalvadas as hipóteses de (a) extrema carência material do apenado (que nem sequer tenha tido condições de firmar compromisso de parcelamento do débito, na forma da legislação de regência); ou (b) de valor da multa inferior ao mínimo fixado em ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União (atualmente disposto inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22.03.2012, do Ministro da Fazenda);

(iv) suspender o art. 8º, I e III, do Decreto nº 9.246/2017, que estabelecem a aplicabilidade do indulto àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados pela suspensão condicional do processo, em razão da incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio da separação dos Poderes;

(v) suspender o art. 11, II, do Decreto nº 9.246/2017, por conceder indulto na pendência de recurso da acusação e antes, portanto, da fixação final da pena, em violação do princípio da razoabilidade e da separação dos Poderes" (Grifei).

- Atualização: a ADI n.º 5.874 acima indicada foi julgada improcedente. Vide nota abaixo.

Jurisprudência:

01) Indulto Natalino - Dec. n.º 9.246/2017 - Constitucionalidade - Mecanismo de freios e contrapesos - Instituto não é instrumento de política criminal - Observância aos parâmetros constitucionais:

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

02) Indulto - Crime hediondo e crime comum - Possibilidade - Apuração do prazo tem como data-base o início da execução:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. COMUTAÇÃO. DECRETO Nº 9.246/2017. NECESSIDADE DE 2/3 DOS DELITOS HEDIONDOS. 1/3 DOS DELITOS COMUNS. CALCULO DESDE O INICIO DO CUMPRIMENTO DA PENA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. O Decreto Presidencial refere a necessidade do cumprimento da fração de 2/3 (dois terços) do total de pena correspondente aos delitos impeditivos, mais 1/3 (um terço) da pena dos delitos comuns. Ainda, destaco que a alteração da data-base não interfere na contagem de prazo para fins de indulto ou comutação da pena, devendo ser realizado o cálculo da benesse com base na data do início do cumprimento da reprimenda. O apenado preencheu os requisitos exigidos em 20/08/2014, importando decretar a comutação da pena com base no art. 7°, inciso I, do Decreto nº 9.246/2017. AGRAVO DEFENSIVO PROVIDO. DECISÃO REFORMADA. (Agravo Nº 70078362456, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rinez da Trindade, Julgado em 03/10/2018)

03) Indulto - Não cumprimento de 1/3 do livramento condicional até a publicação do Decreto - Vedação:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INDULTO E COMUTAÇÃO. DECRETO PRESIDENCIAL Nº 9.246/2017. REQUISITO OBJETIVO. Não atendendo o apenado o requisito objetivo para obtenção do indulto (cumprimento de um terço do período do livramento condicional até a data de publicação do decreto), não faz jus à concessão do benefício. Tendo sido beneficiado anteriormente com a comutação de pena, não faz jus o apenado a nova concessão do benefício, nos termos da regra contida no parágrafo único do artigo 7º do Decreto Presidencial n. 9.246/2017. AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo Nº 70078868759, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em 03/10/2018)

04) Indulto - Tráfico de entorpecentes - Delito com reconhecimento da privilegiadora do art. 33, § 4.º, da Lei de Drogas - Cabimento do indulto - Hediondez afastada:

Notícias do STF – Publicada em 19/06/2019 - 18h10

Ministro afasta decisão que negava indulto a condenado por tráfico privilegiado

Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, decisão do TJ-SP afrontou jurisprudência do STF no sentido de que o delito tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda.

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), julgou procedente a Reclamação (RCL) 34158, ajuizada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE-SP) contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que havia negado o indulto a um sentenciado por tráfico privilegiado sob o argumento da inconstitucionalidade da concessão do benefício em tal hipótese. Por ter verificado ofensa à jurisprudência do STF sobre a matéria, o ministro concedeu habeas corpus de ofício (por iniciativa do juiz) para que o juízo da execução conceda o benefício se o condenado tiver preenchido os demais requisitos do Decreto 9.246/2017, que trata do indulto natalino e da comutação de penas.

No Supremo, a Defensoria estadual alegou que o acórdão da 8ª Câmara Criminal do TJ-SP violou a Súmula Vinculante (SV) 10 do STF, que trata da reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição da República. Segundo o verbete, órgãos fracionários de tribunais não podem afastar a incidência de lei ou de ato normativo do Poder Público, ainda que não declarem expressamente a sua inconstitucionalidade. O dispositivo constitucional, por sua vez, determina que somente pelo voto da maioria absoluta de seus integrantes ou dos membros do respectivo órgão especial os tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público.

Decisão

O ministro Ricardo Lewandowski verificou no caso evidente a violação à SV 10, uma vez que órgão fracionário do TJ-SP, embora não tenha declarado expressamente a inconstitucionalidade do decreto de indulto, afastou sua aplicação no caso condenação por tráfico tratada nos autos com fundamento em afronta à Constituição Federal.

Segundo o relator, houve ainda outra afronta à jurisprudência do STF, pois, no julgamento do HC 118533, o Plenário firmou orientação no sentido de afastar a natureza hedionda do tráfico privilegiado de drogas (situação em que o agente é primário, possui bons antecedentes, não se dedica à atividade criminosa nem integra organização criminosa). Os crimes hediondos, previstos na Lei 8.072/1990, e os equiparados (tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo) são inafiançáveis e insuscetíveis de anistia, graça ou indulto. Com o entendimento fixado pelo STF, não recai sobre as condenações por tráfico privilegiado as restrições aplicáveis aos delitos hediondos, podendo, portanto, ser deferido o indulto.

Processo relacionado: Rcl 34158

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=414524&tip=UN)

Art. 1.º

Art. 2.º  O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1.º será reduzido para a pessoa:

I - gestante;

II - com idade igual ou superior a 70 anos;

III - que tenha filho de até 14 anos de idade ou de qualquer idade, se pessoa com doença crônica grave ou com deficiência, que necessite de seus cuidados;

IV - que tenha neto de até 14 anos de idade ou de qualquer idade, se pessoa com deficiência, que necessite de seus cuidados e esteja sob a sua responsabilidade;

V - que esteja cumprindo pena ou em livramento condicional e tenha frequentado, ou esteja frequentando, curso de ensino fundamental, médio, superior, profissionalizante ou de requalificação profissional, reconhecido pelo Ministério da Educação, ou que tenha exercido trabalho, no mínimo por 12 meses, nos 03 (três) anos contados retroativamente a 25 de dezembro de 2017;

VI - com paraplegia, tetraplegia ou cegueira adquirida posteriormente à prática do delito, comprovada por laudo médico oficial, ou, na falta do laudo, por médico designado pelo juízo da execução;

VII - com paraplegia, tetraplegia, cegueira ou neoplasia maligna, ainda que em remissão, mesmo que tais condições sejam anteriores à prática do delito, comprovadas por laudo médico oficial ou, na falta do laudo, por médico designado pelo juízo da execução, e resulte em grave limitação de atividade ou exija cuidados contínuos que não possam ser prestados no estabelecimento penal;

VIII - acometida de doença grave e permanente, que apresente grave limitação de atividade ou que exija cuidados contínuos que não possam ser prestados no estabelecimento penal, desde que comprovada por laudo médico oficial, ou, na falta do laudo, por médico designado pelo juízo da execução; ou

IX - indígena, que possua Registro Administrativo de Nascimento de Indígenas ou outro documento comprobatório equivalente. 

§ 1.º  A redução de que trata o caput será de:

I - 1/6 (um sexto) da pena, se não reincidente, e 1/4 (um quarto) da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1.º;

- Atenção: Vide ADI 5.874/DF e notas abaixo.

II - 1/4 (um quarto) da pena, se não reincidente, e 1/3 (um terço) da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso II do caput do art. 1.º; e

III - 1/3 (um terço) da pena, se não reincidente, e 1/2 (metade) da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso III do caput do art. 1.º. 

§ 2.º  As hipóteses previstas nos incisos III e IV do caput não incluem as pessoas condenadas por crime praticado com violência ou grave ameaça contra o filho ou o neto ou por crime de abuso sexual cometido contra criança, adolescente ou pessoa com deficiência. 

 

Notas:

- Vide ADI n.º 5.874/DF: Em medida cautelar o Min. Luís Roberto Barroso, do STF, suspendeu em parte a incidência de parte do presente Decreto Presidencial. Ao ser reiterada a cautelar delineou, dentre outros pontos, as seguintes determinações (proferida em 12/03/2018, disponível no endereço http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313902271&tipoApp=.pdf):

"(i) suspender do âmbito de incidência do Decreto nº 9.246/2017 os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP, tendo em vista que o elastecimento imotivado do indulto para abranger essas hipóteses viola de maneira objetiva o princípio da moralidade, bem como descumpre os deveres de proteção do Estado a valores e bens jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal;

(ii) determinar que, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 1º do Decreto nº 9.246/2017, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos, balizas que condicionam a interpretação do inciso I do §1º do art. 2º do Decreto nº 9.246/2017;

(iii) suspender o art. 10 do Decreto nº 9.246/2017, que trata do indulto da multa, por violação ao princípio da moralidade, ao princípio da separação dos Poderes e desviar-se das finalidades do instituto do indulto, ressalvadas as hipóteses de (a) extrema carência material do apenado (que nem sequer tenha tido condições de firmar compromisso de parcelamento do débito, na forma da legislação de regência); ou (b) de valor da multa inferior ao mínimo fixado em ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União (atualmente disposto inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22.03.2012, do Ministro da Fazenda);

(iv) suspender o art. 8º, I e III, do Decreto nº 9.246/2017, que estabelecem a aplicabilidade do indulto àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados pela suspensão condicional do processo, em razão da incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio da separação dos Poderes;

(v) suspender o art. 11, II, do Decreto nº 9.246/2017, por conceder indulto na pendência de recurso da acusação e antes, portanto, da fixação final da pena, em violação do princípio da razoabilidade e da separação dos Poderes" (Grifei).

- Atualização: a ADI n.º 5.874 acima indicada foi julgada improcedente. Vide nota abaixo.

Jurisprudência:

01) Indulto Natalino - Dec. n.º 9.246/2017 - Constitucionalidade - Mecanismo de freios e contrapesos - Instituto não é instrumento de política criminal - Observância aos parâmetros constitucionais:

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

Art. 2.º

Art. 3.º  O indulto natalino ou a comutação de pena não será concedido às pessoas condenadas por crime:

I - de tortura ou terrorismo;

II - tipificado nos art. 33, caput e § 1.º, art. 34, art. 36 e art. 37 da Lei n.º 11.343, de 2006, exceto na hipótese prevista no art. 1.º, caput, inciso IV, deste Decreto;

III - considerado hediondo ou a este equiparado, ainda que praticado sem grave ameaça ou violência a pessoa, nos termos da Lei n.º 8.072, de 25 de julho de 1990;

IV - praticado com violência ou grave ameaça contra os militares e os agentes de segurança pública, de que tratam os art. 142 e art. 144 da Constituição, no exercício da função ou em decorrência dela;

V - tipificado nos art. 240, art. 241 e art. 241-A, caput e § 1.º, da Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990; ou

VI - tipificado nos art. 215, art. 216-A, art. 218 e art. 218-A do Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal. 

 

Legislação correlata:

- Vide: Art. 5.º, inc. XLIII, "d", da CF/88.

Jurisprudência:

01) Indulto/comutação - Delito de associação para o narcotráfico - Vedação:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INDULTO OU COMUTAÇÃO. ART. 44, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 11.343/06. EXPRESSA VEDAÇÃO LEGAL. 1. Ainda que o Decreto nº 9.246/2017 não repita a vedação expressa de concessão de indulto ou comutação aos condenados pelo crime de associação para o tráfico, a lei ordinária impede a concessão de graça (indulto ou comutação, portanto) aos presos que estejam a cumprir pena pelo cometimento do crime previsto no artigo 35 da Lei nº 11.343/06. Inteligência do artigo 44 do mesmo diploma legal. 2. O STF, em recente julgado, entendeu que afastar a incidência do artigo 44 da Lei de Drogas afronta a cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). 3. Não é defeso ao legislador ordinário agravar o cumprimento das penas, independente de qual seja o crime. Assim, a vedação de concessão de indulto ou comutação não é restrita aos delitos equiparados a hediondo. Diante de previsão normativa expressa, que não se configura inconstitucional, é devida a aplicação do artigo 44, parágrafo único, da Lei de Drogas no caso concreto. AGRAVO DESPROVIDO (Agravo Nº 70077995157, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: JAYME WEINGARTNER NETO, Julgado em 08/08/2018)

AGRAVO EM EXECUÇÃO (ARTIGO 197 DA LEP). TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INDULTO. INCONFORMISMO DEFENSIVO. Com efeito, ainda que o Decreto Presidencial n° 9.246/17 não tenha referido especificamente vedação à concessão de benesses como indulto ou comutação, não podemos olvidar o disposto no artigo 44, da Lei n° 11.343/06, oportunidade em que também se veda a concessão de tais benefícios a quem comete o delito previsto no artigo 35 da Lei n° 11.343/06. Assim sendo, tendo o agravado sido condenado pela prática de, além de tráfico de drogas, crime de associação, não faz jus à concessão do indulto e/ou comutação de sua pena, diante de vedação legal contida no artigo 44, da Lei nº 11.343/06. Destaca-se, ainda, que, apesar de não ser considerado crime hediondo, o crime de associação para o tráfico é potencialmente muito mais lesivo à sociedade, pois, diferentemente do tráfico desarticulado, atinge a sociedade em larga escala, de forma organizada e, por conseguinte, com consequências mais gravosas. De resto, na forma do artigo 12 do Decreto nº 9.246/17: As penas correspondentes a infrações diversas serão unificadas ou somadas para efeito da declaração do indulto natalino ou da comutação, na forma do art. 111 da Lei nº 7.210, de 1984 . Na soma das penas, o agravante não cumpriu o requisito para o pedido subsidiário formulado (indulto/comutação da pena restrita ao delito previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/03). AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo Nº 70078930724, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 27/09/2018)

 

02) STF declara constitucional o Decreto n.º 9.246/2017 - Indulto natalino - Impossibilidade de concessão a crimes hediondos, de tortura, terrorismo e tráfico de entorpecentes:

 

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

03) Indulto - Tráfico de entorpecentes - Delito com reconhecimento da privilegiadora do art. 33, § 4.º, da Lei de Drogas - Cabimento do indulto - Hediondez afastada:

Notícias do STF – Publicada em 19/06/2019 - 18h10

Ministro afasta decisão que negava indulto a condenado por tráfico privilegiado

Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, decisão do TJ-SP afrontou jurisprudência do STF no sentido de que o delito tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda.

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), julgou procedente a Reclamação (RCL) 34158, ajuizada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE-SP) contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que havia negado o indulto a um sentenciado por tráfico privilegiado sob o argumento da inconstitucionalidade da concessão do benefício em tal hipótese. Por ter verificado ofensa à jurisprudência do STF sobre a matéria, o ministro concedeu habeas corpus de ofício (por iniciativa do juiz) para que o juízo da execução conceda o benefício se o condenado tiver preenchido os demais requisitos do Decreto 9.246/2017, que trata do indulto natalino e da comutação de penas.

No Supremo, a Defensoria estadual alegou que o acórdão da 8ª Câmara Criminal do TJ-SP violou a Súmula Vinculante (SV) 10 do STF, que trata da reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição da República. Segundo o verbete, órgãos fracionários de tribunais não podem afastar a incidência de lei ou de ato normativo do Poder Público, ainda que não declarem expressamente a sua inconstitucionalidade. O dispositivo constitucional, por sua vez, determina que somente pelo voto da maioria absoluta de seus integrantes ou dos membros do respectivo órgão especial os tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público.

Decisão

O ministro Ricardo Lewandowski verificou no caso evidente a violação à SV 10, uma vez que órgão fracionário do TJ-SP, embora não tenha declarado expressamente a inconstitucionalidade do decreto de indulto, afastou sua aplicação no caso condenação por tráfico tratada nos autos com fundamento em afronta à Constituição Federal.

Segundo o relator, houve ainda outra afronta à jurisprudência do STF, pois, no julgamento do HC 118533, o Plenário firmou orientação no sentido de afastar a natureza hedionda do tráfico privilegiado de drogas (situação em que o agente é primário, possui bons antecedentes, não se dedica à atividade criminosa nem integra organização criminosa). Os crimes hediondos, previstos na Lei 8.072/1990, e os equiparados (tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo) são inafiançáveis e insuscetíveis de anistia, graça ou indulto. Com o entendimento fixado pelo STF, não recai sobre as condenações por tráfico privilegiado as restrições aplicáveis aos delitos hediondos, podendo, portanto, ser deferido o indulto.

Processo relacionado: Rcl 34158

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=414524&tip=UN)

 

04) Comutação - Dec. n.º 9.246/2017 não trouxe restrição quanto ao regime de cumprimento da pena em curso (fechado ou semiaberto):

DIREITO PENAL  -  REsp 1.828.409-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 01/10/2019, DJe 08/10/2019  (Informativo n.º 659 do STJ - Sexta Turma)

Indulto. Decreto presidencial n.º 9.246/2017. Regime semiaberto ou fechado. Ausência de restrição.

O Decreto n. 9.246/2017 não traz nenhuma ressalva ao regime de cumprimento de pena quando dispõe sobre a comutação aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade.

Inicialmente cumpre salientar que o indulto e a comutação, no ordenamento pátrio, não estão restritos apenas a fundamentos humanitários e costumam ser previstos anualmente, de forma coletiva, como verdadeiro instrumento de política criminal colocado à disposição do Presidente da República, segundo sua conveniência. O perdão das penas é, então, ato discricionário associado, comumentemente, ao combate ao hiperencarceramento, com vistas ao retorno do preso ao convívio social. No Decreto Presidencial n. 9.246/2017, foi concedida a comutação às pessoas condenadas a pena privativa de liberdade em 1/4, se reincidentes, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido 1/3 da pena. Não houve nenhuma ressalva ou especificação do regime prisional em curso. Consta do regramento, tão somente, que o benefício não alcançaria os sentenciados por crimes elencados no art. 3.° ou que não preenchessem o requisito subjetivo do art. 4.°. Conquanto o indulto e a comutação coletivos tenham por finalidade combater a lotação nos presídios e propiciar que encarcerados retornem ao convívio social, o Decreto Presidencial n. 9.246/2017 incluiu como beneficiado (e não restringiu) aquele sentenciado que não estava em situação de reclusão. Mesmo com a reinserção já estimulada por outros meios (penas substitutivas, regime aberto, livramento condicional e suspensão condicional do processo) e sem motivo humanitário, as pessoas descritas no art. 8° também foram agraciadas com o perdão. Ao incluir na previsão legal as pessoas que estão em liberdade ou bastante próximas de sua obtenção, o Presidente da República não vedou, via reversa, o benefício aos reeducandos dos regimes semiaberto e fechado. Assim, o art. 8.° do Decreto n. 9.246/2017 é norma inclusiva e não proibitiva.

Art. 3.º

Art. 4.º  O indulto natalino ou a comutação não será concedido às pessoas que:

I - tenham sofrido sanção, aplicada pelo juízo competente em audiência de justificação, garantido o direito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão da prática de infração disciplinar de natureza grave, nos 12 (doze) meses anteriores à data de publicação deste Decreto;

II - tenham sido incluídas no Regime Disciplinar Diferenciado, em qualquer momento do cumprimento da pena;

III - tenham sido incluídas no Sistema Penitenciário Federal, em qualquer momento do cumprimento da pena, exceto na hipótese em que o recolhimento se justifique por interesse do próprio preso, nos termos do art. 3.º da Lei n.º 11.671, de 8 de maio de 2008; ou

IV - tenham descumprido as condições fixadas para a prisão albergue domiciliar, com ou sem monitoração eletrônica, ou para o livramento condicional, garantido o direito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 

§ 1.º  Na hipótese de a apuração da infração disciplinar não ter sido concluída e encaminhada ao juízo competente, o processo de declaração do indulto natalino ou da comutação será suspenso até a conclusão da sindicância ou do procedimento administrativo, que ocorrerá no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de prosseguimento do processo e efetivação da declaração. 

§ 2.º  Decorrido o prazo a que se refere o § 1.º sem que haja a conclusão da apuração da infração disciplinar, o processo de declaração do indulto natalino ou da comutação prosseguirá. 

Legislação correlata:

- Vide: Art. 187 e seguintes da LEP.

- Vide: RDP/RS.

- Vide: Arts. 83 a 88 do Código Penal.

Jurisprudência:

01) Descumprimento das condições do livramento condicional - Comutação - Impossibilidade:

AGRAVO EM EXECUÇÃO (ART. 197 DA LEP). DECRETO N° 9.246/17. DESCUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES DO LIVRAMENTO CONDICIONAL. COMUTAÇÃO. INVIABILIDADE. INCONFORMISMO DEFENSIVO. Como se pode observar, o pedido de comutação formulado pela defesa não merece prosperar, uma vez que o apenado, durante o gozo do livramento condicional, se envolveu em novo delito, tendo o benefício revogado. Em que pese as alegações defensivas, tenho que o disposto no artigo 4°, inciso IV, do Dec. n° 9.246/17 se aplica ao caso dos autos, na medida em que não se exige que o descumprimento seja recente e nem importa qual tenha sido a forma de descumprimento da benesse. No caso dos autos, o apenado teria sido agraciado com livramento condicional em 2013, sendo posteriormente suspenso e revogado o benefício, em virtude de ter se envolvido em novo delito. Além disso, o agravante já restou beneficiado com comutação de sua pena em virtude de Decreto anterior, o que também impede seja novamente beneficiado, nos termos do artigo 7º, parágrafo único, do Decreto n° 9.246/17. Assim, não faz jus ao benefício da comutação. AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo Nº 70078391752, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 27/09/2018)

02) Revogação do livramento condicional obsta a concessão do indulto:

INDULTO. PENA TOTAL SUPERIOR A OITO ANOS, IMPOSSIBILIDADE. LIVRAMENTO CONDICIONAL REVOGADO. INDEFERIMENTO MANTIDO. O agravado não faz jus ao benefício do indulto por não preencher dois requisitos da lei: sua pena é superior a oito anos e já teve o livramento condicional revogado. Este é pensamento da Câmara a respeito: “Ainda que o apenado também esteja cumprindo pena pela prática de crime de tráfico privilegiado, a soma das condenações enseja pena superior a oito anos, inviabilizando o benefício nos termos do artigo 1º, IV, do Decreto 9.246/2017.” (Agravo 70077358174). ”A revogação do livramento condicional do agravante, como aconteceu, afasta a possibilidade da concessão da comutação. O Decreto 9.246 não estabelece nenhum prazo a limitar a restrição ao benefício. Ou seja, não importa em que período ocorreu a revogação mencionada, sempre a situação afastará a concessão da benesse referida.” (Agravo 70078701208). DECISÃO: Agravo defensivo desprovido. Unânime.(Agravo, Nº 70080314230, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em: 20-02-2019)

03) Comutação - Dec. n.º 9.246/2017 não trouxe restrição quanto ao regime de cumprimento da pena em curso (fechado ou semiaberto):

DIREITO PENAL  -  REsp 1.828.409-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 01/10/2019, DJe 08/10/2019  (Informativo n.º 659 do STJ - Sexta Turma)

Indulto. Decreto presidencial n.º 9.246/2017. Regime semiaberto ou fechado. Ausência de restrição.

O Decreto n. 9.246/2017 não traz nenhuma ressalva ao regime de cumprimento de pena quando dispõe sobre a comutação aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade.

Inicialmente cumpre salientar que o indulto e a comutação, no ordenamento pátrio, não estão restritos apenas a fundamentos humanitários e costumam ser previstos anualmente, de forma coletiva, como verdadeiro instrumento de política criminal colocado à disposição do Presidente da República, segundo sua conveniência. O perdão das penas é, então, ato discricionário associado, comumentemente, ao combate ao hiperencarceramento, com vistas ao retorno do preso ao convívio social. No Decreto Presidencial n. 9.246/2017, foi concedida a comutação às pessoas condenadas a pena privativa de liberdade em 1/4, se reincidentes, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido 1/3 da pena. Não houve nenhuma ressalva ou especificação do regime prisional em curso. Consta do regramento, tão somente, que o benefício não alcançaria os sentenciados por crimes elencados no art. 3.° ou que não preenchessem o requisito subjetivo do art. 4.°. Conquanto o indulto e a comutação coletivos tenham por finalidade combater a lotação nos presídios e propiciar que encarcerados retornem ao convívio social, o Decreto Presidencial n. 9.246/2017 incluiu como beneficiado (e não restringiu) aquele sentenciado que não estava em situação de reclusão. Mesmo com a reinserção já estimulada por outros meios (penas substitutivas, regime aberto, livramento condicional e suspensão condicional do processo) e sem motivo humanitário, as pessoas descritas no art. 8° também foram agraciadas com o perdão. Ao incluir na previsão legal as pessoas que estão em liberdade ou bastante próximas de sua obtenção, o Presidente da República não vedou, via reversa, o benefício aos reeducandos dos regimes semiaberto e fechado. Assim, o art. 8.° do Decreto n. 9.246/2017 é norma inclusiva e não proibitiva.

Art. 5.º  O indulto natalino especial será concedido às mulheres presas, nacionais e estrangeiras, que, até 25 de dezembro de 2017, atendam aos seguintes requisitos, cumulativamente:

I - não estejam respondendo ou tenham sido condenadas pela prática de outro crime cometido mediante violência ou grave ameaça;

II - não tenham sido punidas com a prática de falta grave, nos 12 (doze) meses anteriores à data de publicação deste Decreto; e

III - se enquadrem em uma das seguintes hipóteses, no mínimo:

a) mulheres condenadas à pena privativa de liberdade por crimes cometidos sem grave ameaça ou violência a pessoa, que tenham completado 60 (sessenta) anos de idade ou que não tenham 21 (vinte e um) anos completos;

b) mulheres condenadas por crime praticado sem grave ameaça ou violência a pessoa, que sejam consideradas pessoas com deficiência, nos termos do art. 2.º da Lei n.º 13.146, de 6 de julho de 2015; ou

c) gestantes cuja gravidez seja considerada de alto risco, condenadas à pena privativa de liberdade, desde que comprovada a condição por laudo médico emitido por profissional designado pelo juízo competente. 

Art. 5.º

Art. 6.º  O indulto natalino será concedido às pessoas submetidas a medida de segurança que, independentemente da cessação de periculosidade, tenham suportado privação da liberdade, internação ou tratamento ambulatorial:

I - por período igual ou superior ao máximo da pena cominada à infração penal correspondente à conduta praticada; ou

II - nos casos da substituição prevista no art. 183 da Lei n.º 7.210, de 11 de julho de 1984, por período igual ao remanescente da condenação cominada. 

Parágrafo único.  A decisão que extinguir a medida de segurança, com o objetivo de reinserção psicossocial, determinará:

I - o encaminhamento a Centro de Atenção Psicossocial ou a outro serviço equivalente na localidade em que a pessoa com transtornos mentais em conflito com a lei se encontre, previamente indicado no Projeto Terapêutico Singular, em conformidade com os princípios da Rede de Atenção Psicossocial, instituída pela Portaria n.º 3.088, de 23 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde;

II - o acolhimento em serviço residencial terapêutico, nos termos da Portaria n.º 3.088, de 2011, do Ministério da Saúde, previamente indicado no Projeto Terapêutico Singular, hipótese em que a Secretaria de Saúde do Município em que a pessoa com transtornos mentais em conflito com a lei se encontre será intimada para dar efetividade ao Projeto Terapêutico Singular ou, subsidiariamente, a Secretaria de Saúde do Estado;

III - o cumprimento do projeto terapêutico singular para a alta planejada e a reabilitação psicossocial assistida, quando houver a indicação de internação hospitalar, por critérios médicos ou por ausência de processo de desinstitucionalização, nos termos estabelecidos no art. 5.º da Lei n.º 10.216, de 6 de abril de 2001; e

IV - a ciência ao Ministério Público estadual ou do Distrito Federal e Territórios da localidade em que a pessoa com transtornos mentais em conflito com a lei se encontre, para acompanhamento da inclusão do paciente em tratamento de saúde e para avaliação de sua situação civil, nos termos estabelecidos na Lei n.º 13.146, de 2015

Art. 6.º

​​Art. 7.º  A comutação da pena privativa de liberdade remanescente, aferida em 25 de dezembro de 2017, será concedida, nas seguintes proporções:

I - à pessoa condenada a pena privativa de liberdade:

a) em 1/3 (um terço), se não reincidente, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenha cumprido 1/4 (um quarto) da pena; e

b) em 1/4 (um quarto), se reincidente, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenha cumprido 1/3 (um terço) da pena;

II - em 2/3 (dois terços), se não reincidente, quando se tratar de mulher condenada por crime cometido sem grave ameaça ou violência a pessoa, que tenha filho ou neto menor de 14 (quatorze) anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que necessite de seus cuidados, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenha cumprido 1/5 (um quinto) da pena; e

III - à 1/2 (metade), se reincidente, quando se tratar de mulher condenada por crime cometido sem grave ameaça ou violência a pessoa, que tenha filho ou neto menor de 14 (quatorze) anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que necessite de seus cuidados, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenha cumprido 1/5 (um quinto) da pena. 

Parágrafo único.  A comutação a que se refere o caput será concedida às pessoas condenadas à pena privativa de liberdade que não tenham, até 25 de dezembro de 2017, obtido as comutações decorrentes de Decretos anteriores, independentemente de pedido anterior. 

 

Nota:

- Pessoa que já tenha obtido comutação com base em Decreto Presidencial anterior não podem ser agraciadas com a benesse.

Jurisprudência:

01) Comutação - Vedação aqueles apenados que já tenham obtido o benefício:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INDULTO E COMUTAÇÃO. DECRETO PRESIDENCIAL Nº 9.246/2017. REQUISITO OBJETIVO. Não atendendo o apenado o requisito objetivo para obtenção do indulto (cumprimento de um terço do período do livramento condicional até a data de publicação do decreto), não faz jus à concessão do benefício. Tendo sido beneficiado anteriormente com a comutação de pena, não faz jus o apenado a nova concessão do benefício, nos termos da regra contida no parágrafo único do artigo 7º do Decreto Presidencial n. 9.246/2017. AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo Nº 70078868759, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em 03/10/2018)

Art. 7.º

Art. 8.º  Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que:

I - teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos;

- Atenção: Vide ADI 5.874/DF e notas abaixo.

II - esteja cumprindo a pena em regime aberto;

III - tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou

- Atenção: Vide ADI 5.874/DF e notas abaixo.

IV - esteja em livramento condicional. 

 

Notas:

- Vide ADI n.º 5.874/DF: Em medida cautelar o Min. Luís Roberto Barroso, do STF, suspendeu em parte a incidência de parte do presente Decreto Presidencial. Ao ser reiterada a cautelar delineou, dentre outros pontos, as seguintes determinações (proferida em 12/03/2018, disponível no endereço http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313902271&tipoApp=.pdf):

"(i) suspender do âmbito de incidência do Decreto nº 9.246/2017 os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP, tendo em vista que o elastecimento imotivado do indulto para abranger essas hipóteses viola de maneira objetiva o princípio da moralidade, bem como descumpre os deveres de proteção do Estado a valores e bens jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal;

(ii) determinar que, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 1º do Decreto nº 9.246/2017, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos, balizas que condicionam a interpretação do inciso I do §1º do art. 2º do Decreto nº 9.246/2017;

(iii) suspender o art. 10 do Decreto nº 9.246/2017, que trata do indulto da multa, por violação ao princípio da moralidade, ao princípio da separação dos Poderes e desviar-se das finalidades do instituto do indulto, ressalvadas as hipóteses de (a) extrema carência material do apenado (que nem sequer tenha tido condições de firmar compromisso de parcelamento do débito, na forma da legislação de regência); ou (b) de valor da multa inferior ao mínimo fixado em ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União (atualmente disposto inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22.03.2012, do Ministro da Fazenda);

(iv) suspender o art. 8º, I e III, do Decreto nº 9.246/2017, que estabelecem a aplicabilidade do indulto àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados pela suspensão condicional do processo, em razão da incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio da separação dos Poderes;

(v) suspender o art. 11, II, do Decreto nº 9.246/2017, por conceder indulto na pendência de recurso da acusação e antes, portanto, da fixação final da pena, em violação do princípio da razoabilidade e da separação dos Poderes" (Grifei).

- Atualização: a ADI n.º 5.874 acima indicada foi julgada improcedente. Vide nota abaixo.

Jurisprudência:

01) STF declara constitucional o Decreto n.º 9.246/2017 - Indulto natalino - Impossibilidade de concessão a crimes hediondos, de tortura, terrorismo e tráfico de entorpecentes:

 

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

02) Comutação - Dec. n.º 9.246/2017 não trouxe restrição quanto ao regime de cumprimento da pena em curso (fechado ou semiaberto):

DIREITO PENAL  -  REsp 1.828.409-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 01/10/2019, DJe 08/10/2019  (Informativo n.º 659 do STJ - Sexta Turma)

Indulto. Decreto presidencial n.º 9.246/2017. Regime semiaberto ou fechado. Ausência de restrição.

O Decreto n. 9.246/2017 não traz nenhuma ressalva ao regime de cumprimento de pena quando dispõe sobre a comutação aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade.

Inicialmente cumpre salientar que o indulto e a comutação, no ordenamento pátrio, não estão restritos apenas a fundamentos humanitários e costumam ser previstos anualmente, de forma coletiva, como verdadeiro instrumento de política criminal colocado à disposição do Presidente da República, segundo sua conveniência. O perdão das penas é, então, ato discricionário associado, comumentemente, ao combate ao hiperencarceramento, com vistas ao retorno do preso ao convívio social. No Decreto Presidencial n. 9.246/2017, foi concedida a comutação às pessoas condenadas a pena privativa de liberdade em 1/4, se reincidentes, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido 1/3 da pena. Não houve nenhuma ressalva ou especificação do regime prisional em curso. Consta do regramento, tão somente, que o benefício não alcançaria os sentenciados por crimes elencados no art. 3.° ou que não preenchessem o requisito subjetivo do art. 4.°. Conquanto o indulto e a comutação coletivos tenham por finalidade combater a lotação nos presídios e propiciar que encarcerados retornem ao convívio social, o Decreto Presidencial n. 9.246/2017 incluiu como beneficiado (e não restringiu) aquele sentenciado que não estava em situação de reclusão. Mesmo com a reinserção já estimulada por outros meios (penas substitutivas, regime aberto, livramento condicional e suspensão condicional do processo) e sem motivo humanitário, as pessoas descritas no art. 8° também foram agraciadas com o perdão. Ao incluir na previsão legal as pessoas que estão em liberdade ou bastante próximas de sua obtenção, o Presidente da República não vedou, via reversa, o benefício aos reeducandos dos regimes semiaberto e fechado. Assim, o art. 8.° do Decreto n. 9.246/2017 é norma inclusiva e não proibitiva.

Art. 8.º

Art. 9.º  O indulto natalino e a comutação de que trata este Decreto não se estendem:

I - às penas acessórias previstas no Decreto-Lei n.º 1.001, de 21 de outubro de 1969 - Código Penal Militar; e

II - aos efeitos da condenação. 

Art. 9.º

Art. 10.  O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. 

Parágrafo único.  O indulto será concedido independentemente do pagamento:

I - do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou

II - do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. 

Notas:

- Vide ADI n.º 5.874/DF: Em medida cautelar o Min. Luís Roberto Barroso, do STF, suspendeu em parte a incidência de parte do presente Decreto Presidencial. Ao ser reiterada a cautelar delineou, dentre outros pontos, as seguintes determinações (proferida em 12/03/2018, disponível no endereço http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313902271&tipoApp=.pdf):

"(i) suspender do âmbito de incidência do Decreto nº 9.246/2017 os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP, tendo em vista que o elastecimento imotivado do indulto para abranger essas hipóteses viola de maneira objetiva o princípio da moralidade, bem como descumpre os deveres de proteção do Estado a valores e bens jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal;

(ii) determinar que, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 1º do Decreto nº 9.246/2017, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos, balizas que condicionam a interpretação do inciso I do § 1º do art. 2º do Decreto nº 9.246/2017;

(iii) suspender o art. 10 do Decreto nº 9.246/2017, que trata do indulto da multa, por violação ao princípio da moralidade, ao princípio da separação dos Poderes e desviar-se das finalidades do instituto do indulto, ressalvadas as hipóteses de (a) extrema carência material do apenado (que nem sequer tenha tido condições de firmar compromisso de parcelamento do débito, na forma da legislação de regência); ou (b) de valor da multa inferior ao mínimo fixado em ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União (atualmente disposto inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22.03.2012, do Ministro da Fazenda);

(iv) suspender o art. 8º, I e III, do Decreto nº 9.246/2017, que estabelecem a aplicabilidade do indulto àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados pela suspensão condicional do processo, em razão da incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio da separação dos Poderes;

(v) suspender o art. 11, II, do Decreto nº 9.246/2017, por conceder indulto na pendência de recurso da acusação e antes, portanto, da fixação final da pena, em violação do princípio da razoabilidade e da separação dos Poderes" (Grifei).

- Atualização: a ADI n.º 5.874 acima indicada foi julgada improcedente. Vide nota abaixo.

Jurisprudência:

01) STF declara constitucional o Decreto n.º 9.246/2017 - Indulto natalino - Impossibilidade de concessão a crimes hediondos, de tortura, terrorismo e tráfico de entorpecentes:

 

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

Art. 10

Art. 11.  O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que:

I - a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior;

II - haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância;

- Atenção: Vide ADI 5.874/DF e notas abaixo.

III - a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3.º; ou

IV - a guia de recolhimento não tenha sido expedida. 

 

Notas:

- Vide ADI n.º 5.874/DF: Em medida cautelar o Min. Luís Roberto Barroso, do STF, suspendeu em parte a incidência de parte do presente Decreto Presidencial. Ao ser reiterada a cautelar delineou, dentre outros pontos, as seguintes determinações (proferida em 12/03/2018, disponível no endereço http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=313902271&tipoApp=.pdf):

"(i) suspender do âmbito de incidência do Decreto nº 9.246/2017 os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP, tendo em vista que o elastecimento imotivado do indulto para abranger essas hipóteses viola de maneira objetiva o princípio da moralidade, bem como descumpre os deveres de proteção do Estado a valores e bens jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal;

(ii) determinar que, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 1º do Decreto nº 9.246/2017, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos, balizas que condicionam a interpretação do inciso I do §1º do art. 2º do Decreto nº 9.246/2017;

(iii) suspender o art. 10 do Decreto nº 9.246/2017, que trata do indulto da multa, por violação ao princípio da moralidade, ao princípio da separação dos Poderes e desviar-se das finalidades do instituto do indulto, ressalvadas as hipóteses de (a) extrema carência material do apenado (que nem sequer tenha tido condições de firmar compromisso de parcelamento do débito, na forma da legislação de regência); ou (b) de valor da multa inferior ao mínimo fixado em ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União (atualmente disposto inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22.03.2012, do Ministro da Fazenda);

(iv) suspender o art. 8º, I e III, do Decreto nº 9.246/2017, que estabelecem a aplicabilidade do indulto àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados pela suspensão condicional do processo, em razão da incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio da separação dos Poderes;

(v) suspender o art. 11, II, do Decreto nº 9.246/2017, por conceder indulto na pendência de recurso da acusação e antes, portanto, da fixação final da pena, em violação do princípio da razoabilidade e da separação dos Poderes" (Grifei).

- Atualização: a ADI n.º 5.874 acima indicada foi julgada improcedente. Vide nota abaixo.

Jurisprudência:

01) STF declara constitucional o Decreto n.º 9.246/2017 - Indulto natalino - Impossibilidade de concessão a crimes hediondos, de tortura, terrorismo e tráfico de entorpecentes:

 

DIREITO CONSTITUCIONAL – INDULTO  (Informativo n.º 939 do STF - Plenário)

Concessão de indulto natalino e comutação de pena – 3

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, não referendou medida cautelar concedida em ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido nesta formulado contra os arts. 1º, I; 2º, § 1º, I; 8º; 10 e 11 do Decreto 9.246/2017 (1). A norma impugnada dispõe sobre a concessão de indulto natalino e a comutação de penas (Informativos 924 e 925). Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que sublinhou existir complexo mecanismo de freios e contrapesos, de controles recíprocos, ao lado das funções preponderantes de cada um dos Poderes. Dentro desse mecanismo, a Constituição Federal (CF) estabelece a possibilidade da outorga, por parte do Presidente da República, de graça, indulto ou comutação de penas [art. 84, XII (2)]. Segundo o ministro, o indulto não faz parte da doutrina penal, não é instrumento consentâneo à política criminal. É legítimo mecanismo de freios e contrapesos para coibir excessos e permitir maior equilíbrio na Justiça criminal. O exercício do poder de indultar não fere a separação de Poderes por, supostamente, esvaziar a política criminal definida pelo legislador e aplicada pelo Judiciário. Está contido na cláusula de separação de Poderes. O ato de clemência privativo do presidente pode ser total, independentemente de parâmetros. Asseverou que, ainda que não se concorde com esse instituto, ele existe e é ato discricionário, trata-se de prerrogativa presidencial, portanto. O ministro relembrou que o decreto genérico de indulto é tradição no Brasil. Citou, no ponto, o Decreto 20.082/1945, que previu a possibilidade da concessão antecipada de indulto. A expressão “tenham sido ou não julgados e condenados”, contida no seu art. 1º, revela não ser algo novo a desnecessidade de se a aguardar o trânsito em julgado. Além disso, o ato estabeleceu a possibilidade de comutação total ou parcial. Assinalou, quanto a esse decreto, editado pelo então ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) no exercício da Presidência da República, a legitimidade constitucional daquele que ocupa este cargo para a edição do decreto, tenha ele sido eleito diretamente ou não. Em seguida, assegurou não ser novidade, de igual modo, a possibilidade de o indulto abranger as penas pecuniárias. Reportou-se ao art. 1º, parágrafo único, do Decreto 48.136/1960. Acrescentou que, após a promulgação da CF de 1988, o Decreto 97.164/1988, em seu art. 4º, permitiu expressamente a aplicabilidade do indulto antes do trânsito em julgado. Para o ministro Alexandre de Moraes, o decreto, no entanto, não é imune ao controle jurisdicional e está sob o império da Constituição. O art. 5º, XLIII, da CF (3) fixa limitação expressa ao instituto. O indulto e a comutação da pena configuram típicos atos de governo, caracterizados pela discricionariedade do presidente da República, respeitados os limites manifestos na Constituição. Como limite implícito, o STF já reconheceu a impossibilidade de eventualmente ser outorgada a clemência soberana ao extraditando, uma vez que o objeto de indulgência principis se restringe exclusivamente ao plano dos ilícitos penais sujeitos à competência jurisdicional do Estado brasileiro. Por outro lado, o ato de indulto não é passível de restrição fora dos parâmetros constitucionais. É admissível a revisão judicial de todas as espécies dessa clemência para se verificar o cumprimento dos requisitos da CF. Entretanto, não cabe a análise de seu mérito, do juízo de conveniência e oportunidade, ou seja, adentrar o mérito das escolhas do Presidente da República feitas dentre as opções constitucionalmente lícitas. Não é possível trocar o subjetivismo do Chefe do Executivo pelo subjetivismo de outro Poder. Não compete ao Poder Judiciário reescrever o decreto de indulto. Ou o STF entende que o Presidente extrapolou o exercício de sua competência e declara a inconstitucionalidade do ato, ou, mesmo que não esteja de acordo com a opção, compreende que ele cumpriu as exigências constitucionais. O Tribunal não pode fixar requisitos, haja vista que, ao Poder Judiciário, também se impõe o império da Constituição da República. Se o STF fixar condições para o decreto analisado, estará fixando, também, para todos os subsequentes, e, portanto, estará legislando. O ministro asseverou que, se fosse admitida, por via judicial, a exclusão de certos crimes, como os de corrupção e os contra a Administração Pública, o Poder Judiciário atuaria como legislador positivo. No ponto, reputou não haver comprovação, mas apenas insinuação, de desvio de finalidade no decreto. Se houvesse desvio, pela teoria dos motivos determinantes, o Judiciário poderia anulá-lo. Observou a incoerência do Ministério Público em se autoconceder, sem participação do Poder Judiciário, a possibilidade de não processar quem praticou crimes de peculato, concussão, corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro, e depois negar o que a Constituição autoriza discricionariamente ao presidente da República. Lembrou que, no art. 18 da Resolução 181/2018, o Conselho Nacional do Ministério Público inclusive ampliou o plea bargain, a faculdade de o Parquet propor ao investigado acordo de não persecução penal. Na inicial desta ação, o Ministério Público alegou excesso, falta de razoabilidade, em algo que o órgão se autoconcedeu. Asseverou a constitucionalidade dos preceitos impugnados, restabelecido na íntegra o decreto de indulto. Em suma, quanto ao art. 8º, salientou que o indulto não se direciona somente às penas privativas de liberdade, mas também ao afastamento de sanções impostas por condenação judicial. Não haveria lógica em perdoar delitos mais graves e não os criminosos leves. Em relação ao art. 10, considerou ser tradicional no ordenamento jurídico pátrio que a concessão de indulto ou comutação da pena possa alcançar a sanção de multa, aplicada isolada ou cumulativamente. A pena de multa é uma das sanções impostas e o indulto não abrange o ressarcimento ao erário. Em relação aos arts. 1º e 2º, afirmou não ser possível excluir de sua abrangência crimes que a Constituição não autoriza excluir. A ministra Rosa Weber entendeu ser plausível a dicção de que o indulto é multifuncional, atua ora como instrumento do sistema de freios e contrapesos, ora como instrumento de política criminal no gerenciamento do problema carcerário, ora como ato de clemência por razões humanitárias. Os mecanismos de controle da legitimidade democrática podem ocorrer de duas formas: a primeira em espécie de autocontrole do Chefe do Poder Executivo e a segunda no processo político do impeachment. Por sua vez, o ministro Ricardo Lewandowski registrou que o ato político é de amplíssima discricionariedade e, portanto, imune ao controle jurisdicional. A impugnação judicial do ato só está autorizada se estiver presente clara ofensa às regras constitucionais, o que não ficou demonstrado na espécie. Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que direta, ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não de conveniência e oportunidade, porque o único juiz constitucional dessa matéria é o presidente da República. Para o ministro Marco Aurélio, a Constituição restringe a atuação apenas quanto à graça e à anistia e o faz tendo em conta o crime de tortura, o crime de tráfico de drogas, o crime situado no campo do terrorismo e os crimes apontados como hediondos. O Chefe do Poder Executivo, no indulto, que é perdão, em relação ao qual não se tem exceção na CF, atua de forma discricionária. O ministro Gilmar Mendes frisou que o indulto pode ser manejado com o objetivo de evitar a explosão do sistema. É preciso lidar com a matéria na sua historicidade. Pretender que a proposta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) seja vinculante é colocar condição na CF. Não é só reescrever o ato de indulto, é reescrever a própria Constituição. A seu ver, o Poder Executivo tem atuação concreta na definição e na aplicação da política criminal a ser adotada pelo governo, por força constitucional. O decreto é ato de natureza política do presidente da República, submetido a eventual juízo de reprovação política pela população nos futuros certames eleitorais, por exemplo. O presidente está submetido aos custos políticos da opção delineada na concessão do indulto. O ministro Celso de Mello recordou ter o indulto específica regulação na Lei de Execução Penal. Como hoje ocorre, o presidente da República não se acha jungido pelo parecer do CNPCP, nem está a ele vinculado. Aliás, o indulto pode abranger, inclusive, a medida de segurança, qualquer que seja a causa. Ponderou que a análise dos vários decretos presidenciais mostra não serem as modalidades de indulto elencadas no Decreto 9.246/2017 as mais favoráveis da história do instituto. Entretanto, não se presume desvio de finalidade. A prática do indulto presidencial traduz medida de atenuação das distorções gravíssimas que qualificam e deformam o sistema penitenciário brasileiro como um lastimável estado de coisas inconstitucional, tal como o STF já teve o ensejo de observar e de advertir no exame da ADPF 347. Para ele, registrou-se ofensa à separação de Poderes no momento em que esta Corte, substituindo por seus próprios critérios, reescreveu em algumas passagens o decreto presidencial de indulto. Vencidos os ministros Roberto Barroso (relator), Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Os ministros Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia referendaram a cautelar e reputaram ser a pretensão parcialmente procedente para: a) excluir, do âmbito de incidência do decreto, os crimes de peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa, tráfico de influência, os delitos praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa, nos termos originalmente propostos pelo CNPCP; e b) determinar que, nas hipóteses previstas em seu inciso I do art. 1º, o indulto depende do cumprimento mínimo de 1/3 da pena e só se aplica aos casos em que a condenação não for superior a oito anos. Além disso, declararam a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos do Decreto 9.246/2017: a) do art. 10, que estende o indulto à pena de multa, salvo – não será inconstitucional – a hipótese de extrema carência material do condenado; b) do art. 8º, I e III, que estabelecem a aplicabilidade de indulto, respectivamente, àqueles que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos e aos beneficiados com a suspensão condicional do processo; e c) do art. 11, II, que estipula o cabimento de indulto na pendência de recurso da acusação. O ministro Luiz Fux acompanhou a conclusão do relator, mas sugeriu a aplicação, como paradigma, do disposto no Decreto 9.706/2019. Por fim, o Plenário consignou o prejuízo da questão de ordem relativa à medida cautelar, suscitada na sessão anterior, porque apreciado o mérito da ação.

(1)  Decreto 9.246/2017: “Art. 1º O indulto natalino coletivo será concedido às pessoas nacionais e estrangeiras que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido: I – um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa; (...) Art. 2º O tempo de cumprimento das penas previstas no art. 1º será reduzido para a pessoa: (...) § 1º A redução de que trata o caput será de: I – um sexto da pena, se não reincidente, e um quarto da pena, se reincidente, nas hipóteses previstas no inciso I do caput do art. 1º; (...) Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; II – esteja cumprindo a pena em regime aberto; III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou IV – esteja em livramento condicional. (...) Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente do pagamento: I – do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ou II – do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza. Art. 11. O indulto natalino e a comutação de pena de que trata este Decreto são cabíveis, ainda que: I – a sentença tenha transitado em julgado para a acusação, sem prejuízo do julgamento de recurso da defesa em instância superior; II – haja recurso da acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância; III – a pessoa condenada responda a outro processo criminal sem decisão condenatória em segunda instância, mesmo que tenha por objeto os crimes a que se refere o art. 3º; ou IV – a guia de recolhimento não tenha sido expedida.”

(2)  CF/1988: “Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;”

(3)  CF/1988: “Art. 5º XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;”

ADI 5874/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 9.5.2019. (ADI-5874)

Art. 11

Art. 12.  As penas correspondentes a infrações diversas serão unificadas ou somadas para efeito da declaração do indulto natalino ou da comutação, na forma do art. 111 da Lei n.º 7.210, de 1984

Parágrafo único.  Na hipótese de haver concurso com infração descrita no art. 3.º, não será concedido o indulto natalino ou comutada a pena correspondente ao crime não impeditivo enquanto a pessoa condenada não cumprir 2/3 (dois terços) da pena correspondente ao crime impeditivo. 

 

Jurisprudência:

01) Indulto/comutação - Delito de associação para o narcotráfico - Vedação:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INDULTO OU COMUTAÇÃO. ART. 44, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 11.343/06. EXPRESSA VEDAÇÃO LEGAL. 1. Ainda que o Decreto nº 9.246/2017 não repita a vedação expressa de concessão de indulto ou comutação aos condenados pelo crime de associação para o tráfico, a lei ordinária impede a concessão de graça (indulto ou comutação, portanto) aos presos que estejam a cumprir pena pelo cometimento do crime previsto no artigo 35 da Lei nº 11.343/06. Inteligência do artigo 44 do mesmo diploma legal. 2. O STF, em recente julgado, entendeu que afastar a incidência do artigo 44 da Lei de Drogas afronta a cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). 3. Não é defeso ao legislador ordinário agravar o cumprimento das penas, independente de qual seja o crime. Assim, a vedação de concessão de indulto ou comutação não é restrita aos delitos equiparados a hediondo. Diante de previsão normativa expressa, que não se configura inconstitucional, é devida a aplicação do artigo 44, parágrafo único, da Lei de Drogas no caso concreto. AGRAVO DESPROVIDO (Agravo Nº 70077995157, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: JAYME WEINGARTNER NETO, Julgado em 08/08/2018)

AGRAVO EM EXECUÇÃO (ARTIGO 197 DA LEP). TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INDULTO. INCONFORMISMO DEFENSIVO. Com efeito, ainda que o Decreto Presidencial n° 9.246/17 não tenha referido especificamente vedação à concessão de benesses como indulto ou comutação, não podemos olvidar o disposto no artigo 44, da Lei n° 11.343/06, oportunidade em que também se veda a concessão de tais benefícios a quem comete o delito previsto no artigo 35 da Lei n° 11.343/06. Assim sendo, tendo o agravado sido condenado pela prática de, além de tráfico de drogas, crime de associação, não faz jus à concessão do indulto e/ou comutação de sua pena, diante de vedação legal contida no artigo 44, da Lei nº 11.343/06. Destaca-se, ainda, que, apesar de não ser considerado crime hediondo, o crime de associação para o tráfico é potencialmente muito mais lesivo à sociedade, pois, diferentemente do tráfico desarticulado, atinge a sociedade em larga escala, de forma organizada e, por conseguinte, com consequências mais gravosas. De resto, na forma do artigo 12 do Decreto nº 9.246/17: As penas correspondentes a infrações diversas serão unificadas ou somadas para efeito da declaração do indulto natalino ou da comutação, na forma do art. 111 da Lei nº 7.210, de 1984 . Na soma das penas, o agravante não cumpriu o requisito para o pedido subsidiário formulado (indulto/comutação da pena restrita ao delito previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/03). AGRAVO DESPROVIDO. (Agravo Nº 70078930724, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 27/09/2018)

02) Indulto - Soma de penas - Reprimenda superior a 8 anos - Descabimento:

INDULTO. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. INDEFERIMENTO MANTIDO. Como bem afirmou o Procurador de Justiça em seu parecer: “Tem-se, pois, que é possível a concessão de indulto ao tráfico privilegiado. Contudo, apenas quando a pena não perfazer total superior a 8 anos, devendo o montante ser considerado nos termos do art. 12, caput, do referido decreto presidencial. Dito de outra forma, só teria direito à concessão de indulto o apenado condenado por tráfico privilegiado se 1) a soma de penas não for superior a 8 anos, 2) em sendo a pena menor que 8 anos, houver o cumprimento de 2/3 da pena de delitos impeditivos, previstos no art. 3º do Decreto 9.246/17. No caso, descumprido o requisito referente à pena total, sequer cabe a análise do segundo.” DECISÃO: Agravo defensivo desprovido. Unânime.(Agravo, Nº 70078448487, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em: 07-11-2018)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. INDULTO. DECRETO Nº 9.246/2017. TRÁFICO PRIVILEGIADO. PENA TOTAL SUPERIOR A OITO ANOS. REQUISITO OBJETIVO NÃO PREENCHIDO. Ainda que o apenado também esteja cumprindo pena pela prática de crime de tráfico privilegiado, a soma das condenações enseja pena superior a oito anos, inviabilizando o benefício nos termos do artigo 1º, inciso IV, do Decreto nº 9.246/2017. AGRAVO DESPROVIDO.(Agravo, Nº 70077358174, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jayme Weingartner Neto, Julgado em: 11-07-2018)
 

Art. 12

Art. 13.  A autoridade que detiver a custódia dos presos e os órgãos de execução previstos no art. 61 da Lei n.º 7.210, de 1984, encaminharão ao juízo competente, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, inclusive por meio digital, na forma estabelecida pela alínea “f” do inciso I do caput do art. 4.º da Lei n.º 12.714, de 14 de setembro de 2012, a lista das pessoas que satisfaçam os requisitos necessários para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena que tratam este Decreto. 

§ 1.º  O procedimento previsto no caput será iniciado de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, da Defensoria Pública ou de seu representante, cônjuge ou companheiro, ascendente ou descendente. 

§ 2.º  O juízo competente proferirá a decisão, após ouvidos o Ministério Público e a defesa do beneficiário. 

§ 3.º Para atender ao disposto neste Decreto, os Tribunais poderão organizar mutirões. 

§ 4.º  A concessão do indulto natalino e da comutação de que trata este Decreto serão aplicadas pelo juiz do processo de conhecimento na hipótese de condenados primários, desde que haja o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação. 

Art. 13

Art. 14.  A declaração do indulto natalino e da comutação das penas terá preferência sobre a decisão de qualquer outro incidente no curso da execução penal, exceto quanto a medidas urgentes. 

Art. 14

​​​​​Art. 15.  Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. 

 

Brasília, 21 de dezembro de 2017; 196.º da Independência e 129.º da República. 

MICHEL TEMER
Torquato Jardim

Este texto não substitui o publicado no DOU de 22.12.2017

Art. 15
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