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Atenção:

- Decreto extraído do site www.planalto.gov.br - Contém referências legais e doutrinárias, anotações pessoais, resenha de jurisprudência, negritos e realces de texto para fins didáticos.

- O presente Código está dividido em duas páginas devido a extensão do texto. Nesta parte temos o Livro I (art. 1.º ao art. 393).

- Clique aqui para acessar a segunda parte, na qual contém os Livros II, III, IV, V e VI (art. 394 ao art. 811).

- Última atualização do texto legal em 22/10/2024

- Para pesquisar palavras-chave na página clique as teclas: "Ctrl + F" (Windows) ou "Command + F" (Mac).

Decreto-lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941.

 

Código de Processo Penal.

 

Vigência

 

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que Ihe confere o art. 180 da Constituição, decreta a seguinte Lei:

 

LIVRO I

DO PROCESSO EM GERAL

 

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1.º do CPP

Art. 1.° O processo penal reger-se-á, em todo o território brasileiro, por este Código, ressalvados:

I - os tratados, as convenções e regras de direito internacional;

II - as prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade (Constituição, arts. 86, 89, § 2.º, e 100);

III - os processos da competência da Justiça Militar;

IV - os processos da competência do tribunal especial (Constituição, art. 122, n.º 17);

V - os processos por crimes de imprensa. (Vide ADPF n.º 130)

Parágrafo único. Aplicar-se-á, entretanto, este Código aos processos referidos nos nos. IV e V, quando as leis especiais que os regulam não dispuserem de modo diverso.

Legislação correlata:

- Vide: Dec. n.º 678/1992 - Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969.

- Vide à proibição do non liquet (o juiz não pode alegar o desconhecimento da lei):

"Art. 3.º da LINDB.  Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece."

"Art. 4.º da LINDB. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito."

- Vide:

"Art. 5.º da LINDB. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum."

- Vide: Art. 2.º da Lei de Execução Penal.

"Art. 2.º. A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal."

Notas:

- Norma jurídica: Significa norma regra + norma princípio.

- Fonte material do direito processual penal: A fonte é o Estado, pois à União compete privativamente legislar sobre tal matéria, conforme disciplina o art. 22, inc. I, da CF/88. A fonte material também é chamada de fonte de produção. Os entes estatais (União Estados e o Distrito Federal) possuem competência concorrente para legislar sobre matéria processual, juizados especiais e direito penitenciário, conforme os arts. 24 e 98, ambos da CF/88. E segundo o art. 22 da CF/88, os Estados podem legislar em matéria processual penal em questões específicas de interesse local, desde que autorizados por lei complementar federal.

- Fonte formal do direito processual penal: A fonte formal imediata do direito processual penal é a Lei. Já a fonte mediata do direito processual penal são os costumes e os princípios gerais de direito.

- Os costumes dividem-se em contra legem, secundum legem ou praeter legem.

- Quanto ao uso dos princípios gerais de direito, vide a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB.

Art. 2.° A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.

 

Legislação correlata:

- Vide: Dec. n.º 678/1992 - Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969.

- Vide: Irretroatividade da lei penal.

"Art. 5.º, inc. XL, da CF/1988 - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;"

- Vide: Art. 2.º do Código Penal.

"Lei penal no tempo

Art. 2.º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.  (Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.  (Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984)"

- Vide: Art. 66 da Lei de Execução Penal - Competência do juiz da execução penal.

"Art. 66. Compete ao juiz da execução: I - aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado; (...)"

Notas:

- Vide: Súmula 711 do STF - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

- Vide: Súmula 611 do STF - Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.

- Em regra, a lei processual passa a ser aplicada assim que entra em vigor, sem período de vacatio legis. Segue-se o princípio do tempus regit actum, pela aplicação desde que seja editada, inclusive aos processos em curso, sem prejuízo dos atos já consolidados.

- Sobre a vigência da norma, vide também a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB.

- Conjugação de leis: Segundo o princípio unitário, não é possível combinar lei antiga com uma lei nova para que se resolva uma questão processual.

Jurisprudência:

01) Nova Lei de Drogas – Aplicação imediata – Crime praticado sob a égide da lei antiga:

 

AÇÃO PENAL. ANULAÇÃO. RECEBIMENTO. DENÚNCIA. (Informativo n.º 414 do STJ)

O paciente foi preso em flagrante, sendo posteriormente denunciado pela suposta prática do crime de tráfico de drogas, porque mantinha em depósito quase 28 quilos de cocaína. Recebida a denúncia e prolatada a sentença, o paciente foi condenado, por tráfico de drogas à pena de dez anos e seis meses de reclusão a ser cumprida integralmente em regime fechado, mais pagamento de 175 dias-multa. Aponta a existência de nulidade absoluta do processo, porque não foi observado o rito previsto no art. 38 da Lei n. 10.409/2002 e também que seria inconstitucional a vedação à progressão de regime. Inicialmente, ressaltou o Min. Og Fernandes, Relator, filiar-se ao entendimento de que a inobservância da defesa preliminar preconizada no mencionado artigo da citada lei configura tão somente nulidade relativa. Para o Min. Relator, em matéria de nulidades, deve prevalecer o disposto no art. 563 do CPP, que consagra o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual não se declara nulidade no caso em que inexiste prejuízo para a apuração da verdade substancial da causa. Entretanto, prevalece, na Sexta Turma deste Superior Tribunal, a orientação de que configura nulidade absoluta a ausência de notificação para defesa preliminar, agora prevista no art. 55 da Lei n. 11.343/2006, por violação dos princípios da ampla defesa e do devido processo legal. Sendo assim, e ressalvando seu posicionamento de que o vício apontado apenas autoriza a anulação do processo quando demonstrado o prejuízo, por se tratar de nulidade relativa, o Min. Relator aderiu ao entendimento deste Superior Tribunal para acompanhar sua jurisprudência. O Min. Og Fernandes entende que a Lei n. 11.343/2006 trouxe nova sistemática às políticas públicas sobre entorpecentes, revogando a Lei n. 10.409/2002, mas não alterou o direito de o acusado apresentar sua defesa prévia anteriormente ao início da ação penal, com o recebimento da denúncia (art. 55 da Lei n. 11.343/2006). É inequívoca, portanto, a necessidade de abertura de prazo para a apresentação de defesa preliminar antes do recebimento da denúncia a todos os procedimentos em andamento durante a vigência da Lei n. 10.409/2002 publicada em 11/1/2002, e revogada pela Lei n. 11.343/2006, em 23/8/2006. No caso, a denúncia foi oferecida e recebida pelo magistrado singular, que não outorgou à defesa do paciente a oportunidade de apresentar sua defesa preliminar antes do recebimento da peça acusatória, em desrespeito ao rito estabelecido pela Lei n. 10.409/2002. Uma vez anulada a ação penal desde o recebimento da denúncia, o novo procedimento a ser seguido é o determinado pela Lei n. 11.343/2006, em homenagem ao princípio do efeito imediato da lei processual penal, de que trata o art. 2º do CPP. Com a anulação, fica prejudicado o pedido de modificação do regime prisional, sendo necessária a expedição de alvará de soltura sob pena de ofensa ao princípio constitucional da razoável duração do processo. Diante disso, a Turma, por maioria, concedeu a ordem para anular a ação penal desde o recebimento da denúncia, inclusive, impondo-se ao juízo processante observar o rito da Lei n. 11.343/2006, conferindo ao paciente o direito à liberdade provisória, mediante assinatura de termo de compromisso de comparecimento a todos os atos do processo.

STJ - HC 138.275-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 5/11/2009.

 

02) Nova lei processual – Aplicação imediata – Desnecessidade de renovação dos atos processuais:

 

Lei 11.719/2008: Interrogatório e “Tempus Regit Actum” (Informativo n.º 602 do STF – Primeira Turma)

A Turma indeferiu habeas corpus em que se pleiteava renovação de interrogatório para observância da novel redação do art. 400 do CPP, conferida pela Lei 11.719/2008 [“Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado”]. Observou-se que o interrogatório fora realizado em data anterior à vigência daquela lei, o que, pelo princípio tempus regit actum, excluiria a obrigação de se renovar ato validamente praticado sob a égide de lei anterior, para que o paciente fosse interrogado ao final da audiência de instrução e julgamento.  Por fim, reafirmou-se o entendimento do Supremo segundo o qual não se declara a nulidade de ato processual se a alegação não vier acompanhada de prova do efetivo prejuízo sofrido pelo paciente.

STF - HC 104555/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.9.2010. (HC-104555)

 

 

03) Princípio unitário – Impossibilidade de conjugação de leis – Estupro de vulnerável – Tipo específico após a Lei n.º 12.015/2009:

 

Conjugação de leis e descabimento (Informativo n.º 635 do STF – Primeira Turma)

Com base no princípio unitário, a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava a mescla da legislação nova com a antiga, nos trechos em que mais favoráveis ao paciente. Na espécie dos autos, ele fora condenado a 17 anos e 6 meses de reclusão e, em grau de recurso, o STJ concedera a ordem, de ofício, a fim de reduzir a pena para 13 anos e 4 meses de reclusão, nos termos dispostos pela Lei 12.015/2009 — que revogou o art. 9º da Lei 8.072/90 e criou o tipo específico de estupro de vulnerável (CP, art. 217-A). Alegava-se que o acórdão questionado prejudicara o paciente, visto que a sentença condenatória estabelecera a pena-base em 6 anos e, pela nova regra, aplicada pelo STJ, esta fora fixada em 8 anos. Considerou-se, ademais, que não houvera qualquer decisão contrária aos interesses do paciente, porque reduzida a pena final, de 17 para 13 anos.

STF - HC 104193/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 9.8.2011. (HC-104193)

04) Direito processual penal - Norma híbrida - Lei processual material - Direito penal militar - Alteração de competência - Aplicação imediata - Possibilidade - Irretroatividade da lei penal maia gravosa:

DIREITO PENAL, DIREITO PENAL MILITAR, DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR - CC 161.898-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 13/02/2019, DJe 20/02/2019  (Informativo n.º 642 do STJ – Terceira Seção)

Lei n. 13.491/2017. Fatos perpetrados antes do seu advento. Norma com conteúdo híbrido. Incidência imediata. Possibilidade. Observância da norma penal mais benéfica ao tempo do crime. Competência do juízo militar, com ressalva.

É possível a aplicação imediata da Lei n. 13.491/2017, que amplia a competência da Justiça Militar e possui conteúdo híbrido (lei processual material), aos fatos perpetrados antes do seu advento, mediante observância da legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime.

Inicialmente, cumpre destacar que a Lei n. 13.491/2017 não tratou apenas de ampliar a competência da Justiça Militar, também ampliou o conceito de crime militar, circunstância que, isoladamente, autoriza a conclusão no sentido da existência de um caráter de direito material na norma. Esse aspecto, embora evidente, não afasta a sua aplicabilidade imediata aos fatos perpetrados antes de seu advento, já que a simples modificação da classificação de um crime como comum para um delito de natureza militar não traduz, por si só, uma situação mais gravosa ao réu, de modo a atrair a incidência do princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa (arts. 5º, XL, da Constituição Federal e 2º, I, do Código Penal). Por outro lado, a modificação da competência, em alguns casos, pode ensejar consequências que repercutem diretamente no jus libertatis, inclusive de forma mais gravosa ao réu. É inegável que a norma possuiu conteúdo híbrido (lei processual material) e que, em alguns casos, a sua aplicação retroativa pode ensejar efeitos mais gravosos ao réu. Tal conclusão, no entanto, não impossibilita a incidência imediata, sendo absolutamente possível e desejável conciliar sua aplicação com o princípio da irretroatividade de lei penal mais gravosa. A jurisprudência desta Corte não admite a cisão da norma de conteúdo híbrido (AgRg no REsp n. 1.585.104/PE, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 23/4/2018). Ocorre que a aplicação imediata, com observância da norma penal mais benéfica ao tempo do crime, não implicaria uma cisão da norma, pois, o caráter material, cujo retroatividade seria passível de gerar prejuízo ao réu, não está na norma em si, mas nas consequências que dela advém. Logo, é absolutamente possível e adequado a incidência imediata da norma aos fatos perpetrados antes do seu advento, em observância ao princípio tempus regit actum (tal como decidido no julgamento do CC n. 160.902/RJ), desde que observada, oportunamente, a legislação penal (seja ela militar ou comum) mais benéfica ao tempo do crime. Ademais, importante ressaltar que tal ressalva é inafastável da declaração de competência. Primeiro, porque a solução do julgado dela depende. Segundo, porque a simples declaração de competência em favor da Justiça Militar, sem a ressalva acima estabelecida, poderia dar azo a ilegalidade futura, decorrente de eventual inobservância da norma penal mais benéfica.

05) Interrogatório por videoconferência – Ato anterior à edição da Lei n.º  11.900/09, que disciplinou a matéria - Nulidade absoluta - Ausência de preclusão - Aplicação da lei vigente ao tempo da realização da oitiva:

 

NULIDADE. INTERROGATÓRIO. VIDEOCONFERÊNCIA. (Informativo n.º 423 do STJ)

Ao paciente é imputado o fato de ter-se associado a outras pessoas para o tráfico internacional e para dar continuidade, no Brasil, ao comércio da droga de forma a prepará-la (misturar a droga pura com outros produtos químicos para aumentar a quantidade e, consequentemente, a margem de lucro) para futura venda a distribuidores regionais. Além da associação, consta a descrição de fatos que configuram, em tese, crime de tráfico ilícito de entorpecentes, com expressa menção das condutas por ele praticadas, ao qual se atribui a responsabilidade ora pela aquisição ora pelo fornecimento de drogas apreendidas pela Polícia Federal, quando da efetivação da prisão em flagrante de determinadas pessoas. Entendeu o Min. Relator que, conforme a conclusão do tribunal de origem, a denúncia atende a todos os requisitos legais de forma suficiente à compreensão da acusação e ao exercício do direito de defesa, não havendo, no ponto, nenhum constrangimento ilegal a ser reparado. Contudo, entendeu que a ordem há de ser concedida para reconhecer a nulidade do interrogatório; pois, à época em que realizado (21/8/2007), não havia previsão legal permitindo a sua realização pelo sistema de videoconferência, o que somente passou a existir com a Lei n. 11.900/2009, ainda assim, em caráter excepcional e mediante decisão devidamente fundamentada.  Não deve prevalecer o entendimento do MPF de que a superveniência da mencionada lei teria suprido o vício consistente na falta de previsão legal para a realização do ato de interrogatório pelo sistema de videoconferência.  Para o Min. Relator, pretende-se a aplicação retroativa da lei, o que não é permitido; pois, no processo penal, aplica-se a lei vigente ao tempo da prática do ato (art. 2º do CPP). Também não deve prosperar o fundamento lançado pelo tribunal a quo de que a nulidade teria precluído, já que não alegada oportunamente, isto é, quando da realização do ato do interrogatório. Cuida-se de nulidade absoluta, insusceptível de convalescimento por falta de protesto oportuno e, mesmo que a nulidade fosse relativa, não seria possível falar em preclusão: o interrogatório constitui ato que integra a instrução do processo e o CPP é categórico ao prever o prazo das alegações finais como o momento específico para a alegação de eventuais vícios da instrução criminal (art. 571, II, do CPP). No caso, quando das alegações finais, o paciente requereu, expressamente, o reconhecimento da nulidade do interrogatório pelo sistema de viodeoconferência.

STJ - HC 128.600-SP, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 18/2/2010.

06) Norma de direito processual - Deslocamento de competência - Justiça Comum vs. Justiça Militar - Tempus regit actum - Nulidade não reconhecida:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. CRIME DE TORTURA. ADVENTO DA LEI N. 13.491/2017. REQUERIMENTO DE DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA MILITAR. INDEFERIMENTO. TRATA-SE DE FATO PERPETRADO NO DIA 07 DE SETEMBRO DE 2005. NO CASO EM ANÁLISE, A SENTENÇA CONDENATÓRIA DE PRIMEIRO GRAU FOI PROLATADA EM 10 DE JUNHO DE 2009. POSTERIORMENTE, A APELAÇÃO DEFENSIVA FOI EXAMINADA EM SESSÃO REALIZADA NO DIA 26 DE NOVEMBRO DE 2013. NA LINHA DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, "AS NORMAS DE DIRETO PROCESSUAL PENAL SÃO REGIDAS PELO PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM, NOS TERMOS DO ART. 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ASSIM, INICIADO PROCESSO PENAL NO JUÍZO COMUM, ANTES DO ADVENTO DE NOVA LEI, NÃO HÁ FALAR EM SUA REDISTRIBUIÇÃO NOS TERMOS DA NOVEL LEI N. 13.491/2017". POR CONSEGUINTE, NÃO MERECE ACOLHIMENTO O ARGUMENTO DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA EM VIRTUDE DA LEI N. 13.491/2017. AGRAVO DEFENSIVO IMPROVIDO. (Agravo de Execução Penal, Nº 51603806720218217000, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em: 16-12-2021)

Art. 2.º do CPP

Art. 3.° A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

Legislação correlata:

- Vide: Art. 5.º da Constituição Federal/1988 - Direitos e garantias fundamentais.

- Vide:

"Art. 4.º da LINDB. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito."

​"Art. 5.º da LINDB. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum."

- Vide: Código de Processo Civil/2015 - regras passíveis de aplicação analógica ao CPP.

Nota:

- O uso de interpretação extensiva das normas processuais penais e da analogia podem ser em favor ou contra os interesses do acusado. Na interpretação extensiva o operador amplia o conteúdo da norma em exame, buscando seu verdadeiro sentido. Assim deve proceder quando verificar que o legislador disse menos do que pretendia dizer.

Jurisprudência:

01) Utilização subsidiária do CPC no processo penal – Cabimento:

 

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES EM CONCURSO FORMAL. 1. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. NÃO OCORRÊNCIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA POR MAGISTRADO DIVERSO DAQUELE QUE PRESIDIU A INSTRUÇÃO CRIMINAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 132 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. JUIZ DESIGNADO PARA ATUAR EM OUTRO JUÍZO. 2. REGIME INICIAL FECHADO. MODIFICAÇÃO. INVIABILIDADE. IMPOSIÇÃO DEVIDAMENTE MOTIVADA NA MECÂNICA DELITIVA E NA MAIOR PERICULOSIDADE DO PACIENTE. 3. ORDEM DENEGADA.

1. A Lei n.º 11.719/2008 se limitou a consignar que o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. Embora a acolhida pelo sistema processual penal de tal princípio tenha sido medida acertada, pois a coleta pessoal da prova é de grande significado para a formação do convencimento judicial, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o art. 132 do Código de Processo Civil deve ser aplicado subsidiariamente ao Código de Processo Penal, na forma do permissivo previsto em seu art. 3º, justamente para o fim de dar implemento à celeridade processual trazida para os novos ritos processuais penais.

2. No caso, a Juíza que presidiu a instrução penal foi designada para atuar em outro juízo. Dessa forma, está amplamente justificado o fato de Magistrado diverso daquele que presidiu a instrução criminal ter prolatado a decisão condenatória, nos moldes das excepcionalidades previstas no art. 132 do Código de Processo Civil c/c o art. 3º do Código de Processo Penal, motivo pelo qual não se vislumbra o alegado constrangimento ilegal.

3. Impossibilidade de fixação do regime intermediário para início de desconto da pena se a opção pelo regime fechado não se deu com base na gravidade abstrata do delito, mas, ao contrário, com fulcro nas especificidades da causa que, por sua vez, exigem maior rigor na resposta penal, bem como na mecânica delitiva do crime, notadamente diante do emprego de arma de fogo e do concurso de pessoas, circunstâncias que evidenciam a acentuada periculosidade do paciente.

4. Em respeito aos ditames de individualização da pena e aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, penso que não deve ser tratado de modo idêntico agente que se utiliza de arma branca ou imprópria para a prática do delito de roubo e aquele que faz uso, por exemplo, de revólver, pistola ou fuzil com a mesma finalidade.

5. Habeas corpus denegado.

(STJ - HC 141.366/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 13/03/2012, DJe 17/04/2012)

 

02) Aplicação analógica do Código de Processo Civil ao processo penal - Fixação de multa diária por descumprimento de decisão judicial - Admissibilidade:

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. QUEBRA DE SIGILO. ADC N. 51. INEXISTÊNCIA DE ORDEM DE SUSPENSÃO DO TRÂMITE DE FEITOS SEMELHANTES. LEGITIMIDADE DE QUEBRA DE SIGILO PELA AUTORIDADE JUDICIAL. OBRIGAÇÕES DAS EMPRESAS COM SERVIÇO NO BRASIL. POSSIBILIDADE E ADEQUAÇÃO DA FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA PELO DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. PROPORCIONALIDADE DO VALOR DA MULTA DIÁRIA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - Inexiste nos autos da ADC n. 51 a concessão de medida cautelar de sobrestamento dos processos que tratam da aplicação do Decreto n. 3.810/2001, não havendo óbice ao prosseguimento deste feito.
II - O não cumprimento integral das sucessivas determinações judiciais e a ausência de justificativa da recusa ensejam a devida aplicação de multa diária.
III - A natureza (nacional) e o oferecimento dos serviços no Brasil sujeitam o recorrente à legislação brasileira, de modo que não há falar em violação da soberania ou dos princípios constitucionais do devido processo legal e daqueles que regem as relações internacionais, como o da não intervenção.
IV - A eg. Terceira Seção já decidiu que o FACEBOOK BRASIL é parte legítima para representar os interesses do FACEBOOK INC., o que possibilita a aplicação da multa em decorrência de descumprimento de determinações judiciais, em atenção ao disposto no art. 75, inciso X e § 3º, do CPC, c/c o art. 3º do CPP (RMS n. 54.654/RS, Terceira Seção, Rel. para o acórdão Min. Ribeiro Dantas, DJe de 20/8/2020).
V - Apesar de não haver disposição expressa no Código de Processo Penal acerca da imposição de multa por descumprimento de determinação judicial, o Superior Tribunal de Justiça, com base no art. 3º do CPP ("A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais do direito"), na teoria dos poderes implícitos e do poder geral de cautela do magistrado, definiu a aplicação analógica do disposto no Código de Processo Civil sobre o tema. Assim, esta Corte vem decidindo pela possibilidade de se impor, no âmbito do processo penal, multa coercitiva como forma de dar efetividade às decisões judiciais. No caso, trata-se de punir a recalcitrância de terceiro em cumprir determinação judicial. Trata-se, em verdade, de relação jurídica de direito processual civil entre terceiro que deveria cumprir determinação judicial e o juízo criminal.
VI - O Superior Tribunal de Justiça já estabeleceu não ser "cabível a imposição de multa por litigância de má-fé no âmbito do processo penal, porquanto sua aplicação constituiria indevida analogia in malam partem, haja vista a ausência de previsão expressa no Código Penal" (HC n. 401.965/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 6/10/2017).
VII - No caso, o valor econômico da empresa agravada, a reiteração no descumprimento da determinação judicial e o que vem sendo decidido por esta eg. Corte Superior em casos semelhantes, ensejam o valor da multa imposta, não sendo, assim, nem desarrazoado e nem exacerbado.
VIII - O art. 139, IV, do CPC/2015 autoriza o magistrado a "determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária".
IX - O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça apenas afastaram a possibilidade do emprego das cautelares inominadas pessoais que atinjam a liberdade de ir e vir do indivíduo, o que não se aplica ao caso em comento.
X - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes.
Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no RMS n. 61.385/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 1/12/2022.)

 

03) Aplicação analógica de regra da Lei de Drogas a outros delitos - Utilização de bem apreendido – Uso de aeronave apreendida em crime diverso do tráfico de drogas – Cabimento:

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO POR ÓRGÃO PÚBLICO DE BEM APREENDIDO.

É possível a aplicação analógica dos arts. 61 e 62 da Lei 11.343/2006 para admitir a utilização pelos órgãos públicos de aeronave apreendida no curso da persecução penal de crime não previsto na Lei de Drogas, sobretudo se presente o interesse público de evitar a deterioração do bem.

Isso porque, em primeiro lugar, de acordo com o art. 3º do CPP, a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

Assim, é possível, sobretudo porque permitido pelo próprio CPP, o uso da analogia, que consiste em processo de integração por meio do qual se aplica a uma determinada situação para a qual inexiste hipótese normativa própria um preceito que regula hipótese semelhante.

Ressalte-se, ainda, que, para o uso da analogia, não importam a natureza da situação concreta e a natureza do diploma de onde se deve extrair a norma reguladora.

Em segundo lugar, porque a exigência contida no art. 61 da Lei 11.343/2006, referente à existência de interesse público ou social, encontra-se cumprida no presente caso, qual seja, evitar a deterioração do bem apreendido.

Por fim, em terceiro lugar, porque a preocupação em se prevenir que a demora nos processos judiciais venha a propiciar a degeneração do bem apreendido é atual, existindo, inclusive, no projeto do novo Código de Processo Penal (PL 8.045/2010), seção específica a tratar do tema, sob o título “Da utilização dos bens por órgãos públicos”, o que demonstra a efetiva ocorrência de lacuna no Código atualmente em vigor, bem como a clara intenção de supri-la. Decisão monocrática citada: Inq 603, Min. Paulo Gallotti, DJ 14/11/2008.

STJ - REsp 1.420.960-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 24/2/2015, DJe 2/3/2015. 

04) Recurso em Sentido Estrito - Rol não taxativo - Interpretação extensiva - Possibilidade:

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL - EREsp 1.630.121-RN, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, por unanimidade, julgado em 28/11/2018, DJe 11/12/2018  (Informativo n.º 640 do STJ - Terceira Seção)

Suspensão do processo (art. 366, CPP). Pedido de produção antecipada de prova. Decisão interlocutória de indeferimento. Recurso em sentido estrito. Cabimento. Interpretação extensiva do inciso XI do art. 581 do CPP.

É cabível recurso em sentido estrito para impugnar decisão que indefere produção antecipada de prova, nas hipóteses do art. 366 do CPP.

A controvérsia consiste na divergência entre o acórdão embargado, da Sexta Turma, que decidiu ser inviável o manejo do recurso em sentido estrito para impugnar decisão judicial que indefere a produção antecipada de provas em ação penal, fundado na permissão constante na parte final do art. 366 do CPP, e o entendimento da Quinta Turma sobre o mesmo tema. Com efeito, dentre as hipóteses elencadas no art. 581 do CPP que autorizam a interposição de recurso em sentido estrito, não se encontra a possibilidade de reforma de decisão que indefere pedido de produção antecipada de provas. Entretanto, baseada no fato de que o art. 3.º do Código de Processo Penal admite expressamente tanto a realização de interpretação extensiva quanto de aplicação analógica na seara processual penal, a jurisprudência tem entendido possível a utilização de interpretação extensiva para se admitir o manejo do recurso em sentido estrito contra decisões interlocutórias de 1º grau que, apesar de não constarem literalmente no rol taxativo do art. 581 do CPP, tratam de hipótese concreta que se assemelha àquelas previstas nos incisos do artigo. Exemplos disso se tem no cabimento de recurso em sentido estrito contra a decisão que não recebe o aditamento à denúncia ou à queixa (inciso I do art. 581 do CPP) e na decisão que delibera sobre o sursis processual (inciso XI do art. 581 do CPP). Assim, como cabível o manejo de recurso em sentido estrito contra decisão que ordenar a suspensão do processo, as providências de natureza cautelar advindas de tal decisão devem, como ela, ser impugnáveis pelo mesmo recurso.

05)  Crime contra a honra de pessoa falecida - Queixa-crime - Legitimidade da "companheira" - Interpretação extensiva - Equivalência de status com a "esposa" do ofendido:

QUEIXA-CRIME. ACUSAÇÃO CONTRA DESEMBARGADORA DO TJRJ. PRERROGATIVA DE FORO NO STJ. CRIME DE CALÚNIA CONTRA PESSOA MORTA. QUEIXA PARCIALMENTE RECEBIDA.
1. É do Superior Tribunal de Justiça a competência para processar e julgar a queixa-crime em questão, que imputa o crime de calúnia a Desembargadora do TJRJ, pois, caso contrário, a Acusada teria de responder perante juiz de direito vinculado ao mesmo Tribunal, o que afrontaria a isenção e independência que norteiam a atividade jurisdicional. Precedentes: QO na APn 878/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/11/2018, DJe 19/12/2018; APn 895/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2019, DJe 07/06/2019.
2. Por se tratar de crime de calúnia contra pessoa morta (art. 138, § 2.º, do Código Penal), os Querelantes - mãe, pai, irmã e companheira em união estável da vítima falecida - são partes legítimas para ajuizar a ação penal privada, nos termos do art. 24, § 1.º, do Código de Processo Penal ("§ 1.º No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão").
3. A companheira, em união estável reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal, podendo figurar como legítima representante da falecida. Vale ressaltar que a interpretação extensiva da norma processual penal tem autorização expressa no art. 3.º do CPP ("A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito").

4. Ademais, "o STF já reconheceu a 'inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico', aplicando-se a união estável entre pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e mesmas consequências da união estável heteroafetiva' [...]". (RE 646721, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-204 DIVULG 08-09-2017 PUBLIC 11-09-2017).
(...)
12. Queixa-crime parcialmente recebida em desfavor da Querelada, como incursa no art. 138, § 2.º, c.c. o art. 141, inciso III, do Código Penal, apenas por ter imputado à vítima falecida o crime do art. 2.º, da Lei n.º 12.850/2013.
(STJ - APn 912/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/08/2019, DJe 22/08/2019)

06) Princípio da boa-fé objetiva - Cooperação entre as partes no processo penal - Racionalidade dos instrumentos processuais - Descabimento da impetração de habeas corpus de modo concomitante ao recurso adequado à impugnação de decisão - Princípio da unirrecorribilidade:

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. RECURSO DE APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDO PARA EXASPERAR A PENA BASE. IMPETRAÇÃO NESTA EG. CORTE SUPERIOR. PRETENSÃO DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA. INTERPOSIÇÃO CONCOMITANTE DO RECURSO ESPECIAL. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. RACIONALIDADE DOS INSTRUMENTOS PROCESSUAIS. FUNCIONALIDADE DO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL. ENTENDIMENTO DA TERCEIRA SEÇÃO NOS AUTOS DO HC N. 482.549/SP. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a dignidade da pessoa humana como ponto nuclear das suas diretrizes principiológicas e programáticas, reverenciando-a, no âmbito penal, na responsabilização por conduta penalmente imputável como decorrência da estrita observância das garantias constitucionais que as concretizam, tornando justo e legítimo o decreto condenatório. Conquistas inolvidáveis das sociedades modernas, as garantias constitucionais do devido processo legal, do exercício do contraditório e da ampla defesa constituem, em outra faceta, a obrigação do Estado-juiz de observância, em todas as etapas das formalidades que realizam, da dignidade da pessoa humana.
II - Ilumina o processo penal o princípio da boa-fé objetiva, norma extraída por previsão do art. 3º do CPP e estabelecida no art. 6º do CPC, no qual assim dispõe: "Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva". Referida norma principiológica orienta o comportamento processual das partes de lealdade, de exatidão e de lisura, estabelecendo um conjunto de diretrizes que implique segurança jurídica na relação processual e no desenrolar do próprio processo penal.
III - A higidez do decreto condenatório perpassa, indubitavelmente pela concretização, no plano processual, das garantias constitucionais, e com maior relevo, dos princípios do devido processo legal (art. 5º, LIV), contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), legalidade das provas (art. 5º, LVI), dentre outros. Contudo, "Compete aos operadores do direito, no exercício das atribuições e/ou competência conferida, o dever de consagrar em cada ato processual os princípios basilares que permitem a conclusão justa e legítima de um processo, ainda que para condenar o réu" (HC n. 91.474/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 2/8/2010). Nesta jornada, o princípio da boa-fé objetiva também tem seu campo de atuação e, por isso mesmo, irmana-se, no caso concreto, ao princípio da unirrecorribilidade.
IV - Segundo entendimento desta eg. Corte Superior, "não é cabível a impetração de habeas corpus concomitantemente com interposição de recurso próprio contra o mesmo ato judicial, por se tratar de indevida subversão do sistema recursal e de violação do princípio da unirrecorribilidade" (AgRg no HC n. 549.368/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 19/12/2019).
V - A Terceira Seção sedimentou a compreensão de que "A tutela constitucional e legal da liberdade humana justifica algum temperamento aos rigores formais inerentes aos recursos em geral, mas não dispensa a racionalidade no uso dos instrumentos postos à disposição do acusado ao longo da persecução penal, dada a necessidade de também preservar a funcionalidade do sistema de justiça criminal, cujo poder de julgar de maneira organizada, acurada e correta, permeado pelas limitações materiais e humanas dos órgãos de jurisdição, se vê comprometido - em prejuízo da sociedade e dos jurisdicionados em geral - com o concomitante emprego de dois meios de impugnação com igual pretensão. Sob essa perspectiva, a interposição do recurso cabível contra o ato impugnado e a contemporânea impetração de habeas corpus para igual pretensão somente permitirá o exame do writ se for este destinado à tutela direta da liberdade de locomoção ou se traduzir pedido diverso em relação ao que é objeto do recurso próprio e que reflita mediatamente na liberdade do paciente. Nas demais hipóteses , o habeas corpus não deve ser admitido e o exame das questões idênticas deve ser reservado ao recurso previsto para a hipótese, ainda que a matéria discutida resvale, por via transversa, na liberdade individual" (HC n. 482.549/SP, Terceira Seção, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe de 3/4/2020).
VI - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes.
Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no HC n. 741.207/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do Tjdft), Quinta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 29/6/2022.)

Art. 3.º do CPP
3.º-A

Juiz das Garantias

(Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)

Art. 3.º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)  (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Jurisprudência:

01) Juiz de garantias - (In)constitucionalidade - Norma de aplicação obrigatória - Prazo para implementação:

Notícias do STF - 24/08/2023

Juiz das garantias: STF proclama resultado do julgamento

Prazo para implementação começa a contar a partir da publicação da ata de julgamento

Na sessão desta quinta-feira (24), a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, proclamou o resultado do julgamento das quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305) que questionavam alterações no Código de Processo Penal (CPP) pelo Pacote Anticrime (Lei 13964/2019) , entre elas a criação do juiz das garantias. Em função da complexidade do julgamento e do grande número de dispositivos em discussão, a proclamação foi feita na sessão seguinte ao último voto proferido. Confira alguns pontos da decisão:

Prazo

O Tribunal considerou a norma de aplicação obrigatória e deu prazo de 12 meses, prorrogável por mais 12 meses, a partir da publicação da ata do julgamento, para a adoção das medidas legislativas e administrativas necessárias à adequação das diferentes leis de organização judiciária, à efetiva implantação e ao efetivo funcionamento do juiz das garantias em todo o país, conforme as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Denúncia

A competência do juiz das garantias termina com o oferecimento da denúncia, cuja análise passa a ser atribuição do juiz da instrução penal, que decidirá, também, eventuais questões pendentes.

Prisão

Em até 10 dias após o oferecimento da denúncia ou queixa, o juiz da instrução e julgamento deverá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso.

Revogação automática de prisão cautelar

Foi afastada a regra que previa o relaxamento automático da prisão caso as investigações não fossem encerradas no prazo legal. Segundo a decisão, o juiz poderá avaliar os motivos que motivaram sua declaração.

Alcance

As normas relativas ao juiz das garantias não se aplicam aos processos de competência originária do STF e do Superior Tribunal de Justiça, regidos pela Lei 8.038/1990, aos processos de competência do Tribunal do Júri, aos casos de violência doméstica e familiar e às infrações penais de menor potencial ofensivo. O juiz das garantias atuará nos processos criminais da Justiça Eleitoral.

Investidura

Foi afastada a regra que previa a designação do juiz das garantias. Segundo a decisão, o juiz deverá ser investido conforme as normas de organização judiciária de cada esfera da justiça, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelos tribunais.

Controle de investigações

Foi fixado o prazo de até 90 dias, contados da publicação da ata do julgamento, para os representantes do Ministério Público encaminharem, sob pena de nulidade, todos os procedimentos de investigação (PICs) e outros procedimentos semelhantes, mesmo que tenham outra denominação, ao respectivo juiz natural, independentemente de o juiz das garantias já ter sido implementado na respectiva jurisdição.

Contraditório

O exercício do contraditório será realizado, preferencialmente, em audiência pública e oral. Contudo, o juiz pode deixar de realizar a audiência quando houver risco para o processo ou adiá-la em caso de necessidade.

Dignidade do preso

A divulgação de informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso pelas autoridades policiais, pelo Ministério Público e pela magistratura deve assegurar a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão

Arquivamento

Ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o Ministério Público submeterá sua manifestação ao juiz competente e comunicará o fato à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar os autos para o procurador-geral ou para a instância de revisão ministerial, quando houver, para fins de homologação.

Revisão

Além da vítima ou de seu representante legal, a autoridade judicial competente também poderá submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, caso verifique patente ilegalidade ou anormalidade no arquivamento.

Prova inadmissível

Foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo que proibia o juiz que tivesse admitido prova declarada inadmissível de proferir a sentença ou o acórdão.

Audiência de custódia

Em caso de urgência, a audiência de custódia poderá ser realizada por videoconferência.

Remessa dos autos

A remessa dos autos ao juiz da instrução passa a ser obrigatória. A norma que previa a permanência dos autos com o juiz das das garantias foi declarada inconstitucional.

Regra de transição

A eficácia da lei não acarretará nenhuma modificação do juízo competente nas ações penais já instauradas no momento da efetiva implementação do juiz das garantias pelos tribunais.

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=512814&tip=UN)

EMENTA: AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. ADI’S 6298, 6299, 6300 E 6305. LEI 13.964, DE 24 DE DEZEMBRO DE 2019. AMPLA ALTERAÇÃO DE NORMAS DE NATUREZA PENAL, PROCESSUAL PENAL E DE EXECUÇÃO PENAL. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE ARTIGOS PERTINENTES À ATUAÇÃO DO JUIZ E DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. CRIAÇÃO DO “JUIZ DAS GARANTIAS”. CRIAÇÃO DO “ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL”. INTRODUÇÃO E ALTERAÇÃO DE ARTIGOS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: ARTIGOS 3º-A AO 3º-F, 28, 28-A, 157, § 5º E 310, § 4º. AÇÕES JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES.

1. A jurisdição constitucional, como atividade típica deste Supremo Tribunal Federal, diferencia-se sobremaneira das funções legislativa e executiva, especialmente em relação ao seu escopo e aos seus limites institucionais. Ao contrário do Poder Legislativo e do Poder Executivo, não compete ao Supremo Tribunal Federal realizar um juízo eminentemente político do que é bom ou ruim, conveniente ou inconveniente, apropriado ou inapropriado. Ao revés, compete a este Tribunal afirmar o que é constitucional ou inconstitucional, invariavelmente sob a perspectiva da Carta da 1988.

2. A jurisdição constitucional, acionada por atores constitucionalmente legitimados, exige da Corte Suprema o escrutínio das normas impugnadas à luz da Lei Maior, equilibrando os postulados da autocontenção, diante do legítimo exercício das opções políticas pelos representantes eleitos, e da limitação constitucional ao exercício do poder político, regida pelos direitos fundamentais, pela separação e harmonia entre os poderes e pela distribuição das competências entre os diversos órgãos da União e dos Estados-membros. Como árbitro imparcial, cabe ao Supremo Tribunal Federal a função de guardião da Constituição, impedindo sua violação formal e material, observado o princípio da proporcionalidade.

3. Fixadas essas premissas, impende esclarecer que foram propostas as ADIs 6.298, 6.299, 6.300 e 6305, cujo objeto são dispositivos da Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, nos quais se impuseram: (a) alteração do procedimento de arquivamento e processamento de inquéritos policiais; (b) regras de impedimento em decorrência do mero exercício da atividade jurisdicional; (c) vacatio legis de 30 dias para implementação, em todas as unidades judiciárias do país, das novas varas de garantias; (d) afastamento do controle judicial sobre o arquivamento de investigações pelo Ministério Público; (e) vedação absoluta ao emprego da tecnologia da videoconferência na audiência de custódia; (f) relaxamento automático da prisão se o inquérito não se concluir no prazo de 15 dias, prorrogável uma única vez; (g) proibição de qualquer contato, pelo juiz de instrução e julgamento, com os autos do inquérito que tramitou perante a Vara de Garantias; (h) imposição absoluta de prévia realização de audiência pública e oral para a prorrogação de medidas cautelares penais e a produção antecipada de provas urgentes; (i) criação de sistema de rodízio de magistrados em todas as unidades judiciárias de Vara Única; (j) possibilidade de designação, e não investidura, do Juiz das Garantias; (l) criação de regulamento para disciplinar o acesso à informação, pelos meios de comunicação, sobre a prisão de investigados.

4. Ao longo da tramitação dos feitos, foi convocada audiência pública, que contou com a participação de 67(sessenta e sete) expositores. As ações contaram ainda com a participação de dezenas de entidades na qualidade de amici curiae, habilitadas para fornecer subsídios à melhor decisão possível pela Corte.

QUESTÃO PRELIMINAR. LEGITIMIDADE ATIVA. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. (a) A Presidência da República pugnou pelo não conhecimento das ações diretas de inconstitucionalidade, com espeque na ilegitimidade ativa das associações autoras e na ausência de pertinência temática das normas com os seus objetivos. (b) Os precedentes desta Suprema Corte são pacíficos no sentido de reconhecer a legitimidade da AMB e da CONAMP, “tendo em conta o seu caráter nacional e a existência de pertinência temática entre suas finalidades institucionais e o objeto de impugnação, ainda que não se limite a interesse corporativo” (ADI 2831, Relator Min. Marco Aurélio, Redator p/ acórdão Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 03/05/2021). No mesmo diapasão, registro: ADI 1578, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 04/03/2009; ADPF 144, Relator Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 06/08/2008; ADI 2874, Relator Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2003; ADI 7073, Relator Min. André Mendonça, Tribunal Pleno, julgado em 26/09/2022. (c) No que tange à pertinência temática, cuida-se de ações diretas de inconstitucionalidade que questionam a legitimidade de normas atinentes à organização e às atribuições da magistratura nacional e dos membros do Ministério Público com atuação em varas com competência, exclusiva ou não, para processar e julgar feitos de natureza penal. (d) Por conseguinte, aplica-se a jurisprudência da Corte no sentido da “pertinência temática relativamente à legitimidade da Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, admitindo que sua atividade associativa nacional busca realizar o propósito de aperfeiçoar e defender o funcionamento do Poder Judiciário, não se limitando a matérias de interesse corporativo” (ADI 1.127-8). (ADI 1303 MC, Relator Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, julgado em 14/12/1995).

MÉRITO. ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA CRIAÇÃO, OBRIGATÓRIA, DAS VARAS DE GARANTIAS EM TODO O TERRITÓRIO NACIONAL, INDEPENDENTEMENTE DAS CONDIÇÕES FINANCEIRAS, ESTRUTURAIS E DE RECURSOS HUMANOS LOCAIS. IMPLEMENTAÇÃO IMEDIATA DETERMINADA PELO LEGISLADOR, COM VACATIO LEGIS DE 30 DIAS, DECORRIDOS DURANTE O RECESSO. REGRAS DE INSTALAÇÃO, FUNCIONAMENTO, IMPEDIMENTO, FISCALIZAÇÃO E COMPETÊNCIAS JUDICIÁRIAS. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DAS LEIS DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA LOCAIS. CONCESSÃO DE NOVO PRAZO. (a) O juiz das garantias, embora formalmente concebido pela lei como norma processual geral, altera materialmente a divisão e a organização de serviços judiciários em nível tal que enseja completa reorganização da justiça criminal do país, de sorte que inafastável considerar que os artigos 3º-A ao 3º-F demandam compatibilização das diversas normas de organização judiciária locais. (b) O juízo das garantias e sua implementação causam impacto financeiro relevante ao Poder Judiciário, especialmente com as necessárias reestruturações e redistribuições de recursos humanos e materiais, bem como com o incremento dos sistemas processuais e das soluções de tecnologia da informação correlatas, a exigir a adaptação das diversas leis de organização judiciária das justiças federal e estaduais. (c) A criação obrigatória dos juízos de garantias, obrigando sua implementação em todas as unidades judiciárias do país, no prazo de 30 dias, analisada sob o ângulo da iniciativa legislativa privativa do Judiciário para dispor sobre normas de organização judiciária, bem como das competências legislativas das unidades federadas, previstas na Constituição, não incorreu em inconstitucionalidade formal. Ressalva do voto do Relator, que entendia aplicável, ao caso, a necessidade de adequação do novo instituto à natureza de norma-quadro, nos moldes adotados, pelo Congresso Nacional, para as Varas de Violência Doméstica (Lei 11.340/2006), restando vencido, no ponto da inconstitucionalidade formal. (d) Reconhecida a manifesta irrazoabilidade da vacatio legis de 30 dias para a implementação da medida em todo o território nacional, composto majoritariamente por localidades dotadas de varas únicas. Realidades locais absolutamente desconsideradas pelo texto normativo, conforme se verifica das manifestações de todos os 27 Tribunais de Justiça juntadas aos autos. (e) Todas as Cortes estaduais de justiça do país são uníssonas em afirmar que haverá elevação de custos e gastos anuais, ante a necessidade de criação de novas varas, de realização de concursos públicos para ingresso de magistrados e de servidores públicos. Afirmam que suas respectivas organizações judiciárias precisarão ser alteradas mediante lei estadual e que a elevação dos gastos com pessoal deverá ser previamente aprovada pelas Assembleias Legislativas. (f) De acordo com o Relatório “Justiça em números”, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2022, há no Brasil, atualmente, mais de 7.500.000 (sete milhões e quinhentos mil) processos criminais em andamento (não-contabilizadas as execuções penais). Destes, em torno de 2.200.000 (dois milhões e duzentos mil) são casos novos. (g) Se imediatamente aplicadas as regras atinentes aos juízes de garantias, seriam fatalmente paralisadas cerca de 5 milhões de ações penais, até que os diversos Estados se reorganizassem e propiciassem a separação da competência dos juízes criminais. (h) Diante da potencial paralisação de todas as ações penais em curso no país e da inviabilização da prestação jurisdicional, deve ser concedido prazo de 12 meses, prorrogável por mais 12 meses, para que sejam adotadas as medidas legislativas e administrativas necessárias à adequação das diferentes leis de organização judiciária, à efetiva implantação e ao efetivo funcionamento do juiz das garantias em todo o país, tudo conforme as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça e sob a supervisão dele. (i) Consequentemente, ratificada a necessidade das medidas cautelares anteriormente concedidas, deve ser declarada a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 20 da Lei 13.964/2019, quanto à fixação do prazo de 30 dias para a instalação dos juízes das garantias.

DO ARTIGO 3º-A AO 3º-F. JUÍZES DAS GARANTIAS E NORMAS CORRELATAS. I – ARTIGO 3º-A. ESTRUTURA ACUSATÓRIA DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DERIVAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO. VEDAÇÃO, A PRIORI, À INICIATIVA DO JUIZ NA FASE DE INVESTIGAÇÃO E À SUBSTITUIÇÃO DA ATIVIDADE PROBATÓRIA DAS PARTES PELO JUIZ. COMPATIBILIZAÇÃO COM AS NORMAS QUE AUTORIZAM A AUTORIDADE JUDICIAL, PONTUALMENTE, A DIRIMIR EVENTUAL DÚVIDA REMANESCENTE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. (a) O artigo 3º-A, incluído no Código de Processo Penal pela Lei 13.964, estabeleceu que “O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação”. (b) A estrutura acusatória do processo penal, prevista na primeira parte do dispositivo, apenas torna expresso, no texto do Código de Processo Penal, o princípio fundamental do processo penal brasileiro, extraído da sistemática constitucional, na esteira da doutrina e da jurisprudência pátrias. (c) Deveras, na lição de Luigi Ferrajoli “A separação de juiz e acusação é o mais importante de todos os elementos constitutivos do modelo teórico acusatório, como pressuposto estrutural e lógico de todos os demais” (Derecho y Razón – Teoría del Garantismo Penal. 3ª ed., Madrid: Trotta, 1998. p. 567, tradução nossa). (d) Esta Corte assentou a compreensão de que “O princípio fundante do sistema ora analisado, a toda evidência, é o princípio acusatório, norma decorrente do due process of law (art. 5º, LIV, CRFB) e prevista de forma marcante no art. 129, I, da CRFB, o qual exige que o processo penal seja marcado pela clara divisão entre as funções de acusar, defender e julgar, considerando-se o réu como sujeito, e não como objeto da persecução penal” (ADI 4414, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, j. 31/05/2012). (e) Deriva do princípio acusatório a vedação, a priori, à iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória das partes. A posição do juiz no processo é regida pelos princípios da imparcialidade e da equidistância, porquanto “[...] A separação entre as funções de acusar defender e julgar é o signo essencial do sistema acusatório de processo penal (Art. 129, I, CRFB), tornando a atuação do Judiciário na fase pré-processual somente admissível com o propósito de proteger as garantias fundamentais dos investigados” (ADI 4414, Relator Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 31/05/2012). (f) A legítima vedação à substituição da atuação probatória do órgão de acusação significa que o juiz não pode, em hipótese alguma, tornar-se protagonista do processo. Simultaneamente, remanesce a possibilidade de o juiz, de ofício: (a) “determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante” (artigo 156, II); (b) determinar a oitiva de uma testemunha (artigo 209); (c) complementar a sua inquirição (artigo 212) e (d) “proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição” (artigo 385). (g) Diante da obrigatoriedade e da indisponibilidade que caracterizam a ação penal pública no direito processual penal brasileiro, as manifestações do Ministério Público submetem-se ao controle judicial, no âmbito do qual compete aos juízes competentes para o julgamento da ação penal impedir que, direta ou indiretamente, aqueles princípios sejam violados nos autos. Deveras, os institutos da desistência ou da perempção são aplicáveis exclusivamente às ações penais privadas. (h) Como registrado em sede jurisprudencial, “A submissão do magistrado à manifestação final do Ministério Público, a pretexto de supostamente concretizar o princípio acusatório, implicaria, em verdade, subvertê-lo, transmutando o órgão acusador em julgador e solapando, além da independência funcional da magistratura, duas das basilares características da jurisdição: a indeclinabilidade e a indelegabilidade.” (REsp n. 2.022.413/PA, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/2/2023, DJe de 7/3/2023.) (i) Nestes termos, o novo artigo 3º-A do Código de Processo Penal, na redação dada pela Lei 13.964/2019, deve ser interpretado de modo a vedar a substituição da atuação de qualquer das partes pelo juiz, sem impedir que o magistrado, pontualmente, nos limites legalmente autorizados, determine a realização de diligências voltadas a dirimir dúvida sobre ponto relevante.

II – ARTIGO 3º-B. CRIAÇÃO DOS JUÍZES DAS GARANTIAS. CONTROLE DA LEGALIDADE DA INVESTIGAÇÃO. FUNÇÕES TRADICIONAIS DOS JUÍZES NO INQUÉRITO. NECESSIDADE DE CONTROLE DE TODOS OS ATOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELA AUTORIDADE JUDICIAL. DEVER DO ÓRGÃO MINISTERIAL DE SUBMETER A INSTAURAÇÃO E O ARQUIVAMENTO DE CADERNOS INVESTIGATÓRIOS DE QUALQUER NATUREZA (INQUÉRITOS, PIC’S E OUTROS) AO CONHECIMENTO E CONTROLE DO JUÍZO DAS GARANTIAS. OBRIGATORIEDADE DA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA PÚBLICA E ORAL ANTERIORMENTE À PRORROGAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES E À PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS. SUBMISSÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. VEDAÇÃO ABSOLUTA AO EMPREGO DE VIDEOCONFERÊNCIA NAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA. IRRAZOABILIDADE. COMPETÊNCIA DO JUIZ DAS GARANTIAS PARA O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ERRO LEGÍSTICO. INCOMPATIBILIDADE COM A SISTEMÁTICA DO INSTITUTO. RELAXAMENTO AUTOMÁTICO DA PRISÃO AO FIM DO PRAZO PARA A CONCLUSÃO DO INQUÉRITO. INCONSTITUCIONALIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO DOS DISPOSITIVOS IMPUGNADOS. (a) O artigo 3º-B, em seus 18 incisos, elencou as competências do juiz na fase do inquérito, correspondendo, em linhas gerais, à mera explicitação das funções já exercidas pelos juízes brasileiros no controle da legalidade da fase de investigação. (b) Além das competências dos juízes de garantias, foram estabelecidas regras processuais e disciplinados atos processuais específicos, pertinentes à fiscalização dos atos de instauração e de arquivamento de inquérito pelo Ministério Público, à obrigatoriedade de realizar audiência pública e oral anteriormente à prorrogação de medidas cautelares e à produção antecipada de provas urgentes, competência para o recebimento da denúncia e vedação absoluta ao emprego da tecnologia de videoconferência nas audiências de custódia, sob pena de imediato relaxamento da prisão em flagrante, todas a demandar interpretação conforme a Constituição. (c) Os incisos IV, VIII e IX tratam da competência do juiz das garantias para a fiscalização de investigações criminais: “IV - ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal; [...] VIII - prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no § 2º deste artigo; IX - determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento”. (d) Considerada a frequente instauração de investigações criminais, sob outros títulos que não o de inquérito, deve ser dada interpretação conforme à Constituição aos referidos incisos, de modo a determinar que que todos os atos praticados pelo Ministério Público como condutor de investigação penal se submetam ao controle judicial (HC 89.837/DF, Rel. Min. Celso de Mello) e fixar o prazo de até 90 (noventa) dias, contados da publicação da ata do julgamento, para os representantes do Ministério Público encaminharem, sob pena de nulidade, todos os PIC e outros procedimentos de investigação criminal, mesmo que tenham outra denominação, ao respectivo juiz natural, independentemente de o juiz das garantias já ter sido implementado na respectiva jurisdição. (e) O artigo 3º-B, incisos VI e VII, estabelecem a obrigatoriedade da prévia realização de audiência pública e oral, para a prorrogação de medidas cautelares e a produção antecipada de provas urgentes e irrepetíveis, in verbis: “VI - prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou em legislação especial pertinente; VII - decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral”. (f) O disposto no inciso VI deve submeter-se à interpretação conforme a Constituição, para fins de prever que o exercício do contraditório será preferencialmente em audiência pública e oral. (g) A previsão de audiência pública e oral previamente à produção antecipada de provas consideradas urgentes, contida no inciso VII, o dispositivo deve ser interpretado à luz da Constituição, para estabelecer que o juiz pode deixar de realizar a audiência quando houver risco para o processo, ou diferi-la em caso de necessidade. (h) A competência do juiz das garantias, nos termos do inciso XIV do artigo 3º-B, estender-se-ia até a fase do artigo 399 do Código Penal. O texto do dispositivo prevê competir-lhe “decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art. 399 deste Código”. Nada obstante, constata-se manifesto erro legístico, porquanto o artigo 399 do Código de Processo Penal estabelece que “Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente”. Trata-se, portanto, de ato de designação da audiência de instrução e julgamento, típica função do juiz da instrução da ação penal. (i) Reconhecido o erro legístico e submetido o inciso XIV à interpretação sistemática, considerada a principiologia inspiradora do instituto do juiz das garantias, a Corte conferiu-lhe interpretação conforme a Constituição, para assentar que a competência do juiz das garantias cessa com o oferecimento da denúncia. (j) O artigo 3º-B, § 1º, do Código de Processo Penal previu vedação absoluta ao emprego de videoconferência nas audiências de custódia, nos seguintes termos: “O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o emprego de videoconferência”. (l) O dispositivo revela manifesta violação ao princípio da proporcionalidade, diante da vedação ex ante sem considerações de ordem concreta que possam impedir a realização da audiência presencial no exíguo prazo legal. (m) Consectariamente, promove-se interpretação conforme a Constituição do § 1º do art. 3º-B do CPP, incluído pela Lei nº 13.964/2019, para estabelecer que o preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz das garantias, no prazo de 24 horas, salvo impossibilidade fática, momento em que se realizará a audiência com a presença do ministério pública e da defensoria pública ou de advogado constituído, cabendo, excepcionalmente, o emprego de videoconferência, mediante decisão da autoridade judiciária competente, desde que este meio seja apto à verificação da integridade do preso e à garantia de todos os seus direitos. (n) O relaxamento automático da prisão cautelar ao fim do prazo legal para a conclusão das investigações, imposto pelo artigo 3º-B, § 2º, revela-se absolutamente desproporcional e em dissonância com a inafastabilidade da jurisdição. A jurisprudência desta Corte tradicionalmente submete ao princípio da razoabilidade todos os dispositivos de lei que estabelecem prazos peremptórios de duração de medidas cautelares processuais. (o) Com efeito, o primado da realidade exige que se considerem razões concretas e imperiosas, fundadas na complexidade do caso e na periculosidade dos envolvidos, a demandar a prorrogação excepcional das investigações e a manutenção da custódia prisional, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária competente. (p) Nestes termos, é necessária a interpretação conforme a Constituição, para atribuir interpretação conforme ao § 2º do art. 3º-B, para assentar que: a) o juiz pode decidir de forma fundamentada, reconhecendo a necessidade de novas prorrogações do inquérito, diante de elementos concretos e da complexidade da investigação; e b) a inobservância do prazo previsto em lei não implica a revogação automática da prisão preventiva, devendo o juízo competente ser instado a avaliar os motivos que a ensejaram, nos termos da ADI nº 6.581.

III – ARTIGO 3º-C. MATÉRIAS SUBMETIDAS À NOVA SISTEMÁTICA DO JUÍZO DAS GARANTIAS. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, PARA EXCLUSÃO DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS INCOMPATÍVEIS COM O MODELO. MARCO FINAL DA COMPETÊNCIA DO JUIZ DAS GARANTIAS: OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. AUTOS DO INQUÉRITO. PROIBIÇÃO DE REMESSA AO JUIZ DA INSTRUÇÃO. IRRAZOABILIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO DOS DISPOSITIVOS IMPUGNADOS. (a) O artigo 3º-C, caput, do Código de Processo Penal, incluído pela Lei 13.964/2019, delimitou a extensão da competência do juiz das garantias, nos seguintes termos: “A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código”. (b) As razões anteriormente expendidas revelam que o texto impugnado incorreu em erro legístico, do qual deriva a necessidade de restrição da competência para que cesse com o oferecimento da denúncia. (c) Ademais, além das infrações penais de menor potencial ofensivo, de competência dos juizados especiais, a nova sistemática do juiz das garantias não se compatibiliza com o procedimento especial previsto na Lei 8.038/1990, que trata dos processos de competência originária dos tribunais; com o rito do tribunal do júri; com os casos de violência doméstica e familiar. (d) Por tais motivos, deve ser atribuída interpretação conforme à primeira parte do caput do art. 3º-C do CPP, incluído pela Lei nº 13.964/2019, para esclarecer que as normas relativas ao juiz das garantias não se aplicam às seguintes situações: (1) processos de competência originária dos tribunais, os quais são regidos pela Lei nº 8.038/1990; (2) processos de competência do tribunal do júri; (3) casos de violência doméstica e familiar; e (4) infrações penais de menor potencial ofensivo. (e) Ao mesmo tempo, as referências à competência do juiz das garantias para receber a denúncia, constantes do caput e dos §§ 1º e 2º, do artigo 3º-C, revelam-se inconstitucionais, atribuindo-se interpretação conforme a Constituição no sentido de fixar que a competência do juiz das garantias cessa com o oferecimento da denúncia e, por conseguinte, oferecida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento. (f) A Lei 13.964/2019 estabeleceu, ainda, nos §§ 3º e 4º do artigo 3º-C, a vedação do conhecimento dos autos do inquérito pelo juiz da instrução e julgamento, impedindo sua remessa juntamente com a denúncia. (g) Os textos dos dispositivos impugnados têm o seguinte teor: “§ 3º Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado. § 4º Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na secretaria do juízo das garantias.” (h) Constata-se a manifesta irrazoabilidade do acautelamento dos autos do inquérito na secretaria do juízo das garantias, porquanto o fundamento da norma reside tão-somente na pressuposição de que o juiz da ação penal, ao tomar conhecimento dos autos da investigação, perderia sua imparcialidade para o julgamento do mérito. Ocorre que, sem tomar conhecimento dos elementos configuradores da justa causa para a ação penal (indícios de autoria e de materialidade), inviabiliza-se a prolação de decisões fundamentadas. (i) Por conseguinte, declara-se a inconstitucionalidade, com redução de texto, dos §§ 3º e 4º do art. 3º-C do CPP, incluídos pela Lei nº 13.964/2019 e, mediante interpretação conforme, fixar que os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias serão remetidos ao juiz da instrução e julgamento.

IV – ARTIGO 3º-D. REGRA DE IMPEDIMENTO, PARA A SUBSEQUENTE AÇÃO PENAL, DE MAGISTRADO QUE TENHA PRATICADO QUALQUER DAS COMPETÊNCIAS PREVISTAS NOS ARTIGOS 4º E 5º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MANIFESTO ERRO LEGÍSTICO. REFERÊNCIA ÀS ATRIBUIÇÕES DA AUTORIDADE POLICIAL, E NÃO ÀS FUNÇÕES JUDICIAIS NO INQUÉRITO. EVIDÊNCIA DA APROVAÇÃO AÇODADA DA MATÉRIA, SEM CONSIDERAÇÃO DOS SEUS EFEITOS SISTÊMICOS PARALISADORES DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL EM MATÉRIA PENAL. PRESUNÇÃO DE PARCIALIDADE DOS JUÍZES, DECORRENTE DO MERO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO JURISDICIONAL. ABSOLUTA IRRAZOABILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO ARTIGO 3º-D, CAPUT, DO CPP, INCLUÍDO PELA LEI 13.964/2019. ARTIGO 3º-D, PARÁGRAFO ÚNICO. CRIAÇÃO DE SISTEMA DE RODÍZIO NAS VARAS EM QUE FUNCIONAR APENAS UM JUIZ. MATÉRIA ATINENTE ÀS LEIS DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. (a) O artigo 3º-D, caput, estabeleceu a seguinte regra de impedimento: “O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências dos arts. 4º e 5º deste Código ficará impedido de funcionar no processo.” (b) Em primeiro lugar, observa-se que o texto, erroneamente, alude aos artigos 4º e 5º do Código de Processo Penal, que tratam de atribuições exclusivas da autoridade policial no inquérito. Deveras, o artigo 4º prevê, expressamente, que “A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.” Por seu turno, o artigo 5º contém as regras de procedimento e os requisitos necessários para a regular instauração do inquérito policial. (c) Constata-se que a regra do impedimento teve por fundamento a presunção absoluta de parcialidade do juiz que houvesse atuado no inquérito para processar e julgar a ação penal dele oriunda. Parte-se da premissa de que os juízes que acompanham investigações tendem a produzir vieses prejudiciais ao exercício imparcial da jurisdição, especialmente na fase processual penal. (d) As contribuições da Análise Econômica do Direito e das ciências comportamentais (behavioral sciences) à seara jurídica, mormente quanto aos possíveis vieses cognitivos gerados pela atuação do julgador, revelam que essa presunção absoluta conduz a generalizações inadequadas. (e) A base das ciências comportamentais é o caráter empírico de seus argumentos. A existência de estudos empíricos segundo os quais seres humanos desenvolvem vieses em seus processos decisórios não autoriza a presunção generalizada de que qualquer juiz criminal do país tem tendências comportamentais típicas de favorecimento à acusação. (f) Conforme bem demonstra Pery Francisco Assis Shikida, pesquisador na área da Análise Econômica do Direito, a instituição do juiz das garantias, combinada com a morosidade atual de muitos juízos criminais do país em consequência do assolamento de processos, pode favorecer a impunidade e prejudicar a duração razoável do processo (SHIKIDA, Pery Francisco Assis. A economia e o juiz de “garantias”. Disponível em Portal Jota Info, 08.01.2020; Vide também: SCHAEFER, Gilberto José; SHIKIDA, Pery Francisco Assis. Economia do Crime: elementos teóricos e evidências empíricas. Revista Análise Econômica, Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS, Porto Alegre, v. 19, n. 36, 2001). (g) A Lei 13.964/2019 estabeleceu, assim, uma presunção legal absoluta (juris et de jure, e não juris tantum) de parcialidade do juiz que, no exclusivo exercício da função jurisdicional, tenha proferido decisões na fase do inquérito. (h) A articulação dos conceitos de “imparcialidade objetiva” ou “aparência de imparcialidade”, segundo os quais a lei deve evitar que uma causa seja julgada por magistrado de cuja imparcialidade se possa suspeitar, parte do pressuposto de que todos os indivíduos, em razão de suas próprias limitações, estão sujeitos a um viés de confirmação de suas decisões pretéritas. Consequentemente, segundo este entendimento, a lei deve considerar impedido de julgar um juiz que esteja comprometido com um conhecimento prévio dos fatos da investigação, para preservar “a aparência de imparcialidade”. (i) Esta ordem de considerações não está em consonância com os pressupostos epistemológicos de criação e funcionamento das normas jurídicas, da justiça e dos regramentos necessários à organização da sociedade humana. Se, de um lado, a limitação do conhecimento e da própria racionalidade humana é um dos temas clássicos das reflexões filosóficas, que encontrou uma de suas primeiras e mais inspiradas expressões na Alegoria da Caverna, de Platão, por outro lado, a racionalidade limitada e os condicionamentos das heurísticas individuais não nos conduzem a pressupor que os seres humanos são irracionais e destituídos de livre-arbítrio. Ao contrário, a previsão de regras de comportamento e de sanção para sua violação, que caracteriza todo o sistema jurídico, erige-se sobre o pressuposto de que os indivíduos se comportam e decidem, em regra, como seres dotados de livre arbítrio e de racionalidade. (j) A presunção absoluta do viés de confirmação de decisões pretéritas, que inspirou o artigo 3º-D da Lei 13.964/2019, nutre-se de convicções opostas, admitindo, como regra, a irracionalidade do juiz e sua incapacidade para tomar decisões fundadas em dados e elementos objetivos de convicção, deixando-se guiar por heurísticas e vieses inconscientes de confirmação, sem quaisquer fundamentos. (l) Diante da manifesta irrazoabilidade da norma de impedimento estabelecida no artigo 3º-D do Código de Processo Penal, incluída pela Lei 13.964/2019, deve ser declarada sua inconstitucionalidade material. (m) O artigo 3º-D, parágrafo único, por sua vez, implementa norma típica de organização judiciária, ao dispor que “Nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados, a fim de atender às disposições deste Capítulo.” (n) Trata-se de evidente invasão da competência legislativa das unidades federadas (Estados-membros), que são de iniciativa legislativa exclusiva do Poder Judiciário. Com efeito, é firme o entendimento desta Corte no sentido de que “o tema é de organização judiciária, prevista em lei editada no âmbito da competência dos Estados-membros (art. 125 da CRFB)” (ADI 1218, Relator Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, julgado em 05/09/2002, DJ 08-11-2002; HC 96104, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 16/06/2010, Dje-145; HC 94146, Relatora Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 21/10/2008, Dje-211; HC 85060, Relator Min. Eros Grau, Primeira Turma, julgado em 23/09/2008, Dje-030; HC 91024, Relatora Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 05/08/2008, Dje-157.) (o) Por conseguinte, a par da inconstitucionalidade material do artigo 3º-D, caput,deve ser declarada a inconstitucionalidade formal do respectivo parágrafo único.

V – ARTIGO 3º-E. DESIGNAÇÃO DO JUIZ DAS GARANTIAS PELO RESPECTIVO TRIBUNAL. NATUREZA DISCRICIONÁRIA E PRECÁRIA DO ATO DE DESIGNAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM AS GARANTIAS DA MAGISTRATURA. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. (a) O artigo 3º-E, incluído no Código de Processo Penal pela Lei 13.946/2019, consigna que “O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal.” (b) A designação caracteriza-se como ato administrativo de natureza discricionária e a título precário, incompatível com a garantia da magistratura pertinente à inamovibilidade, pressuposto da independência funcional. (c) Por conseguinte, confere-se interpretação conforme a Constituição ao artigo 3º-E para assentar que o juiz das garantias será investido, e não designado, conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal.

VI – ARTIGO 3º-F. REGRAS DE TRATAMENTO DE PRESOS. PROIBIÇÃO DE CONLUIO ENTRE ÓRGÃOS DA IMPRENSA E AUTORIDADES, PARA FINS DE EXPLORAÇÃO DA IMAGEM DA PESSOA SUBMETIDA À PRISÃO. CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO DISPOSITIVO. ARTIGO 3º-F, PARÁGRAFO ÚNICO. PREVISÃO DE EDIÇÃO DE REGULAMENTO, EM 180 DIAS, PELAS AUTORIDADES, PARA DISCIPLINAR O MODO PELO QUAL AS INFORMAÇÕES SOBRE A PRISÃO E A IDENTIDADE DO PRESO SERÃO, DE MODO PADRONIZADO, TRANSMITIDAS À IMPRENSA. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO CONFORME. (a) A proteção da dignidade da pessoa submetida à prisão é objeto de diversas normas do nosso ordenamento, v. g.: (1) artigo 41, inciso VIII, da Lei de Execuções Penais, segundo a qual configura direito do preso a “proteção contra qualquer forma de sensacionalismo”; (2) artigo 13 da Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), criminalizando o ato de submissão do preso, mediante violência, grave ameaça ou redução da sua capacidade de resistência, a situação vexatória, constrangimento ou exibição à curiosidade pública. (b) O novel diploma acrescenta, entre as competências do juiz das garantias, a de impedir o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos de imprensa, para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal. (c) O artigo 3º-F, caput, impugnado nestas ADIs, revela-se em consonância com as preocupações contra a exploração da imagem da pessoa submetida à prisão, emanando do princípio da dignidade da pessoa humana, razão pela qual deve ser declarada sua constitucionalidade material. (d) A determinação legal de edição de regulamento, pelas autoridades, no prazo de 180 dias, para dispor sobre a padronização das relações entre a imprensa e os órgãos de persecução penal, conquanto imbuída das mesmas preocupações protetivas da dignidade da pessoa presa, deve ser interpretada de modo a compatibilizá-la com a liberdade jornalística e de imprensa. (e) De um lado, a restrição, ex ante, à obtenção e divulgação de fatos verdadeiros pela imprensa pode ter inequívoco efeito inibidor (chilling effect) sobre toda a mídia. De outro lado, eventual restrição, pelos regulamentos a serem expedidos, à veiculação de informações sobre pessoas encarceradas também poderá gerar proteção insuficiente aos próprios detentos: a limitação da reprodução de imagens de indivíduos presos impediria reportagens sobre situações de abuso (e.g. uso de força excessiva; encarceramento em condições degradantes etc.), reduzindo o âmbito da responsabilidade (accountability) do Estado no exercício das suas potestades punitivas. (f) Por conseguinte, de modo a compatibilizar o artigo 3º-F, parágrafo único, com o artigo 220 da Constituição Federal, deve-se atribuir interpretação conforme ao dispositivo impugnado, para assentar que a divulgação de informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso pelas autoridades policiais, ministério público e magistratura deve assegurar a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão.

VII – ARTIGO 28. ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ATO UNILATERAL. AFASTAMENTO DO CONTROLE JUDICIAL. SUBMISSÃO APENAS ÀS INSTÂNCIAS INTERNAS DE CONTROLE. ATRIBUIÇÃO UNICAMENTE À VÍTIMA E À AUTORIDADE POLICIAL DO PODER DE PROVOCAR A REVISÃO DO ATO. INCONSTITUCIONALIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. (a) A nova sistemática do arquivamento de inquéritos, de maneira louvável, criou mecanismo de controle e transparência da investigação pelas vítimas de delitos de ação penal pública. Com efeito, a partir da redação dada ao artigo 28 do Código de Processo Penal pela Lei 13.964/2019, passa a ser obrigatória a comunicação da decisão de arquivamento à vítima (comunicação que, em caso de crimes vagos, será feita aos procuradores e representantes legais dos órgãos lesados), bem como ao investigado e à autoridade policial, antes do encaminhamento aos autos, para fins de homologação, para a instância de revisão ministerial. (b) Por outro lado, ao excluir qualquer possibilidade de controle judicial sobre o ato de arquivamento da investigação, a nova redação violou o princípio da inafastabilidade da jurisdição, nos termos do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição. (c) Há manifesta incoerência interna da lei, porquanto, no artigo 3º-B, determinou-se, expressamente, que o juízo competente seja informado da instauração de qualquer investigação criminal. Como consectário lógico, se a instauração do inquérito deve ser cientificada ao juízo competente, também o arquivamento dos autos precisa ser-lhe comunicado, não apenas para a conclusão das formalidades necessárias à baixa definitiva dos autos na secretaria do juízo, mas também para verificação de manifestas ilegalidades ou, ainda, de manifesta atipicidade do fato, a determinar decisão judicial com arquivamento definitivo da investigação. (d) A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal orienta-se no sentido da necessidade e legitimidade constitucional do controle judicial do ato de arquivamento, com o fito de evitar possíveis teratologias (Inquérito 4781, Rel. Min. Alexandre de Moraes). (e) Em decorrência destas considerações, também o § 1º do artigo 28, ao dispor que “Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica”, deve ser interpretado de modo a integrar a autoridade judiciária competente entre as habilitadas a submeter a matéria à revisão do arquivamento pela instância competente. (f) Por todo o exposto, conferiu-se interpretação conforme a Constituição ao artigo 28, caput, para assentar que, ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público submeterá sua manifestação ao juiz competente e comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar os autos para o Procurador-Geral ou para a instância de revisão ministerial, quando houver, para fins de homologação, na forma da lei, vencido, em parte, o Ministro Alexandre de Moraes, que incluía a revisão automática em outras hipóteses. (g) Ao mesmo tempo, assentou-se a interpretação conforme do artigo 28, § 1º, para assentar que, além da vítima ou de seu representante legal, a autoridade judicial competente também poderá submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, caso verifique patente ilegalidade ou teratologia no ato do arquivamento.

VIII – ARTIGO 28-A. INCISOS III E IV E PARÁGRAFOS 5º, 6º E 8º. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. SUBMISSÃO AO CONTROLE JUDICIAL ACERCA DA LEGALIDADE E VOLUNTARIEDADE DO ACORDO. AUTONOMIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. VIOLAÇÃO DA IMPARCIALIDADE OBJETIVA DO MAGISTRADO. INOCORRÊNCIA. NORMAS DECLARADAS MATERIALMENTE CONSTITUCIONAIS. (a) Os dispositivos pertinentes à regulação do novel instituto do Acordo de Não Persecução Penal, inserido no artigo 28-A e parágrafos do Código de Processo Penal, pela Lei 13.964/2019, foram impugnados pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), ao fundamento de que “a escolha do legislador de conferir ao magistrado esse papel de controlador do acordo de não persecução penal, da forma como foi posta, é medida flagrantemente inconstitucional, por violar o sistema acusatório, a autonomia do membro do Ministério Público e a imparcialidade objetiva do magistrado”. (b) O Acordo de Não Persecução Penal possibilita a solução negocial do litígio de natureza penal, mediante confissão circunstanciada dos fatos criminosos praticados pelo investigado, respeitadas as condições e requisitos legais estabelecidos na lei. (c) O legislador previu modalidades de controle judicial sobre o Acordo firmado entre o Ministério Público e o investigado, quais sejam: (1) artigo 28-A, incisos III (definição, pelo juízo da execução penal, do local de cumprimento da pena de prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas); (2) artigo 28-A, IV (definição pelo juízo da execução da entidade pública ou de interesse social a receber a prestação pecuniária imposta ao investigado); (3) artigo 28-A, § 5º (“Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor”); (4) artigo 28-A, § 6º (“Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal.”); e (5) artigo 28-A, § 8º (“Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia.”) (d) As normas impugnadas revelam-se compatíveis, formal e materialmente, com a Constituição da República, porquanto, conforme assentado anteriormente, trata-se de medida que também prestigia o princípio da inafastabilidade da jurisdição e uma espécie de “freios e contrapesos” no processo penal (art. 28-A, § 5°). Constata-se que as alterações legislativas, ao delinearem o instituto da não-persecução penal, apenas positivaram o que já era consagrado pela jurisprudência do STF em relação ao acordo de colaboração premiada. (e) Improcedente, portanto, o pleito de inconstitucionalidade no tocante ao artigo 28-A, incisos III e IV, e §§ 5º, 7º e 8º, do Código de Processo Penal, que devem ser declarados constitucionais.

IX - ARTIGO 157, § 5º. ALTERAÇÃO DO JUIZ NATURAL QUE CONHECEU PROVA DECLARADA INADMISSÍVEL. INCONSTITUCIONALIDADE DA REGRA DE IMPEDIMENTO AUTOMÁTICO. (a) A Lei 13.964/2019 introduziu uma segunda regra de impedimento da autoridade judicial, fundada na presunção de sua parcialidade em razão de ter tomado conhecimento de provas declaradas ilícitas. (b) Deveras, o texto do artigo 157, § 5º, ora impugnado, estabeleceu que “O juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão.” (c) Trata-se de norma manifestamente irrazoável, desproporcional e incompatível com os postulados constitucionais. Isto porque os princípios da legalidade, do juiz natural e da razoabilidade restam violados pela regra em questão, permitindo eventual manipulação da escolha do órgão julgador ou sua exclusão, conduzindo à inconstitucionalidade a técnica eleita legislativamente. (d) Em conclusão, o artigo 157, § 5º, do CPP, ao estabelecer que o juiz, simplesmente por conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível, não poderá proferir a sentença ou acórdão, revela inconstitucionalidade material manifesta, atentando, ainda, contra as normas insculpidas no artigo 5º, incisos LIII e LXXVIII, da CRFB/1988, concernentes ao juiz natural e à garantia da duração razoável dos processos.

X - ARTIGO 310, CAPUT E § 4°, CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ILEGALIDADE DA PRISÃO PELA NÃO REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO PRAZO DE 24 HORAS. RELAXAMENTO AUTOMÁTICO. INCONSTITUCIONALIDADE. (a) O artigo 310 do Código de Processo Penal, que disciplina o procedimento consecutivo à prisão em flagrante, estabeleceu, na redação dada pela Lei 13.964/2019, que “Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente”. (b) Simultaneamente, a lei ora impugnada incluiu, no artigo 310 do Código de Processo Penal, o § 4º, segundo o qual “Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo estabelecido no caput deste artigo, a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva”. (c) A imposição da ilegalidade automática da prisão, como consequência jurídica da não realização da audiência de custódia no prazo de 24 horas, fere a razoabilidade, uma vez que desconsidera dificuldades práticas locais de várias regiões do país, bem como dificuldades logísticas decorrentes de operações policiais de considerável porte. A categoria aberta “motivação idônea”, que excepciona a ilegalidade da prisão, é demasiadamente abstrata e não fornece baliza interpretativa segura para aplicação do dispositivo. (d) Pelas razões já expendidas quando da análise da constitucionalidade do artigo 3º-B, § 2º, as normas impugnadas devem ser submetidas à técnica da interpretação conforme a Constituição, para adequada observância e aplicação nos casos por ela regidos. (e) Por conseguinte, deve-se atribuir interpretação conforme ao caput do art. 310 do CPP, alterado pela Lei nº 13.964/2019, para assentar que o juiz, em caso de urgência e se o meio se revelar idôneo, poderá realizar a audiência de custódia por videoconferência (f) Confere-se, por fim, interpretação conforme ao § 4º do art. 310 do CPP, incluído pela Lei nº 13.964/2019, para assentar que a autoridade judiciária deverá avaliar se estão presentes os requisitos para a prorrogação excepcional do prazo ou para sua realização por videoconferência, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva. Ações diretas de inconstitucionalidade julgadas parcialmente procedentes.
(STf - ADI 6298, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 24-08-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 18-12-2023  PUBLIC 19-12-2023)

​Art. 3.º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente:  (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)      (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

I - receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do caput do art. 5.º da Constituição Federal;    (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

II - receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

III - zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

IV - ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

V - decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar, observado o disposto no § 1.º deste artigo; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

VI - prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste Código ou em legislação especial pertinente; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

VII - decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa em audiência pública e oral; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

VIII - prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no § 2.º deste artigo; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

IX - determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

X - requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XI - decidir sobre os requerimentos de: (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

c) busca e apreensão domiciliar; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

d) acesso a informações sigilosas; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XII - julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XIII - determinar a instauração de incidente de insanidade mental; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XIV - decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art. 399 deste Código; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XV - assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que concerne, estritamente, às diligências em andamento; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XVI - deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XVII - decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação; (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

XVIII - outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

§ 1.º O preso em flagrante ou por força de mandado de prisão provisória será encaminhado à presença do juiz de garantias no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, momento em que se realizará audiência com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado constituído, vedado o emprego de videoconferência. (Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)       (Vigência)

Nota: Vide ADI’s 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305.

§ 2.º Se o investigado estiver preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Legislação correlata:

- Vide: Art. 310 do Código de Processo Penal - Prisão e audiência de custódia.

Nota:

- Vide: Enunciado n.º 30 do CJF/STJ: Excepcionalmente e de forma fundamentada, nos casos em que se faça inviável a realização presencial do ato, é possível a realização de audiência de custódia por sistema de videoconferência.

 

Jurisprudência:

 

01) Juiz das garantias - Vigência dos dispositivos da Lei n.º 13.964/2019 que tratam da matéria ("Pacote Anticrime") - Suspensão da criação:

Notícias do STF - Quarta-feira, 22 de janeiro de 2020 

Ministro Luiz Fux suspende criação de juiz das garantias por tempo indeterminado

O ministro Luiz Fux, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu por tempo indeterminado a eficácia das regras do Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) que instituem a figura do juiz das garantias. A decisão cautelar, proferida nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6298, 6299, 6300 e 6305, será submetida a referendo do Plenário. O ministro Fux, que assumiu o plantão judiciário no STF no domingo (19), é o relator das quatro ações. Em sua decisão, o ministro Fux afirma que a implementação do juiz das garantias é uma questão complexa que exige a reunião de melhores subsídios que indiquem, “acima de qualquer dúvida razoável”, os reais impactos para os diversos interesses tutelados pela Constituição Federal, entre eles o devido processo legal, a duração razoável do processo e a eficiência da justiça criminal.

Autonomia

Para o ministro, em análise preliminar, a regra fere a autonomia organizacional do Poder Judiciário, pois altera a divisão e a organização de serviços judiciários de forma substancial e exige “completa reorganização da Justiça criminal do país, preponderantemente em normas de organização judiciária, sobre as quais o Poder Judiciário tem iniciativa legislativa própria”. O ministro observou, ainda, ofensa à autonomia financeira do Judiciário. No seu entendimento, a medida causará impacto financeiro relevante, com a necessidade de reestruturação e redistribuição de recursos humanos e materiais e de adaptação de sistemas tecnológicos sem que tenha havido estimativa prévia, como exige a Constituição. Ele salientou a ausência de previsão orçamentária inclusive para o Ministério Público, cuja atuação também será afetada pelas alterações legais. 

Audiência de custódia

O ministro Fux suspendeu também a eficácia do artigo 310, parágrafo 4.º, do Código de Processo Penal (CPP), que prevê a liberalização da prisão pela não realização da audiência de custódia no prazo de 24 horas. Segundo ele, apesar da importância do instituto da audiência de custódia para o sistema acusatório penal, a nova regra inserida no CPP pelo Pacote Anticrime fere a razoabilidade, uma vez que desconsidera dificuldades práticas locais de várias regiões do país e dificuldades logísticas decorrentes de operações policiais de considerável porte.

Com a decisão, fica revogada liminar parcialmente concedida pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que, entre outros pontos, prorrogava o prazo para implementação do juiz das garantias por 180 dias.

Leia a íntegra da decisão

Processo relacionado: ADI 6298.

(Fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=435253)

02) Audiência de custódia por videoconferência - Período de pandemia da Covid-19 - Admissibilidade:

Notícias do STF - 28/06/2021 - 16h48

Ministro autoriza realização de audiências de custódia por videoconferência durante a pandemia

Para o ministro Nunes Marques, a proibição incluída no CPP pela Lei Anticrime é desproporcional e contraria atos legislativos que favorecem medidas de isolamento social.

O ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu parcialmente liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6841) para autorizar a realização de audiências de custódia por videoconferência, enquanto perdurar a pandemia da Covid-19. Para o ministro, a realização da audiência presencial, no atual contexto, coloca em risco os direitos fundamentais à vida e à integridade física de todos os participantes do ato, inclusive do próprio preso. A decisão será submetida a referendo do Plenário em sessão virtual extraordinária marcada pelo presidente do STF, ministro Luiz Fux, para a 0h da próxima quarta-feira (30/6), com encerramento às 23h59 de quinta-feira (1º/7) A ação foi proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) contra o parágrafo 1º do artigo 3-B do Código de Processo Penal (CPP), inserido pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019). Segundo a alteração, o preso em flagrante ou por mandado de prisão provisória será encaminhado a um juiz de garantias no prazo de 24 horas para uma audiência, com a presença do Ministério Público e da Defensoria Pública ou de advogado, vedado o uso de videoconferência. A liminar suspendeu a eficácia dessa vedação.

Risco de contágio

O ministro Nunes Marques verificou que a urgência do pedido está no fato de que a execução da norma implicará, necessariamente, o aumento de contatos interpessoais entre partes, advogados, magistrados, membros do Ministério Público, servidores e outros profissionais direta ou indiretamente ligados à realização de audiências presenciais. Essa circunstância, presumivelmente, aumenta os riscos de contágio pela Covid-19, conforme amplamente divulgado pelos órgãos de gestão da saúde, inclusive a Organização Mundial da Saúde. Já a plausibilidade do pedido está em que as medidas legais que induzam o maior contato social devem estar justificadas na estrita necessidade desse contato, sob pena de serem elas irrazoáveis.

Abusividade

Para o ministro, o Poder Legislativo deve observar o devido processo legal, sendo-lhe vedada a edição de medidas legislativas abusivas, desproporcionais ou irrazoáveis. No caso dos autos, a seu ver, a contradição na edição da norma impugnada é um sintoma claro de abusividade. O ministro lembrou que o Congresso Nacional tem editado muitos atos legislativos favorecendo as medidas de isolamento social. Dessa forma, não há argumento racional para exigir que as audiências de custódia sejam presenciais em qualquer caso, quando todas as demais atividades sociais e econômicas estão sujeitas à avaliação dos agentes políticos dos vários níveis federativos. As audiências, a seu ver, não apresentam nenhuma peculiaridade que justifique a adoção de solução diametralmente oposta. Outro indício de abusividade apontado pelo ministro é o excesso. Na sua avaliação, a imposição genérica e abstrata de que todas as audiências de custódia sejam presenciais, sem nenhuma possibilidade de ajuste da norma ao contexto sanitário, é desproporcional e retira toda a competência regulatória dos governos locais, a autonomia administrativa dos tribunais e as atribuições regulamentares do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Presença

Embora a Convenção Americana sobre Direitos do Homem assegure que toda pessoa presa, detida ou retida deva ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz, a cláusula, segundo o ministro Nunes Marques, não pode ser interpretada literalmente como presença física, sobretudo durante a pandemia. Para ele, “presença” quer dizer contato em tempo real, para que o preso possa expressar diretamente ao juiz suas razões, fazer seus requerimentos e tirar as suas dúvidas.

Pandemia

O relator enfatizou, ainda, que, num contexto de normalidade, a imposição até poderia ser aceitável, pois os contatos presenciais estabelecem uma relação comunicativa mais ampla. Porém, esse não é esse o caso dos autos, uma vez que a lei foi editada no ambiente da pandemia. “A realização da audiência presencial, nesse contexto, coloca em risco os direitos fundamentais à vida e à integridade física de todos os participantes do ato, inclusive do próprio preso”, ressaltou. Segundo o ministro, o direito do preso de ser ouvido pode ser assegurado de outra maneira, sem oferecer riscos à saúde.

Processo relacionado: ADI 6841

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=468314&tip=UN)

3.º-B

Art. 3.º-C. A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019) (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

§ 1.º Recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas pelo juiz da instrução e julgamento. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

§ 2.º As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz da instrução e julgamento, que, após o recebimento da denúncia ou queixa, deverá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de 10 (dez) dias.  (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

§ 3.º Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado(Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

§ 4.º Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na secretaria do juízo das garantias. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Legislação correlata:

- Vide: Art. 1.º, inc. III, da CF/88.

- Vide: Art. 5.º, incs. XXXIII, LIV e LV, da CF/88.

- Vide: Art. 9.º e art. 10, ambos do CPP.

- Vide: Art. 6.º, parágrafo único, e art. 7.º, incs. XIII e XIV, ambos da Lei n.º 8.906/1994.

- Vide: Art. 26 da Lei n.º 8.625/1993 - Requisição de documentos pelo Ministério Público.

- Vide: Resolução n.º 181/2017 do CNMP - Dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público. Também disciplina a requisição de documentos, oitiva de testemunhas, acesso ao expediente, persecução patrimonial, publicidade dos atos e peças, direito das vítimas, prevê o acordo de não-persecução penal, dentre outros assuntos.

- Vide: Art. 32 da Lei n.º 13.869/2019 (Lei do Abuso de Autoridade).

"Art. 32.  Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa."

Nota:

- Vide: Súmula Vinculante n.º 14 do STF - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência da Polícia Judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

3.º-C

Art. 3.º-D. O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências dos arts. 4.º e 5.º deste Código ficará impedido de funcionar no processo.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)       (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Parágrafo único. Nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados, a fim de atender às disposições deste Capítulo. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

3.º-D

Art. 3.º-E. O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo respectivo tribunal.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)   (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

3.º-E

Art. 3.º-F. O juiz das garantias deverá assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, administrativa e penal.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)    (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo padronizado e respeitada a programação normativa aludida no caput deste artigo, transmitidas à imprensa, assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à prisão. (Dispositivo legal suspenso pela ADI n.º 6.299)

Legislação correlata:

- Vide: Lei n.º 13.869/2019 - Lei do Abuso de Autoridade.

3.º-F

TÍTULO II

DO INQUÉRITO POLICIAL

 

Art. 4.º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. (Redação dada pela Lei n.º 9.043, de 9.5.1995)

Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

Legislação correlata:

- Vide: Art. 12 do CPP – Dispensabilidade do inquérito.

- Vide: Lei n.º 12.830/2013 - Dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia.

- Vide:

"Art. 65 da Lei n.º 5.010/66. A polícia judiciária federal será exercida pelas autoridades policiais do Departamento Federal de Segurança Pública, observando-se, no que couber, as disposições do Código de Processo Penal (Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941), da Lei n. 4.483, de 16 de novembro de 1964 e demais normas legais aplicáveis ao processo penal."

- Vide:

"Art. 70 da Lei n.º 5.010/66. A União intervirá, obrigatoriamente, nas causas em que figurarem, como autores ou réus, os partidos políticos, excetuadas as de competência da Justiça Eleitoral, e as sociedades de economia mista ou emprêsas públicas com participação majoritária federal, bem assim os órgãos autônomos especiais e fundações criados por lei federal."

- Vide: Resolução n.º 181/2017 do CNMP - Dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público. Também disciplina a requisição de documentos, oitiva de testemunhas, acesso ao expediente, persecução patrimonial, publicidade dos atos e peças, direito das vítimas, prevê o acordo de não-persecução penal, dentre outros assuntos.

- Vide: Lei n.º 13.819/2019.

"Art. 7.º  Nos casos que envolverem investigação de suspeita de suicídio, a autoridade competente deverá comunicar à autoridade sanitária a conclusão do inquérito policial que apurou as circunstâncias da morte."

- Vide: Lei n.º 10.446/2002 - Competência da Polícia Federal para investigar determinados crimes quando houver repercussão interestadual ou internacional.

- Vide: Lei n.º 12.735/2012 - Delegacias digitais.

"Art. 4.º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado."

Notas:

- No Estatuto do Estrangeiro há uma regra (excepcional) que autoriza a ampla defesa na fase de inquérito, antes que o estrangeiro seja extraditado.

- Autorização legal para o Ministério Público investigar: Arts. 127 e 129, inc. VIII, da CF/88; art. 26, inc. IV, da Lei n.º 8.625/93 (LONMP); art. 8.º da LC  75/93; art. 4.º, parágrafo único, do CPP; Provimento n.º 12/2000 da PGJ/RS e Resolução n.º 03/2004 do E. Orgão Especial do Colégio de Procuradores do MP/RS.

- Investigação Policial Criminal: É um processo de produção de conhecimento que dá suporte às atividades operacionais de apuração de infrações penais, quer em ocorrência, quer já ocorridas, assim como à gestão de elementos operacionais, através da determinação de padrões e tendências criminais num determinado espaço geográfico-temporal. (Ledur, 2007)

Jurisprudência:

01) Investigação pelo Ministério Público – Possibilidade:

 

DENÚNCIA ANÔNIMA. INQUÉRITO. FUNÇÃO. MP.

Conforme os autos, por meio de e-mail anônimo encaminhado à Ouvidoria-Geral do Ministério Público estadual, fiscais de renda e funcionários de determinada empresa estariam em conluio para obter informações de livros fiscais, reduzindo ou suprimindo tributos estaduais e obrigações acessórias, causando lesão ao erário. Em decorrência desse fato, o MP determinou a realização de diligências preliminares para a averiguação da veracidade do conteúdo da denúncia anônima. A Turma, reiterando jurisprudência assente no STJ, entendeu que, embora tais informações não sejam idôneas, por si só, a dar ensejo à instauração de inquérito policial, muito menos de deflagração de ação penal, caso sejam corroboradas por outros elementos de prova, dão legitimidade ao início do procedimento investigatório. Assim, no caso, não há nenhum impedimento para o prosseguimento da ação penal, muito menos qualquer ilicitude a contaminá-la, uma vez que o MP agiu em estrito cumprimento de suas funções. Ademais o Parquet, conforme entendimento da Quinta Turma deste Superior Tribunal, possui prerrogativa de instaurar procedimento administrativo de investigação e conduzir diligências investigatórias (art. 129, VI, VII, VIII e IX, da CF; art. 8º, § 2º, I, II, IV, V e VII, da LC n. 75/1993 e art. 26 da Lei n. 8.625/1993). Aduziu ainda que, hodiernamente, adotou-se o entendimento de que o MP possui legitimidade para proceder, diretamente, à colheita de elementos de convicção para subsidiar a propositura de ação penal, só lhe sendo vedada a presidência do inquérito, que compete à autoridade policial. Quanto à agravante do art. 12, II, da Lei n. 8.137/1990, não se deve aplicá-la ao caso, pois o próprio artigo restringe seu âmbito de incidência ao delito previsto nos arts. 1º, 2º, 4º, 5º e 7º da referida lei, excluindo expressamente o art. 3º da sua abrangência. Como no caso a imputação é a funcionário público, haveria bis in idem na imposição da mencionada agravante a fato que constitui elemento de crime funcional previsto no art. 3º, II, da Lei n. 8.137/1990. Precedentes citados: HC 159.466-ES, DJe 17/5/2010, e RHC 21.482-RS, DJe 12/4/2010.

STJ - RHC 24.472-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 15/9/2011.

 

NULIDADE. AÇÃO PENAL. ACUSAÇÃO ANÔNIMA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA.

A Turma, por unanimidade, denegou a ordem na qual se postulava a nulidade da ação penal supostamente instaurada com base em acusação anônima e interceptações telefônicas ilegalmente autorizadas. Reafirmou-se o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça de que as informações obtidas de forma anônima são aptas a ensejar ação penal apenas quando corroboradas por outros elementos de prova colhidos em diligências preliminares realizadas durante a investigação criminal. No caso, o representante do Ministério Público, após o recebimento de e-mails anônimos relativos a suposto conluio entre fiscais de renda e funcionários de determinada sociedade empresária com o fim de fraudar o Fisco, teve a cautela necessária de efetuar diligências imprescindíveis para a averiguação da veracidade dos fatos noticiados, oficiando, inclusive, os órgãos competentes. Asseverou-se, portanto, não haver qualquer impedimento ao prosseguimento da persecução penal, tampouco a ocorrência de qualquer ilicitude a contaminá-la, já que o membro do Parquet agiu em estrito cumprimento às funções que lhe são atribuídas pela Carta Federal e pela legislação infraconstitucional pertinente (art. 129, VI, VIII e IX, da CF e incisos I, II, IV e VII e § 2º do art. 8º da LC n. 75/1993). Por fim, conclui-se inexistir qualquer ofensa ao princípio da proporcionalidade, uma vez que as interceptações telefônicas foram pleiteadas e autorizadas judicialmente depois do devido aprofundamento das investigações iniciais, quando constatados indícios suficientes da prática dos ilícitos penais por parte dos envolvidos, tendo o magistrado responsável pelo feito vislumbrado a indispensabilidade da medida.

STJ - HC 104.005-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 8/11/2011

 

PODERES. INVESTIGAÇÃO. MP. (Informativo n.º 463 do STJ – Quinta Turma)

A Turma deu provimento ao recurso por entender, entre outras questões, que o Ministério Público possui legitimidade para proceder à coleta de elementos de convicção no intuito de elucidar a materialidade do crime e os indícios da autoria. Proceder à referida colheita é um consectário lógico da própria função do Parquet de promover, com exclusividade, a ação penal. A polícia judiciária não possui o monopólio da investigação criminal. O art. 4º, parágrafo único, do CP não excluiu a competência de outras autoridades administrativas ao definir a competência da polícia judiciária. Assim, no caso, é possível ao órgão ministerial oferecer denúncias lastreadas nos procedimentos investigatórios realizados pela Procuradoria de Justiça de combate aos crimes praticados por agentes políticos municipais. Precedentes citados do STF: RE 468.523-SC, DJe 19/2/2010; do STJ: HC 12.704-DF, DJ 18/11/2002; HC 24.493-MG, DJ 17/11/2003, e HC 18.060-PR, DJ 26/8/2002.

STJ - REsp 1.020.777-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 17/2/2011.

 

 

02) Investigação de crime pela Polícia Militar - Possibilidade - Inexistência de vedação:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. FUNDADO RISCO DE REITERAÇÃO CRIMINOSA. INTERRUPÇÃO DAS ATIVIDADES DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIÊNCIA. USURPAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DA POLÍCIA CIVIL. INEXISTÊNCIA. PRISÃO DOMICILIAR NOS TERMOS DA RECOMENDAÇÃO N. 62/2020 DO CNJ. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS NÃO ATENDIDOS. CONTEXTO DE RISCO AFASTADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.

(...)

5. "A tese de usurpação da competência da Polícia Civil pela Polícia Militar, no caso, não encontra respaldo jurídico, pois, diversamente das funções de polícia judiciária - exclusivas das polícias federal e civil -, as funções de polícia investigativa podem ser realizadas pela Polícia Militar." (HC n. 476.482/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 21/2/2019, DJe 11/3/2019).

(...)

8. Ordem de habeas corpus denegada.

(SJ - HC 588.468/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/09/2020, DJe 06/10/2020) 

 

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. EXISTÊNCIA DE PRÉVIA E EFICIENTE INVESTIGAÇÃO PELO SERVIÇO DE INTELIGÊNCIA DA BRIGADA MILITAR, INCLUSIVE COM INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. CONSIDERÁVEIS INDÍCIOS DE AUTORIA. DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO ADEQUADA E IDONEAMENTE FUNDAMENTADA. (...) INEXISTÊNCIA DE COAÇÃO ILEGAL. Ordem denegada. (Habeas Corpus Nº 70045055423, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 19/10/2011) 

 

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. RECEPTAÇÃO. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE HIPÓTESE DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. NULIDADE INVESTIGAÇÃO. ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Inviável o reconhecimento da nulidade do procedimento investigatório, que contou com atuação do órgão do Ministério Público, o qual, para a formação da opinio delicti, poderá requisitar e promover a colheita de elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade dos delitos, permitindo, assim, o pleno exercício da sua função institucional a que alude o art. 129, inc. I, da Constituição Federal. 2. NULIDADE INVESTIGAÇÃO. ATUAÇÃO DA BRIGADA MILITAR. A atuação da Brigada Militar na operação que deflagrou a prisão dos pacientes não caracteriza vício passível de inquinar a ação penal e até mesmo o próprio expediente investigatório. Ausente vedação constitucional nesse sentido. Além disso, o fato de o Ministério Público ter contado com a estrutura daquele órgão para a realização das interceptações telefônicas e relatórios não macula o procedimento extrajudicial. Do mesmo modo, a notícia de crimes, com a instrução de fotos e fatos presenciados, não é atribuição exclusiva da polícia civil, mas de qualquer cidadão. (...). Ordem denegada. (Habeas Corpus Nº 70036097749, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em 09/06/2010)

03) Cumprimento de mandado de busca e apreensão – Diligência procedida pela Polícia Militar – Possibilidade:

 

SIGILO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. BUSCA. APREENSÃO.

Trata-se de habeas corpus em que, entre outras alegações, pretende-se a anulação das informações cadastrais obtidas com a alegada exacerbação de decisão judicial de quebra de sigilo telefônico, bem como das interceptações telefônicas e das buscas e apreensões operadas em desfavor do paciente, além da cassação do despacho que recebeu a denúncia com relação a ele. A Turma, por maioria, denegou a ordem pelos fundamentos, entre outros, de que, ao contrário do que asseverado pelos impetrantes, a identificação dos terminais que mantiveram contato com os telefones interceptados e o fornecimento dos respectivos dados cadastrais constituíram medidas efetivamente autorizadas pela decisão judicial, que acolheu todos os pedidos formulados pelo Parquet, entre os quais se inseria o envio, por parte das operadoras de telefonia, das contas reversas de vários números, que constituem o detalhamento das linhas a partir das quais foram efetuadas ligações para determinado telefone. Observou-se que posteriores requerimentos ministeriais contiveram o pedido expresso de fornecimento de contas reversas de vários números de telefone, providência autorizada pelos respectivos provimentos jurisdicionais que deferiram as diversas medidas solicitadas pelo órgão acusador, razão pela qual não se constata qualquer discrepância entre os ofícios encaminhados às operadoras de telefonia e as decisões judiciais emanadas. Destarte, a inclusão do paciente nas investigações em decorrência da obtenção de seus dados cadastrais pelo fato de ter conversado com um dos corréus cujo sigilo das comunicações telefônicas estava quebrado deu-se de maneira lícita, a partir de pedidos do MP para que lhe fossem fornecidas cópias de contas reversas, o que foi deferido pelos magistrados responsáveis pelo feito. Registrou-se que o art. 5º, XII, da CF/1988 assegura o sigilo das comunicações telefônicas no qual não se inserem os dados cadastrais do titular de linha de telefone celular. Quanto à busca e apreensão, assinalou-se não se ter retirado, no caso, a exclusividade da execução da medida por autoridade policial, a que inclusive se franqueia a requisição de auxílio, bem como que não houve qualquer ofensa ao art. 144 da CF/1988, já que os policiais militares não invadiram a competência reservada à polícia civil, nos termos dos §§ 4º e 5º do referido dispositivo. Precedentes citados do STF: RE 404.593-ES, DJe 23/10/2009; HC 91.481-MG, DJe 24/10/2008; do STJ: EDcl no RMS 25.375-PA, DJe 2/2/2009, e HC 57.118-RJ, DJe 19/10/2009.

STJ - HC 131.836-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/11/2010.

04) Inquérito Policial - Procedimento informativo de natureza inquisitorial - Advogado do acusado não tem direito subjetivo de participar do interrogatório policial:

​Notícias do STF - Publicada terça-feira, 12 de março de 2019

2ª Turma nega recurso de defesa ex-deputado que pretendia participar de depoimento de testemunhas em inquérito

Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou recurso apresentado pelos advogados do ex-deputado federal Luiz Sérgio da Nóbrega Oliveira (PT-RJ) contra decisão do ministro Edson Fachin, relator da Petição (PET) 7612, que negou pedido para que a defesa fosse intimada previamente para participar da oitiva de testemunhas durante o inquérito policial.

A defesa pretendia assegurar sua participação nos depoimentos mediante apresentação de razões e quesitos, sob pena de nulidade. Os advogados basearam o pedido no artigo 7º, inciso XXI, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), segundo o qual é direito do advogado assistir a seus clientes investigados durante a apuração das infrações, sob pena de nulidade absoluta do interrogatório ou depoimento e de todos elementos probatórios derivados.

O ministro Edson Fachin, ao rejeitar o pedido, lembrou que a fase de inquérito policial é um procedimento informativo de natureza inquisitorial destinado a formar o convencimento da acusação a respeito do delito. O momento, na sua avaliação, permite a mitigação das garantias do contraditório e da ampla defesa. Para o ministro, as alterações no Estatuto da Ordem representam um reforço das prerrogativas da defesa técnica no curso do inquérito policial, mas não comprometem o caráter inquisitório da fase investigativa preliminar. “A possibilidade de assistência mediante a apresentação de razões e quesitos não se confunde com o direito subjetivo de intimação prévia e tempestiva da defesa técnica acerca do calendário de inquirições a ser definido pela autoridade policial”, afirmou.

Na análise do recurso de agravo, que começou a ser julgado em outubro de 2018, o ministro Fachin citou precedentes da Corte em seu voto pelo desprovimento do recurso e manteve sua posição pelo indeferimento do pedido. Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos.

Ao apresentar voto na sessão desta terça (12), o Mendes acompanhou o relator, mas fez algumas ressalvas quanto aos fundamentos. O ministro explicou que a persecução penal é formada por quatro fases: investigação preliminar, etapa intermediária, juízo oral e juízo recursal. Cada uma tem função distinta, de modo a se estabelecer um sistema racional no processo penal, mas todas integram o processo penal de modo amplo. Para o ministro, a fase de inquérito policial insere-se claramente na lógica fundamental do processo penal, e os direitos fundamentais precisam ser resguardados em todas as fases, inclusive na investigação preliminar.

O ministro lembrou ainda que, no julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, se posicionou no sentido de que a defesa deve ter acesso, em prazo razoável, aos cadernos investigativos antes da data designada para o interrogatório do investigado e a todos os elementos de prova já formalmente incorporados, conforme previsto na Súmula Vinculante (SV) 14. Essas medidas, frisou, têm amparo nas garantias fundamentais à assistência técnica, ao contraditório e à ampla defesa, aplicáveis inclusive no âmbito administrativo. Por estes fundamentos, Mendes discordou do entendimento de que não se aplica a garantia do contraditório no âmbito do inquérito. O ministro lembrou, contudo, que o artigo 7º do Estatuto da OAB não estende a prerrogativa dos advogados de dar assistência durante o interrogatório de seus clientes aos depoimentos dos demais investigados e testemunhas, como acontece na ação penal. Nesse ponto, entendeu que pedido da defesa carece de fundamento legal e votou pelo desprovimento do agravo.

Os ministro Celso de Mello e Ricardo Lewandowski também acompanharam o relator pela negativa do recurso, mas concordaram com as ressalvas apresentadas pelo ministro Gilmar Mendes no sentido de que é possível reconhecer que há necessidade de observar contraditório no procedimento de investigação. “O investigado não é mero objeto de investigação; ele titulariza direitos oponíveis ao Estado”, frisou o ministro Celso de Mello. Para o decano, a alteração promovida no artigo 7º do Estatuto da OAB é de fundamental importância, pois estabelece como prerrogativa profissional do advogado o direito de assistir seus clientes investigados durante a apuração de infrações sob pena de nulidade absoluta. Ele lembra que a mudança na lei partiu da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

MB/AD

Processos relacionados: Pet 7612

Art. 4.º do CPP

Art. 5.° Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado:

I - de ofício;

II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

§ 1.° O requerimento a que se refere o n.º II conterá sempre que possível:

a) a narração do fato, com todas as circunstâncias;

b) a individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razões de convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer;

c) a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência.

§ 2.° Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso para o chefe de Polícia.

§ 3.° Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito.

§ 4.° O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

§ 5.° Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la.

 

Legislação correlata:

- Vide: Art. 5.º, inc. IV, da CF/1988.

"IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;"

- Vide: Lei n.º 12.830/2013 - Dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia.

- Vide: Resolução n.º 181/2017 do CNMP - Dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público. Também disciplina a requisição de documentos, oitiva de testemunhas, acesso ao expediente, persecução patrimonial, publicidade dos atos e peças, direito das vítimas, prevê o acordo de não-persecução penal, dentre outros assuntos.

- Vide: Lei n.º 8.038/1990 - Institui normas procedimentais para processos que especifica, perante o STJ e o STF.

- Vide: Arts. 24 e 25, ambos do CPP - Representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça; retratação.

- Vide: Art. 38 do CPP - Prazo para representação (decadência).

- Vide: Lei n.º 10.446/2002 - Competência da Polícia Federal para investigar determinados crimes quando houver repercussão interestadual ou internacional.

- Vide: Lei n.º 12.735/2012 - Delegacias digitais.

"Art. 4.º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado."

​- Vide: Lei n.º 14.022/2020, que alterou a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

Notas:

- Nos crimes de ação penal pública o inquérito policial será iniciado de ofício pelo Delegado de Polícia.

- A denúncia anônima, ou também chamada delação apócrifa, pode ser utilizada para dar início à investigação. A lei não exige que essa delação seja formalizada por escrito ou que haja a identificação do informante. Vide jurisprudência abaixo e também o art. 9.º do CPP.

- Sobre denúncia anônima e busca e apreensão, vide notas ao art. 240 do Código de Processo Penal.

Jurisprudência:

01) Não é possível o indiciamento de acusado que já responde ação penal pelo mesmo fato:

 

Notícias do STJ - DECISÃO - 29/12/2010 - 14h04

Indiciamento após recebimento de denúncia é ilegal e desnecessário

O indiciamento decretado pelo juiz no recebimento da denúncia é, além de desnecessário, ilegal. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reformou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para suspender o indiciamento do réu, mas mantendo intocada a ação penal.

O réu é ex-prefeito de município do interior paulista, e responde por ter assumido obrigação no último ano do mandato. A pena máxima para o crime é de quatro anos de reclusão. Ao receber a denúncia, o juiz da ação determinou o indiciamento formal do réu. O TJSP negou o pedido de habeas corpus contra esse ato.

Conforme o ministro Napoleão Nunes Maia, a jurisprudência do STJ já se consolidou no sentido de que o indiciamento formal após a denúncia é tão desnecessário quanto ilegal. Segundo a jurisprudência citada, o ato constitui constrangimento desnecessário à liberdade de locomoção do acusado.

STJ - HC 165.600 (Quinta Turma).

HABEAS CORPUS. PACIENTES QUE JÁ RESPONDEM A AÇÃO PENAL, PELA CONDUTA PREVISTA NO ART. 157, § 2o., I E II, DO CPB. INQUÉRITO POLICIAL. INDICIAMENTO APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ENCERRAMENTO DA FASE INVESTIGATÓRIA. PRECEDENTES DO STJ. ORDEM CONCEDIDA.
1. Cumpre destacar o pacífico entendimento desta Corte Superior quanto à impossibilidade de indiciamento formal dos pacientes, relativamente àqueles mesmos fatos sobre os quais já está em curso a competente ação penal. Isso, porque, com o recebimento da denúncia, encontra-se encerrada a fase investigatória e o indiciamento dos réus, neste momento, configura coação desnecessária e ilegal.
2. Parecer do MPF pela concessão da ordem.
3. Ordem concedida.
(STJ - HC 84.142/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 03/04/2008, DJe 28/04/2008)

 

CRIME CONTRA FLORA. INDICIAMENTO POSTERIOR. DENÚNCIA. (Informativo n.º 472 do STJ – Quinta Turma)

O paciente foi denunciado como incurso nas penas do art. 38 da Lei n. 9.605/1998 por ter danificado área de floresta em formação considerada de preservação permanente, fatos supostamente ocorridos em 2/10/2007. No habeas corpus, o impetrante/paciente busca que seja determinada a revogação do seu indiciamento formal após já ter sido oferecida a denúncia sobre os mesmos fatos. Registra o Min. Relator que, por ocasião da impetração do writ (no STJ) ainda não havia julgamento do HC originário impetrado no tribunal de origem; somente depois sobreveio o acórdão denegando a ordem, motivo pelo qual examina esse habeas corpus como substitutivo de recurso ordinário. Observa ser cediço que este Superior Tribunal, em reiterados julgados, vem afirmando seu posicionamento jurisprudencial de que caracteriza constrangimento ilegal o formal indiciamento do paciente que já teve contra si oferecida denúncia, como no caso, inclusive esta já foi recebida pelo juízo a quo. Diante do exposto, a Turma concedeu a ordem. Precedentes citados: RHC 21.657-SP, DJe 15/3/2010, e HC 145.935-SP, DJe 7/6/2010.

STJ - HC 179.951-SP, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 10/5/2011 (ver Informativo n. 471).

 

02) Indiciamento de indivíduo que já foi denunciado – Impossibilidade:

 

DENÚNCIA. RECEBIMENTO. INDICIAMENTO. (Informativo n.º 471 do STJ – Sexta Turma)

A jurisprudência do STJ diz que o indiciamento formal dos acusados após o recebimento da denúncia os submete a ilegal e desnecessário constrangimento, visto não mais se justificar tal procedimento próprio da fase inquisitorial quando a ação penal já se encontra em curso.

Precedentes citados: HC 174.576-SP, DJe 18/10/2010, e HC 92.117-SP, DJe 18/12/2009.

STJ - HC 182.455-SP, Rel. Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ-CE), julgado em 5/5/2011.

03) Denúncia anônima – Admissibilidade – Início de Investigações:

 

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 1  (Informativo n.º 580 do STF – Primeira Turma)

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus no qual se pleiteava o trancamento de investigação ou qualquer persecução criminal iniciada com base exclusivamente em denúncias anônimas. Tratava-se, na espécie, de procedimento investigatório — que culminara com a quebra de sigilo telefônico dos pacientes — instaurado com base em delação apócrifa para apurar os crimes de associação para o tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 14) e de corrupção passiva majorada (CP, art. 317, § 1º), supostamente praticados por oficiais de justiça que estariam repassando informações sobre os locais de cumprimento de mandados de busca e apreensão e de prisão. Destacou-se, de início, entendimento da Corte no sentido de que a denúncia anônima, por si só, não serviria para fundamentar a instauração de inquérito policial, mas que, a partir dela, poderia a polícia realizar diligências preliminares para apurar a veracidade das informações obtidas anonimamente e, então, instaurar o procedimento investigatório propriamente dito. HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010.  (HC-95244)

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 2

Salientou-se que, no caso, a partir de informações obtidas por colaboradores, e, posteriormente, somadas às mencionadas ligações anônimas, policiais — ainda sem instaurar o pertinente inquérito policial — diligenciaram no sentido de apurar as identidades dos investigados e a veracidade das respectivas ocupações funcionais, tendo eles confirmado tratar-se de oficiais de justiça, cujos nomes eram os mesmos fornecidos pelos “denunciantes”. Asseverou-se que, somente após essas explicitações, o delegado representara ao Judiciário local pela necessidade de quebra do sigilo telefônico dos investigados, considerando-se, no ponto, que os procedimentos tomados pela autoridade policial estariam em perfeita consonância com a jurisprudência do STF. Registrou-se, ademais, que o juízo monocrático, em informações prestadas, comunicara o devido recebimento da denúncia, porquanto demonstrada a existência da materialidade dos crimes imputados e indícios suficientes de autoria, não sendo o caso de rejeição sumária. HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010.  (HC-95244)

Denúncia Anônima: Investigação Criminal e Quebra de Sigilo Telefônico - 3

Vencido o Min. Marco Aurélio, que deferia o writ para trancar a ação penal em curso contra os pacientes. Afirmava estar-se diante de um ato de constrição maior, a afastar a privacidade quanto às comunicações telefônicas, que é inviolável (CF, art. 5º, XII), não se podendo ter a persecução criminal simplesmente considerada denúncia anônima. Frisava que, no caso, simplesmente se buscara saber se aqueles indicados como a beneficiarem, quanto a cumprimento de mandados, delinqüentes seriam, ou não, oficiais de justiça.

Aduzia ser muito pouco para se chegar a este ato extremo, saindo-se da estaca zero para o ponto de maior constrição, que é o da interceptação telefônica, na medida em que não se investigara coisa alguma. Considerava que, se assim o fosse, bastaria um ofício ao tribunal local para que este informasse sobre a identidade dos oficiais de justiça. Precedente citado: HC 84827/TO (DJE de 23.11.2007).

STF - HC 95244/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 23.3.2010.  (HC-95244)

 

04) Denúncia anônima - Desnecessidade de registro pela autoridade policial - Prescindível o conhecimento da fonte ou o motivo que ensejou a delação:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS DENUNCIADO COM TRÊS SUPOSTOS ASSOCIADOS POR CORRUPÇÃO PASSIVA. (...) MEIOS DE PROVA QUE DESPONTAM COMO FONTES AUTÔNOMAS E INDEPENDENTES, INVIABILIZADO QUALQUER RECONHECIMENTO DE ALEGADO VÍCIO NOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS ORIGINAIS. DEFESA QUE SE DEMITE DE INDICAR QUAIS SERIAM AS PROVAS SUPOSTAMENTE CONTAMINADAS PELAS NULIDADES QUE AFIRMA EXISTIREM E QUE INTERESSEM À AÇÃO PENAL EM CURSO. FATOS QUE NÃO CONDIZEM COM ESTE PROCESSO. ALEGAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DEFLAGRADA POR DENÚNCIA ANÔNIMA. IRRELEVÂNCIA DA ARGUIÇÃO. FUNDADA SUSPEITA DE POSSE DE ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DE CORPO DE DELITO. CRIME PERMANENTE. BUSCA E APREENSÃO LEGITIMADA. DESNECESSIDADE DE FORMALIZAÇÃO ESCRITA DE DENÚNCIA ORIUNDA DE FONTE HUMANA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 9.º DO CPP A ATOS QUE ANTECEDEM A INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO. (...)

52. Mesmo que se admitisse que a origem da informação foi anônima, fato esse que perde contorno de relevo diante da averiguação prévia dos dados atinentes à chegada do avião, é desimportante que a fonte de informação tenha origem desconhecida, quando as circunstâncias apontam para a ocorrência atual de crime. Nesse sentido, remansosa jurisprudência: (HC 345.424/SC, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 18/08/2016, DJe 16/09/2016; HC 345.547/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016; STJ, Sexta Turma, HC 67.555/GO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 23/2/2016); HC n. 273.141/SC, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 5/11/2013; STJ, AGREsp 1423159, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 17/11/2015.

53. Ainda que se pudesse dar respaldo à afirmação da defesa de FERNANDO PIMENTEL, no sentido de que já se tinha conhecimento da prática de crime naquele momento, aí se estaria diante do denominado flagrante esperado, igualmente válido e apto a respaldar a busca e as apreensões.

54. Não existe, à luz do que se examinou, vício processual ocasionado por investigação desencadeada por denúncia anônima. Fundada suspeita de posse de elementos característicos de corpo de delito

55. Diante da existência de concreto e justificado receio de que as pessoas estivessem na posse de papéis que constituíam corpo de delito, não havia necessidade de mandado judicial para legitimar a busca e apreensão, o que a faz válida, independentemente de haver ou não sido lavrado auto de prisão em flagrante. Nesse sentido, o STF, no RHC 117.767/DF, Rel. Ministro Teori Zavascki, j. em 11/10/2016. 56.Já não fosse suficiente para autorizar a busca pessoal e veicular a situação de flagrância, também era inconteste a existência de fundada suspeita de que os passageiros do avião estivessem na posse de papéis (em sentido amplo, hoje incluindo registros em agendas eletrônicas, telefones com conteúdo diverso, notas fiscais, encartes de propaganda e tabelas com informações variadas) que caracterizam corpo de delito.

57. É inexorável a conclusão de que a busca e apreensão realizada nos passageiros e na aeronave foi plenamente legítima, tanto pela situação de flagrância, quanto pela mais do que plausível suspeita da posse de elementos característicos de corpo de delito e de dinheiro obtido por meio criminoso. E tanto é assim que a apreensão motivou a deflagração de Inquérito, cuja Portaria de instauração elenca como razões o fato de os viajantes não apresentaram justificativas plausíveis para o transporte do dinheiro em mãos, em vez de utilizarem o sistema financeiro, e a existência de informação de que "um dos envolvidos possui condenação por tráfico de drogas e outro foi citado por fontes abertas (jornais, revistas e sites) como participante de casos de desvio de recursos públicos".

58. Nenhuma ilicitude a ser declarada, portanto. Desnecessidade de formalização escrita de denúncia oriunda de fonte humana. Procedimento não exigido por lei ou ato normativo. Alegação de FERNANDO DAMATA PIMENTEL

59. Sustenta-se que há nulidade advinda da não formalização de denúncia alegadamente anônima. Não está claro nos autos o modo como a informação sobre o pouso do avião em que o dinheiro era transportado chegou à Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal. Consta apenas a notícia de que ela foi repassada tanto pelo Ministério Público Federal quanto pela Superintendência da Polícia Federal em Belo Horizonte.

60. É para a instauração do Inquérito Policial que se exigem averiguações preliminares e indícios mínimos da ocorrência do delito. E isso, tal como anteriormente exposto, adveio das circunstâncias da apreensão, da existência de dinheiro cuja origem os passageiros, indagados, não souberam explicar de modo satisfatório, dos antecedentes criminais dos ocupantes do avião e daquilo que a imprensa havia publicado sobre um deles. Bem satisfazem a necessidade de instauração da investigação as notícias veiculadas na imprensa sobre Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, facilmente localizáveis em qualquer sítio de busca na internet, especialmente a datada de 17/4/2012, na Revista Veja. Conforme se vê, havia informação jornalística de que um dos passageiros abordados enriquecia vertiginosamente, manipulava licitações e tinha envolvimento com espionagem. Foram justamente essas notícias que levantaram suspeitas sobre Benedito, conforme constou da Portaria de instauração do Inquérito: "Considerando que um dos envolvidos possui condenação por tráfico de drogas e outro foi citado por fontes abertas (jornais, revistas e sites) como participante de casos de desvio de recursos públicos;".

61. Em relação à afirmada denúncia anônima que noticiava flagrante, diferentemente do que ocorre para a instauração do Inquérito ou para a adoção de providências cautelares de outra ordem, a formalização dos informes advindos de fonte humana é desnecessária e não se coaduna com a sistemática vigente, de informações recebidas pelo "disque-denúncia" ou por outros meios de coleta de elementos informais. O propósito que imbuiu eventual delator não é fator relevante e não há ato normativo que exija que informações que desencadeiem averiguações prévias sejam formalizadas. Isso porque a maneira como a informação chega à Autoridade Policial é desinfluente. Tomando ela conhecimento da existência de um crime - quanto mais em situação de flagrância -, é seu dever proceder ao exame da veracidade da notícia, inclusive para evitar a perda da oportunidade. Rememorando-se que, aqui, nem sequer se pode afirmar que tenha havido a denúncia anônima preconizada pela defesa de FERNANDO PIMENTEL. Portanto, nulidade não há em decorrência da não formalização de uma suposta delação anônima, para fins de início de coleta de informações preliminares. Pontuo a inaplicabilidade do artigo 9.º do CPP ("Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.") à situação em trato, como defendeu Fernando Damata Pimentel, porque tal dispositivo versa sobre as formalidades do Inquérito Policial, não sobre procedimentos que são a ele preliminares e que podem ou não justificar a instauração da persecução. (...)

(STJ - APn 843/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 06/12/2017, DJe 01/02/2018)

05) Denúncia baseada em delação anônima e em elementos de informação colhidos pelo Ministério Público autorizam condenação por fraude à licitação:

 

DELAÇÃO ANÔNIMA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO. (Informativo n.º 478 do STJ – Quinta Turma)

No habeas corpus, sustenta a impetração a nulidade da ação penal, alegando que tanto a denúncia quanto a condenação basearam-se exclusivamente em dados colhidos em correspondência apócrifa, ou seja, denúncia anônima mediante e-mail e, por isso, ela deveria ser considerada prova ilícita. No entanto, segundo o Min. Relator, ao contrário do que afirma a impetração, os autos demonstram que o Ministério Público Federal, legitimado para averiguar a regularidade dos contratos administrativos denunciados, somente formou sua opinio delicti depois de verificar a existência de elementos mínimos e colher, de forma idônea, todos os dados informativos, para então determinar a instauração da investigação criminal. Por outro lado, a condenação da paciente por fraude à licitação (art. 90 da Lei n. 8.666/1993) fundou-se em acervo probatório composto por depoimento de testemunhas e dos réus, informações prestadas pela Superintendência do Incra, cópia do procedimento administrativo de licitação sob suspeita e outros documentos; todos comprovaram que somente uma empresa foi contactada para fornecer orçamento prévio, servindo de base para a elaboração de edital licitatório, e, depois, a mesma empresa foi vencedora, apesar de não poder participar do certame por estar em dívida com a Receita Federal. Dessa forma, concluiu o Min. Relator que, pelos documentos constantes dos autos, não há, de plano, comprovação que possa evidenciar ser a exordial acusatória ou a sentença condenatória embasadas apenas em denúncia anônima. Assim, até por ser inviável ampla dilação probatória em HC, não há como acatar a irresignação da impetração. Diante do exposto, a Turma denegou a ordem em consonância com o parecer da Subprocuradoria-Geral da República. Precedentes citados: HC 44.649-SP, DJ 8/10/2007, e HC 93.421-RO, DJe 9/3/2009.

STJ - HC 191.797-PA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 21/6/2011.

 

 

06) Dano moral – Imagem – Denúncia de empregador (por prepostos) de que funcionária furtou produtos – Imprudência dos “investigadores” que, por culpa, imputaram à funcionária o crime e comunicaram o fato à polícia  – Necessidade de dolo ou culpa na conduta para que haja indenização:

 

INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. DENÚNCIA. POLÍCIA.

Trata-se de indenização por dano moral causado por culpa in eligendo e in vigilando do empregador (recorrente) em relação a atos praticados por seus empregados os quais imputaram à autora, ora recorrida, suposta prática de ato criminoso (furto). A conduta imprudente praticada pelos prepostos de loja de confecção deu-se após investigação promovida pelos próprios empregados, o que resultou em acusação de furto com ameaças de divulgação de fitas, ignorando a negativa da recorrida e, sem as devidas cautelas, culminou na investigação da Polícia Civil. Nessa ocasião, assinala o acórdão recorrido que a autoridade policial aconselhou a recorrida a tomar providências, daí o ajuizamento de ação cautelar para impedir a divulgação de sua imagem, seguido do pedido indenizatório. Também assinala o TJ que o dano moral só se configurou porque os prepostos, mesmo sendo alertados de que a recorrida não estivera na loja e, por esse motivo, não poderia ter furtado as roupas, e de que ela se colocou à disposição deles para resolver o caso, ainda assim, sem antes buscar a verdade dos fatos, deixaram-se levar por indícios infundados, levando-a a sofrer investigações na delegacia pela suposta prática de furto, obrigando-a a defender-se de imputações falsas. No REsp, explica o Min. Relator que a questão está em saber se, à luz do acontecido e reconhecido pelo TJ, houve responsabilidade do recorrente a ensejar indenização por danos morais. Observou que, em princípio, não responde por danos morais aquele que reporta à autoridade policial atitude suspeita ou prática criminosa, porquanto esse ato constitui exercício regular de um direito do cidadão, ainda que fique provada a inocência do acusado. Isso porque, só pode configurar-se o ilícito civil indenizável quando o denunciante age com dolo ou culpa e seu ato foi relevante para a produção do resultado lesivo. Também, segundo ressaltou o Min. Relator, não se desejou afirmar que os prepostos não poderiam zelar pelo patrimônio do empregador. No caso, reconhece que, seja por imprudência ou por excesso em seu mister, conforme apurado pelo tribunal a quo, existiu culpa, sem dúvida, quanto à informação absolutamente equivocada à polícia sobre a autoria do ilícito, inclusive houve provas de telefonemas à autora e ameaças de divulgação de imagens supostamente gravadas. Diante desses fundamentos, entre outros, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 537.111-MT, DJe 11/5/2009; REsp 721.440-SC, DJ 20/8/2007; REsp 470.365-RS, DJ 1º/12/2003; REsp 254.414-RJ, DJ 27/9/2004; AgRg no Ag 945.943-MS, DJ 14/12/2007; REsp 468.377-MG, DJ 23/6/2003, e REsp 592.811-PB, DJ 26/4/2004.

STJ -  REsp 1.040.096-PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 8/2/2011.

07) Crime contra a ordem tributária - Inquérito antes do encerramento do procedimento administrativo - Possibilidade:

 

Crimes contra a Ordem Tributária e Instauração de Inquérito - 1

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute a possibilidade, ou não, de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do procedimento administrativo-fiscal. Na espécie, empresa da qual os pacientes eram sócios sofrera fiscalização promovida pela Fazenda Estadual, que remetera ao Ministério Público representação fiscal, solicitando a quebra do sigilo fiscal daquela, para exame de suposta prática de crimes contra a ordem tributária. Os fiscais reputavam a diligência imprescindível para a conclusão do procedimento fiscal instaurado, haja vista que os pacientes não apresentaram as informações requeridas sobre determinada conta corrente da empresa. O parquet, então, requerera a quebra do sigilo bancário da empresa, o que fora deferido pelo juízo de origem. Contra esta decisão, a defesa impetrara habeas corpus perante o tribunal local que o acolhera, em parte, por entender manifestamente ilegal o ato, dado que prolatado sem forma ou figura de juízo, ausentes o inquérito ou o processo judicial. Em conseqüência disso, o órgão ministerial requisitara a instauração de inquérito policial, no bojo do qual fora formalizado e deferido judicialmente o pleito de afastamento do sigilo bancário da empresa. A impetração reitera as alegações de que: a) seria ilegal a instauração de inquérito policial antes da conclusão do procedimento administrativo-fiscal; b) posterior encerramento do procedimento administrativo-fiscal não convalidaria anterior iniciativa de instauração de inquérito policial; e c) seria ilegal a prova obtida por meio da quebra de sigilo bancário decretada judicialmente. HC 95443/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 25.8.2009.  (HC-95443)

Crimes contra a Ordem Tributária e Instauração de Inquérito - 2

A Min. Ellen Gracie, relatora, indeferiu o writ. Observou que, em que pese orientação firmada pelo STF no HC 81611/DF (DJU de 13.5.2005) — no sentido da necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária —, o caso guardaria peculiaridades a afastar a aplicação do precedente. Asseverou que, no caso, a instauração do inquérito policial tivera como escopo possibilitar à Fazenda estadual uma completa fiscalização na empresa dos pacientes, que apresentava sérios indícios de irregularidade. Aduziu que, durante a fiscalização, foram identificados, pelo Fisco estadual, depósitos realizados na conta da empresa dos pacientes, sem o devido registro nos livros fiscais e contábeis, revelando, assim, a possível venda de mercadorias correspondentes aos depósitos mencionados sem a emissão dos respectivos documentos fiscais. Enfatizou que tais depósitos configurariam fortes indícios de ausência de recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias - ICMS nas operações realizadas. Salientou que, diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornara-se necessária a instauração do procedimento inquisitorial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, conseqüentemente, para a apuração de eventual débito tributário. Concluiu que considerar ilegal, na presente hipótese, a instauração de inquérito policial, que seria indispensável para possibilitar uma completa fiscalização da empresa, equivaleria a assegurar a impunidade da sonegação fiscal, na medida em que não haveria como concluir a fiscalização sem o afastamento do sigilo bancário. Dessa forma, julgou possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização. Após, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso. HC 95443/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 25.8.2009.  (HC-95443)

Crimes contra a Ordem Tributária e Instauração de Inquérito - 3 (Informativo n.º 573 do STF)

A Turma concluiu julgamento de habeas corpus em que se discutia a possibilidade, ou não, de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes de encerrado o procedimento administrativo-fiscal — v. Informativo 557. Indeferiu-se o writ. Observou-se que, em que pese orientação firmada pelo STF no HC 81611/DF (DJU de 13.5.2005) — no sentido da necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária—, o caso guardaria peculiaridades a afastar a aplicação do precedente. Asseverou-se que, na espécie, a instauração do inquérito policial tivera como escopo possibilitar à Fazenda estadual uma completa fiscalização na empresa dos pacientes, que apresentava sérios indícios de irregularidade. Aduziu-se que, durante a fiscalização, foram identificados, pelo Fisco estadual, depósitos realizados na conta da empresa dos pacientes, sem o devido registro nos livros fiscais e contábeis, revelando, assim, a possível venda de mercadorias correspondentes aos depósitos mencionados sem a emissão dos respectivos documentos fiscais. Enfatizou-se que tais depósitos configurariam fortes indícios de ausência de recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias - ICMS nas operações realizadas. Salientou-se que, diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornara-se necessária a instauração do procedimento inquisitorial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, conseqüentemente, para a apuração de eventual débito tributário. Concluiu-se que considerar ilegal, na presente hipótese, a instauração de inquérito policial, que seria indispensável para possibilitar uma completa fiscalização da empresa, equivaleria a assegurar a impunidade da sonegação fiscal, na medida em que não haveria como concluir a fiscalização sem o afastamento do sigilo bancário. Dessa forma, julgou-se possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização. O Min. Cezar Peluso acrescentou que, se a abertura do inquérito não estaria fundada apenas na existência de indícios de delitos tributários materiais, não haveria que se falar em falta de justa causa para a sua instauração. HC 95443/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 2.2.2010. (HC-95443)

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL ANTES DO ENCERRAMENTO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO-FISCAL. POSSIBILIDADE QUANDO SE MOSTRAR IMPRESCINDÍVEL PARA VIABILIZAR A FISCALIZAÇÃO. ORDEM DENEGADA. 1. A questão posta no presente writ diz respeito à possibilidade de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do procedimento administrativo-fiscal. 2. O tema relacionado à necessidade do prévio encerramento do procedimento administrativo-fiscal para configuração dos crimes contra a ordem tributária, previstos no art. 1°, da Lei n° 8.137/90, já foi objeto de aceso debate perante esta Corte, sendo o precedente mais conhecido o HC n° 81.611 (Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, julg. 10.12.2003). 3. A orientação que prevaleceu foi exatamente a de considerar a necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária (Lei n° 8.137/90, art. 1°). No mesmo sentido do precedente referido: HC 85.051/MG, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01.07.2005, HC 90.957/RJ, rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.10.2007 e HC 84.423/RJ, rel. Min. Carlos Britto, DJ 24.09.2004. 4. Entretanto, o caso concreto apresenta uma particularidade que afasta a aplicação dos precedentes mencionados. 5. Diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornou-se necessária a instauração de inquérito policial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, conseqüentemente, para a apuração de eventual débito tributário. 6. Deste modo, entendo possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo-fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização. 7. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.
(STF - HC 95443, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 02/02/2010, DJe-030 DIVULG 18-02-2010 PUBLIC 19-02-2010 EMENT VOL-02390-02 PP-00238 RTJ VOL-00213-01 PP-00537 LEXSTF v. 32, n. 374, 2010, p. 313-334)

 

 

08) Indiciamento - Ato privativo do delegado de polícia - Magistrado não pode determinar o indiciamento:

Notícias do STF – Publicada em: 02/05/2019 17h35

Ministro cassa decisão que determinou indiciamento de acusado após recebimento da denúncia

Para o ministro Edson Fachin, a decisão de primeiro grau, mantida pelo TJ-SP, contrasta com determinação contida na Lei 12.830/2013 e também com a consolidada jurisprudência do STF

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou decisão em que o Juízo da 1ª Vara da Comarca de Capivari (SP) havia determinado à autoridade policial o indiciamento de um réu após o recebimento de denúncia oferecida pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP). De acordo com o ministro, o indiciamento é ato privativo do delegado de Polícia e, como regra, não cabe ao Poder Judiciário adentrar nessa questão.

A decisão foi tomada nos autos do Habeas Corpus (HC) 169731, em que a defesa de V.L.P. questiona decisão monocrática do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que rejeitou o trâmite de habeas corpus contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). De acordo com o TJ-SP, ao manter a decisão de primeira instância, a diligência do juízo era correta e legítima, tendo em vista que o indiciamento formal é imprescindível, sendo indiferente a circunstância de já estar em curso a ação penal. O ministro Fachin não conheceu do HC, por se tratar de decisão monocrática de ministro do STJ, mas concedeu a ordem de ofício após verificar a presença de constrangimento ilegal ao réu.

No caso dos autos, V.L.P foi denunciado por integrar organização criminosa (artigo 2ª da Lei 12.850/2013), por receptação qualificada (artigo 180, parágrafo 1º, do Código Penal) e por comercializar substância nociva à saúde humana e ao meio ambiente, em desacordo com as exigências legais (artigo 56, caput, da Lei 9.605/1998). A organização criminosa, segundo o MP-SP, mantinha uma empresa de fachada para receptar petróleo subtraído criminosamente da Petrobras, transportando-o até a refinaria localizada em Mombuca (SP). Os acusados manuseavam o produto e o revendiam a terceiros. Três acusados foram presos em flagrante e V.L.P. foi considerado foragido, o que motivou a suspensão do processo penal em razão da sua não localização. Depois de ele ser localizado e preso, foi revogada a suspensão do processo, e o juízo requisitou à autoridade policial seu indiciamento formal. V.L.P. está preso no Centro de Detenção Provisória de Piracicaba (SP). No HC ao Supremo, sua defesa argumentou que o indiciamento era extemporâneo, uma vez que é pertinente à fase policial e não é cabível após o recebimento da denúncia, o que torna a medida “abusiva e impertinente” quando imposta sem justa causa, em momento posterior ao recebimento da denúncia.

Em sua decisão, o ministro Fachin salientou que a orientação tomada pelo juiz de primeiro grau e mantida pelo TJ-SP contrasta com determinação legal contida na Lei 12.830/2013 e com a jurisprudência consolidada do STF, devendo ser revista. Segundo afirmou, a lei em questão é expressa ao afirmar (em seu artigo 2º, parágrafo 6º) que o indiciamento é ato privativo de delegado de polícia, não devendo o juiz se imiscuir nesta valoração. Fachin citou precedente da Segunda Turma do STF (HC 115015), de relatoria do ministro Teori Zavascki (falecido), em que o colegiado decidiu ser incompatível com o sistema acusatório e a separação orgânica de poderes a determinação de magistrado dirigida a delegado de polícia a fim de que proceda ao indiciamento de determinado acusado.

Por esse motivo, segundo observou o ministro, o exame de conveniência e oportunidade de que dispõe o delegado de polícia, ressalvada hipótese de ilegalidade ou abuso de poder patente, não está sujeito à revisão judicial. “No caso presente, ao que tudo indica, não houve excepcionalidade que justificasse a extraordinária atuação do Juízo singular, pois, em verdade, o delegado de polícia, após conduzir investigação complexa, devidamente instruída por interceptações telefônicas e pedidos de quebra de sigilo, decidiu indiciar outros três acusados, mas não indiciou o ora paciente. Tal opção afigura-se legítima, dentro da margem de discricionariedade regrada de que dispõe a autoridade policial, na fase embrionária em que se encontrava o feito”, explicou.

Processo relacionado: HC 169.731

(Fonte:http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=410001)

DIREITO PROCESSUAL PENAL. INDICIAMENTO COMO ATRIBUIÇÃO EXCLUSIVA DA AUTORIDADE POLICIAL.

O magistrado não pode requisitar o indiciamento em investigação criminal. Isso porque o indiciamento constitui atribuição exclusiva da autoridade policial. De fato, é por meio do indiciamento que a autoridade policial aponta determinada pessoa como a autora do ilícito em apuração. Por se tratar de medida ínsita à fase investigatória, por meio da qual o delegado de polícia externa o seu convencimento sobre a autoria dos fatos apurados, não se admite que seja requerida ou determinada pelo magistrado, já que tal procedimento obrigaria o presidente do inquérito à conclusão de que determinado indivíduo seria o responsável pela prática criminosa, em nítida violação ao sistema acusatório adotado pelo ordenamento jurídico pátrio. Nesse mesmo sentido, é a inteligência do art. 2.º, § 6.º, da Lei 12.830/2013, o qual consigna que o indiciamento é ato inserto na esfera de atribuições da polícia judiciária. Precedente citado do STF: HC 115.015-SP, Segunda Turma, DJe 11/9/2013.

STJ - RHC 47.984-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/11/2014. 

09) Investigação deflagrada por notícia de fato delituoso veiculada na imprensa - Cabimento:

DIREITO PROCESSUAL PENAL - RHC 98.056-CE, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 04/06/2019, DJe 21/06/2019  (Informativo n.º 652 do STJ – Sexta Turma)

Investigação deflagrada com base em notitia criminis de cognição imediata. Notícia veiculada em imprensa. Reportagem jornalística. Possibilidade.

É possível a deflagração de investigação criminal com base em matéria jornalística.

Inicialmente, para a configuração de justa causa, seguindo o escólio da doutrina, "torna-se necessário [...] a demonstração, prima facie, de que a acusação não (seja) temerária ou leviana, por isso que lastreada em um mínimo de prova. Este suporte probatório mínimo se relaciona com os indícios da autoria, existência material de uma conduta típica e alguma prova de sua antijuridicidade e culpabilidade. Somente diante de todo este conjunto probatório é que, a nosso ver, se coloca o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública". Nesse sentido, consigne-se que é possível que a investigação criminal seja perscrutada pautando-se pelas atividades diuturnas da autoridade policial, verbi gratia, o conhecimento da prática de determinada conduta delitiva a partir de veículo midiático, no caso, a imprensa, como de fato ocorreu. É o que se convencionou a denominar, em doutrina, de notitia criminis de cognição imediata (ou espontânea), terminologia obtida a partir da exegese do art. 5.º, inciso I, do CPP, do qual se extrai que "nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado de ofício". Ademais, e por fim, há previsão, de jaez equivalente, no art. 3.º da Resolução n. 181, de 2017 do Conselho Nacional do Ministério Público, in verbis: o procedimento investigatório criminal poderá ser instaurado de ofício, por membro do Ministério Público, no âmbito de suas atribuições criminais, ao tomar conhecimento de infração penal de iniciativa pública, por qualquer meio, ainda que informal, ou mediante provocação (redação dada pela Resolução n. 183, de 24 de janeiro de 2018).

Art. 5.º do CPP
Art. 6.º do CPP

Art. 6.° Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei n.º 8.862, de 28.3.1994)

II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei n.º 8.862, de 28.3.1994)

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

IV - ouvir o ofendido;

V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;

VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;

VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;

VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;

IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. (Incluído pela Lei n.º 13.257, de 2016)

 

Legislação correlata:

- Vide: Art. 13 e seguintes do Código de Processo Penal - Outras incumbências da autoridade policial.

- Vide: Arts. 185 e 186, ambos do Código de Processo Penal - Interrogatório judicial e direito ao silêncio.

- Vide: Art. 158-A e seguintes do Código de Processo Penal - Cadeia de custódia de vestígios, coleta e procedimentos de perícia.

- Vide: Art. 5.º, inc. LXIII, da CF/1988.

"LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

- Vide: Art. 185 do Código de Processo Penal - Interrogatório judicial.

- Vide: Arts. 287 e 310, ambos do Código de Processo Penal - Audiência de custódia.

- Vide: Sobre manifestações do réu delator, vide Lei n.º 12.850/2013 (Organização Criminosa)

"Art. 4.º (...) § 10-A Em todas as fases do processo, deve-se garantir ao réu delatado a oportunidade de manifestar-se após o decurso do prazo concedido ao réu que o delatou.    (Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)"

- Vide: Art. 240 e seguintes do Código de Processo Penal sobre busca e apreensão.

- Vide: Lei n.º 9.296/96 - Lei da interceptação telefônica.

- Vide: Lei n.º 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet - Em seu art. 7.º, assegura aos usuários os direitos para o uso da internet no Brasil, entre eles, o da inviolabilidade da intimidade e da vida privada, do sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, bem como de suas comunicações privadas armazenadas.

- Vide: Lei n.º 12.037/2009 - Identificação criminal do civilmente identificado.

- Vide: Lei n.º 13.819/2019.

"Art. 7.º  Nos casos que envolverem investigação de suspeita de suicídio, a autoridade competente deverá comunicar à autoridade sanitária a conclusão do inquérito policial que apurou as circunstâncias da morte."

- Vide: Lei n.º 12.830/2013 - Dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia.

- Vide: Lei n.º 12.735/2012 - Delegacias digitais.

"Art. 4.º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado."

​- Vide: Lei n.º 14.022/2020, que alterou a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

- Vide: Lei n. 14.541/2023 - Dispõe sobre a criação e o funcionamento ininterrupto de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher.

- Vide: Lei n. 14.786/2023 - Cria o protocolo "Não é Não", para prevenção ao constrangimento e à violência contra a mulher e para proteção à Vítima; institui o selo "Não é Não - Mulheres Seguras"; e altera a Lei n. 14.597/2023 (Lei Geral do Esporte). Disciplina isolamento do local e outras medidas em caso de violência contra a mulher.

Notas:

- Sobre coleta de dados em telefone celular recolhido pela autoridade policial com o acusado, vide notas à Lei n.º 9.296/96.

- A oitiva do indiciado pode ocorrer sem a presença de seu advogado. Vide aresto do STF colacionado abaixo.

- Sobre investigação iniciada por denúncia anônima (delação apócrifa), vide notas ao art. 5.º do Código de Processo Penal.

 

Jurisprudência:

 

01) Identificação criminal – Base de dados – Exclusão – Impossibilidade:

 

REGISTRO. INSTITUTO. IDENTIFICAÇÃO CRIMINAL. (Informativo n.º 450 do STJ – Sexta Turma)

A Turma negou provimento ao recurso em mandado de segurança em que se pretendia a exclusão de registros constantes do banco de dados de instituto de identificação criminal.

Segundo o Min. Relator, a existência dos registros consubstancia a própria história do condenado e da sociedade, de forma que seu cancelamento pelo Poder Judiciário prejudicaria a organização e as atividades investigatórias da polícia.

Ressaltou, embasado em lições doutrinárias, que a legislação garante o direito ao sigilo dessas informações, ressalvadas apenas as hipóteses de requisição judicial, sem impor seu cancelamento.

Precedente citado: RMS 28.838-SP, DJe 4/11/2009.

STJ - RMS 19.153-SP, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 7/10/2010 (ver Informativo n. 409).

02) Identificação de suspeitos - Compartilhamento de dados biométricos de investigados entre TSE, órgãos de trânsito, de inteligência e Polícia Federal - Possibilidade:

Notícias do STF - 09/02/2023 20h50

TSE pode fornecer à PF dados biométricos de investigados por atos criminosos de 8/1

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, o pedido da PF é pertinente para as investigações.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a disponibilizar à Polícia Federal os serviços de conferência biométrica do tribunal. A decisão foi tomada no Inquérito (INQ) 4923, que investiga a responsabilidade de autoridades e outras pessoas pelos delitos ocorridos na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro. No requerimento, a PF citou a necessidade de identificar pessoas que tenham concorrido para o cometimento dos delitos, “inclusive incitando-os ou estimulando-os em redes sociais”. Na decisão, o ministro considerou a medida pertinente para a elucidação das investigações. O ministro também determinou que a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatram) e o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) disponibilizem à PF os serviços de conferência das bases com os dados biográficos e fotografias dos indivíduos cadastrados. Por haver dados pessoais envolvidos, o trânsito das informações deve observar as medidas de segurança previstas na Lei Geral de Proteção de Dados.

Leia a íntegra da decisão: INQUÉRITO 4.923 DISTRITO FEDERAL

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=502114&tip=UN)

03) Inquérito Policial - Procedimento informativo de natureza inquisitorial - Advogado do acusado não tem direito subjetivo de participar do interrogatório policial:

​Notícias do STF - Publicada terça-feira, 12 de março de 2019

2ª Turma nega recurso de defesa ex-deputado que pretendia participar de depoimento de testemunhas em inquérito

Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou recurso apresentado pelos advogados do ex-deputado federal Luiz Sérgio da Nóbrega Oliveira (PT-RJ) contra decisão do ministro Edson Fachin, relator da Petição (PET) 7612, que negou pedido para que a defesa fosse intimada previamente para participar da oitiva de testemunhas durante o inquérito policial.

A defesa pretendia assegurar sua participação nos depoimentos mediante apresentação de razões e quesitos, sob pena de nulidade. Os advogados basearam o pedido no artigo 7º, inciso XXI, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), segundo o qual é direito do advogado assistir a seus clientes investigados durante a apuração das infrações, sob pena de nulidade absoluta do interrogatório ou depoimento e de todos elementos probatórios derivados.

O ministro Edson Fachin, ao rejeitar o pedido, lembrou que a fase de inquérito policial é um procedimento informativo de natureza inquisitorial destinado a formar o convencimento da acusação a respeito do delito. O momento, na sua avaliação, permite a mitigação das garantias do contraditório e da ampla defesa. Para o ministro, as alterações no Estatuto da Ordem representam um reforço das prerrogativas da defesa técnica no curso do inquérito policial, mas não comprometem o caráter inquisitório da fase investigativa preliminar. “A possibilidade de assistência mediante a apresentação de razões e quesitos não se confunde com o direito subjetivo de intimação prévia e tempestiva da defesa técnica acerca do calendário de inquirições a ser definido pela autoridade policial”, afirmou.

Na análise do recurso de agravo, que começou a ser julgado em outubro de 2018, o ministro Fachin citou precedentes da Corte em seu voto pelo desprovimento do recurso e manteve sua posição pelo indeferimento do pedido. Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos.

Ao apresentar voto na sessão desta terça (12), o Mendes acompanhou o relator, mas fez algumas ressalvas quanto aos fundamentos. O ministro explicou que a persecução penal é formada por quatro fases: investigação preliminar, etapa intermediária, juízo oral e juízo recursal. Cada uma tem função distinta, de modo a se estabelecer um sistema racional no processo penal, mas todas integram o processo penal de modo amplo. Para o ministro, a fase de inquérito policial insere-se claramente na lógica fundamental do processo penal, e os direitos fundamentais precisam ser resguardados em todas as fases, inclusive na investigação preliminar.

O ministro lembrou ainda que, no julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, se posicionou no sentido de que a defesa deve ter acesso, em prazo razoável, aos cadernos investigativos antes da data designada para o interrogatório do investigado e a todos os elementos de prova já formalmente incorporados, conforme previsto na Súmula Vinculante (SV) 14. Essas medidas, frisou, têm amparo nas garantias fundamentais à assistência técnica, ao contraditório e à ampla defesa, aplicáveis inclusive no âmbito administrativo. Por estes fundamentos, Mendes discordou do entendimento de que não se aplica a garantia do contraditório no âmbito do inquérito. O ministro lembrou, contudo, que o artigo 7º do Estatuto da OAB não estende a prerrogativa dos advogados de dar assistência durante o interrogatório de seus clientes aos depoimentos dos demais investigados e testemunhas, como acontece na ação penal. Nesse ponto, entendeu que pedido da defesa carece de fundamento legal e votou pelo desprovimento do agravo.

Os ministro Celso de Mello e Ricardo Lewandowski também acompanharam o relator pela negativa do recurso, mas concordaram com as ressalvas apresentadas pelo ministro Gilmar Mendes no sentido de que é possível reconhecer que há necessidade de observar contraditório no procedimento de investigação. “O investigado não é mero objeto de investigação; ele titulariza direitos oponíveis ao Estado”, frisou o ministro Celso de Mello. Para o decano, a alteração promovida no artigo 7º do Estatuto da OAB é de fundamental importância, pois estabelece como prerrogativa profissional do advogado o direito de assistir seus clientes investigados durante a apuração de infrações sob pena de nulidade absoluta. Ele lembra que a mudança na lei partiu da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

MB/AD

Processos relacionados: Pet 7612

04) Condenação com base em interrogatório "informal" - Descabimento - Direito ao silêncio - Inobservância - Ilegalidade:

DIREITO PROCESSUAL PENAL – NULIDADE

Direito ao silêncio e condenação com base em “interrogatório informal” - RHC 170843 AgR/SP

Resumo: Não se admite condenação baseada exclusivamente em declarações informais prestadas a policiais no momento da prisão em flagrante.

A Constituição Federal (1) impõe ao Estado a obrigação de informar ao preso seu direito ao silêncio não apenas no interrogatório formal, mas logo no momento da abordagem, quando recebe voz de prisão por policial, em situação de flagrante delito. Ademais, na linha de precedentes da Corte (2), a falta da advertência ao direito ao silêncio, no momento em que o dever de informação se impõe, torna ilícita a prova. Isso porque o privilégio contra a auto-incriminação (nemo tenetur se detegere), erigido em garantia fundamental pela Constituição, importou compelir o inquiridor, na polícia ou em juízo, ao dever de advertir o interrogado acerca da possibilidade de permanecer calado. Dessa forma, qualquer suposta confissão firmada, no momento da abordagem, sem observação ao direito ao silêncio, é inteiramente imprestável para fins de condenação e, ainda, invalida demais provas obtidas através de tal interrogatório. No caso, a leitura dos depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão da paciente demonstra que não foi observado o citado comando constitucional. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por maioria, negou provimento ao agravo regimental para restabelecer a sentença de primeiro grau. Vencido o ministro Nunes Marques.

(1) CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;”

(2) Precedentes citados: HC 80.949/RJ, relator Min. Sepúlveda Pertence (DJ de 14.12.2001); Rcl 33.711/SP, relator Min. Gilmar Mendes (DJe de 23.8.2019); RHC 192.798 AgR/SP, relator Min. Gilmar Mendes (DJe de 2.3.2021).

RHC 170843 AgR/SP, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento em 4.5.2021

(Fonte: Informativo de Jurisprudência n.º 1.016 do STF)

05) Coleta de provas pelos policiais -  Acesso aos dados de registros de ligações em celular apreendido com o acusado no momento do flagrante - Possibilidade - Diferença entre registros telefônicos e comunicação telefônica:

HABEAS CORPUS. NULIDADES: (1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; (2) ILICITUDE DA PROVA PRODUZIDA DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL; VIOLAÇÃO DE REGISTROS TELEFÔNICOS DO CORRÉU, EXECUTOR DO CRIME, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; (3) ILICITUDE DA PROVA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DE CONVERSAS DOS ACUSADOS COM ADVOGADOS, PORQUANTO ESSAS GRAVAÇÕES OFENDERIAM O DISPOSTO NO ART. 7º, II, DA LEI 8.906/96, QUE GARANTE O SIGILO DESSAS CONVERSAS. VÍCIOS NÃO CARACTERIZADOS. ORDEM DENEGADA. (...). 2. Ilicitude da prova produzida durante o inquérito policial - violação de registros telefônicos de corréu, executor do crime, sem autorização judicial. 2.1 Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação. 2.4 À guisa de mera argumentação, mesmo que se pudesse reputar a prova produzida como ilícita e as demais, ilícitas por derivação, nos termos da teoria dos frutos da árvore venenosa (fruit of the poisonous tree), é certo que, ainda assim, melhor sorte não assistiria à defesa. É que, na hipótese, não há que se falar em prova ilícita por derivação. Nos termos da teoria da descoberta inevitável, construída pela Suprema Corte norte-americana no caso Nix x Williams (1984), o curso normal das investigações conduziria a elementos informativos que vinculariam os pacientes ao fato investigado. Bases desse entendimento que parecem ter encontrado guarida no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei 11.690/2008, que deu nova redação ao art. 157 do CPP, em especial o seu § 2º. 3. Ilicitude da prova das interceptações telefônicas de conversas dos acusados com advogados, ao argumento de que essas gravações ofenderiam o disposto no art. 7º, II, da Lei n. 8.906/96, que garante o sigilo dessas conversas. 3.1 Nos termos do art. 7º, II, da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. 3.2 Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. 3.3 Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-advogado. 3.4 Não cabe aos policiais executores da medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida. 4. Ordem denegada.

STF - HC 91867, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 24/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 19-09-2012 PUBLIC 20-09-2012.

06) Interrogatório policial realizado durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão - Descabimento - Denominação de "entrevista" - Impossibilidade - Direito ao silêncio - Reconhecida violação a garantias constitucionais:

Notícias do STF - Publicada em 11/06/2019 - 21h25

2ª Turma anula interrogatório realizado durante busca e apreensão na casa de investigado

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou parcialmente procedente a Reclamação (RCL) 33711 para anular interrogatório de Ailson Martins de Lima, ex-diretor de Manutenção e Abastecimento da Saneamento Básico do Município de Mauá/SP (Sama), realizado durante a realização de busca e apreensão em sua residência. A decisão foi tomada na sessão extraordinária realizada na manhã desta terça-feira (11). Na reclamação, a defesa alegou que a atuação policial violou o direito constitucional de seu cliente à não autoincriminação, ratificado pelo STF no julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 395 e 444, referentes à inconstitucionalidade da condução coercitiva de réu ou investigado para prestar depoimento. Portanto, pediu a nulidade do interrogatório, denominado pela autoridade policial como “entrevista”, e a declaração de ilicitude do material probatório produzido a partir do conteúdo extraído do telefone celular, que, segundo sustenta, foi irregularmente apreendido. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes (relator) considerou que houve violação do direito ao silêncio e à não autoincriminação na realização de “interrogatório travestido de ‘entrevista’”, documentada durante a diligência. Na ocasião, destacou o relator, não se assegurou ao investigado o direito à prévia consulta a seu advogado e nem se certificou o direito ao silêncio e a não produzir provas contra si mesmo. “Observo, portanto, a violação às decisões proferidas nas ADPFs 395 e 444, na medida em que utilizada técnica de interrogatório forçado proibida a partir do julgamento das referidas ações. Há a evidente tentativa de contornar a proibição estabelecida pelo STF em favor dos direitos e garantias fundamentais das pessoas investigadas”, afirmou. Nesse ponto, o colegiado, por unanimidade, seguiu o voto do relator. Mendes também votou pela invalidade da apreensão e do acesso aos dados, mensagens e informações contidas no aparelho celular. Ele entendeu que não houve prévia e fundamentada decisão judicial que justificasse a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida. Os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski, por sua vez, verificaram que o ato de apreensão do aparelho estava amparado pela decisão que havia determinado a busca e apreensão. Nessa parte, no entanto, o relator ficou vencido.

Operação Trato Feito

O ex-diretor de Manutenção e Abastecimento da autarquia municipal foi afastado do cargo por determinação do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) em decorrência da Operação Trato Feito, deflagrada pela Polícia Federal para apurar fraudes em licitações e pagamento de propina na administração municipal em Mauá.

Processo relacionado: Rcl 33711

(Fonte: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=413792&tip=UN)

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL – PROVA  (Informativo n.º 944 do STF - Segunda Turma)

Reclamação: mandado de busca e apreensão, entrevista e acesso a celular “smartphone”

A Segunda Turma, por maioria, deu provimento parcial a reclamação para declarar a nulidade de entrevista realizada por autoridade policial no interior da residência do reclamante, durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão, em flagrante contrariedade à autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 395 e 444. O reclamante sustentava ter sido interrogado por delegado de polícia sem ser informado de seu direito ao silêncio, além de ter-lhe sido exigida a senha de acesso ao seu smartphone, em flagrante violação ao princípio da não autoincriminação. No tocante à entrevista, prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator). Em seu pronunciamento, observou que, nas ADPFs 395 e 444, a Corte decidiu pela impossibilidade de se conduzir coercitivamente os suspeitos de prática de crimes com o intuito de serem interrogados. Entre o rol de direitos potencialmente atingidos pela conduta, destacou a violação do direito à não autoincriminação e ao silêncio. Aduziu que a contrariedade aos referidos direitos ocorreu com a realização de interrogatório travestido de entrevista, na medida em que utilizada técnica de interrogatório forçado, proibida a partir do julgamento das ADPFs 395 e 444. Observou que o reclamante foi interrogado em ambiente intimidatório que diminuiria o direito à não incriminação. Além disso, na entrevista formalmente documentada, não se oportunizou ao sujeito da diligência o direito à prévia consulta a advogado, tampouco certificou-se, no respectivo termo, o direito ao silêncio e à não produção de provas contra si mesmo, nos termos da legislação e dos aludidos precedentes. Por sua vez, o ministro Edson Fachin ressaltou não se tratar, na hipótese, de aderência estrita de um conjunto de elementos fáticos que se submeteriam à vedação da condução coercitiva. Contudo, assinalou a existência de desrespeito ao direito de não incriminação e ao direito ao silêncio, conforme os fatos apresentados. Isso ocorreu mediante metodologia atípica e descolada de qualquer fundamentação que permita esse tipo de procedimento. Quanto à conduta adotada pela autoridade policial em relação ao celular do reclamante, o colegiado, por maioria, não vislumbrou suporte à sua alegação no sentido de que teria sido coagido ou obrigado a fornecer a senha. Explicitou inexistir expressamente, na decisão judicial, a expressão “autorizo a apreensão do aparelho celular”. Entretanto, o ato decisório conteve o deferimento ao acesso, à exploração e cópia do conteúdo de mídias, dispositivos e dados armazenados em nuvem, bem assim a determinação de que deveria constar, expressamente no mandado, a autorização de acesso a dados telefônicos e telemáticos armazenados nos dispositivos eletrônicos apreendidos. O ministro Ricardo Lewandowski acrescentou não ser possível exigir do juiz que minudencie todos os objetos de interesse do processo que serão encontrados no local da busca e apreensão. No ponto, ficou vencido o ministro relator, que reconheceu, de ofício [Código de Processo Penal (CPP), art. 654, § 2º (1)], a inconstitucionalidade e a ilegalidade da apreensão e do acesso aos dados, às mensagens e informações contidas no aparelho celular, haja vista a ausência de prévia e fundamentada decisão judicial que justificasse a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida.

(1) CPP: “Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. (...) § 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.”

​STF - Rcl 33711/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 11.6.2019. (Rcl-33711)

Art. 7.º Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

 

Legislação correlata:

- Vide: Lei n.º 13.819/2019.

"Art. 7.º  Nos casos que envolverem investigação de suspeita de suicídio, a autoridade competente deverá comunicar à autoridade sanitária a conclusão do inquérito policial que apurou as circunstâncias da morte."

 

 

Art. 8.° Havendo prisão em flagrante, será observado o disposto no Capítulo II do Título IX deste Livro.

Art. 7.º do CPP

Art. 9.° Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.

Notas:

- Vide: Súmula Vinculante 14 do STF - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência da Polícia Judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

- Sobre acesso à defesa aos elementos e dados colhidos na investigação, vide anotações à Súmula Vinculante n.º 14 do STF.

Jurisprudência:

01) Denúncia anônima - Desnecessidade de registro pela autoridade policial - Prescindível o conhecimento da fonte ou o motivo que ensejou a delação:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS DENUNCIADO COM TRÊS SUPOSTOS ASSOCIADOS POR CORRUPÇÃO PASSIVA. (...) MEIOS DE PROVA QUE DESPONTAM COMO FONTES AUTÔNOMAS E INDEPENDENTES, INVIABILIZADO QUALQUER RECONHECIMENTO DE ALEGADO VÍCIO NOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS ORIGINAIS. DEFESA QUE SE DEMITE DE INDICAR QUAIS SERIAM AS PROVAS SUPOSTAMENTE CONTAMINADAS PELAS NULIDADES QUE AFIRMA EXISTIREM E QUE INTERESSEM À AÇÃO PENAL EM CURSO. FATOS QUE NÃO CONDIZEM COM ESTE PROCESSO. ALEGAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DEFLAGRADA POR DENÚNCIA ANÔNIMA. IRRELEVÂNCIA DA ARGUIÇÃO. FUNDADA SUSPEITA DE POSSE DE ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DE CORPO DE DELITO. CRIME PERMANENTE. BUSCA E APREENSÃO LEGITIMADA. DESNECESSIDADE DE FORMALIZAÇÃO ESCRITA DE DENÚNCIA ORIUNDA DE FONTE HUMANA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 9.º DO CPP A ATOS QUE ANTECEDEM A INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO. (...)

52. Mesmo que se admitisse que a origem da informação foi anônima, fato esse que perde contorno de relevo diante da averiguação prévia dos dados atinentes à chegada do avião, é desimportante que a fonte de informação tenha origem desconhecida, quando as circunstâncias apontam para a ocorrência atual de crime. Nesse sentido, remansosa jurisprudência: (HC 345.424/SC, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 18/08/2016, DJe 16/09/2016; HC 345.547/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016; STJ, Sexta Turma, HC 67.555/GO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 23/2/2016); HC n. 273.141/SC, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 5/11/2013; STJ, AGREsp 1423159, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe 17/11/2015.

53. Ainda que se pudesse dar respaldo à afirmação da defesa de FERNANDO PIMENTEL, no sentido de que já se tinha conhecimento da prática de crime naquele momento, aí se estaria diante do denominado flagrante esperado, igualmente válido e apto a respaldar a busca e as apreensões.

54. Não existe, à luz do que se examinou, vício processual ocasionado por investigação desencadeada por denúncia anônima. Fundada suspeita de posse de elementos característicos de corpo de delito

55. Diante da existência de concreto e justificado receio de que as pessoas estivessem na posse de papéis que constituíam corpo de delito, não havia necessidade de mandado judicial para legitimar a busca e apreensão, o que a faz válida, independentemente de haver ou não sido lavrado auto de prisão em flagrante. Nesse sentido, o STF, no RHC 117.767/DF, Rel. Ministro Teori Zavascki, j. em 11/10/2016. 56.Já não fosse suficiente para autorizar a busca pessoal e veicular a situação de flagrância, também era inconteste a existência de fundada suspeita de que os passageiros do avião estivessem na posse de papéis (em sentido amplo, hoje incluindo registros em agendas eletrônicas, telefones com conteúdo diverso, notas fiscais, encartes de propaganda e tabelas com informações variadas) que caracterizam corpo de delito.

57. É inexorável a conclusão de que a busca e apreensão realizada nos passageiros e na aeronave foi plenamente legítima, tanto pela situação de flagrância, quanto pela mais do que plausível suspeita da posse de elementos característicos de corpo de delito e de dinheiro obtido por meio criminoso. E tanto é assim que a apreensão motivou a deflagração de Inquérito, cuja Portaria de instauração elenca como razões o fato de os viajantes não apresentaram justificativas plausíveis para o transporte do dinheiro em mãos, em vez de utilizarem o sistema financeiro, e a existência de informação de que "um dos envolvidos possui condenação por tráfico de drogas e outro foi citado por fontes abertas (jornais, revistas e sites) como participante de casos de desvio de recursos públicos".

58. Nenhuma ilicitude a ser declarada, portanto. Desnecessidade de formalização escrita de denúncia oriunda de fonte humana. Procedimento não exigido por lei ou ato normativo. Alegação de FERNANDO DAMATA PIMENTEL

59. Sustenta-se que há nulidade advinda da não formalização de denúncia alegadamente anônima. Não está claro nos autos o modo como a informação sobre o pouso do avião em que o dinheiro era transportado chegou à Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal. Consta apenas a notícia de que ela foi repassada tanto pelo Ministério Público Federal quanto pela Superintendência da Polícia Federal em Belo Horizonte.

60. É para a instauração do Inquérito Policial que se exigem averiguações preliminares e indícios mínimos da ocorrência do delito. E isso, tal como anteriormente exposto, adveio das circunstâncias da apreensão, da existência de dinheiro cuja origem os passageiros, indagados, não souberam explicar de modo satisfatório, dos antecedentes criminais dos ocupantes do avião e daquilo que a imprensa havia publicado sobre um deles. Bem satisfazem a necessidade de instauração da investigação as notícias veiculadas na imprensa sobre Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, facilmente localizáveis em qualquer sítio de busca na internet, especialmente a datada de 17/4/2012, na Revista Veja. Conforme se vê, havia informação jornalística de que um dos passageiros abordados enriquecia vertiginosamente, manipulava licitações e tinha envolvimento com espionagem. Foram justamente essas notícias que levantaram suspeitas sobre Benedito, conforme constou da Portaria de instauração do Inquérito: "Considerando que um dos envolvidos possui condenação por tráfico de drogas e outro foi citado por fontes abertas (jornais, revistas e sites) como participante de casos de desvio de recursos públicos;".

61. Em relação à afirmada denúncia anônima que noticiava flagrante, diferentemente do que ocorre para a instauração do Inquérito ou para a adoção de providências cautelares de outra ordem, a formalização dos informes advindos de fonte humana é desnecessária e não se coaduna com a sistemática vigente, de informações recebidas pelo "disque-denúncia" ou por outros meios de coleta de elementos informais. O propósito que imbuiu eventual delator não é fator relevante e não há ato normativo que exija que informações que desencadeiem averiguações prévias sejam formalizadas. Isso porque a maneira como a informação chega à Autoridade Policial é desinfluente. Tomando ela conhecimento da existência de um crime - quanto mais em situação de flagrância -, é seu dever proceder ao exame da veracidade da notícia, inclusive para evitar a perda da oportunidade. Rememorando-se que, aqui, nem sequer se pode afirmar que tenha havido a denúncia anônima preconizada pela defesa de FERNANDO PIMENTEL. Portanto, nulidade não há em decorrência da não formalização de uma suposta delação anônima, para fins de início de coleta de informações preliminares. Pontuo a inaplicabilidade do artigo 9.º do CPP ("Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.") à situação em trato, como defendeu Fernando Damata Pimentel, porque tal dispositivo versa sobre as formalidades do Inquérito Policial, não sobre procedimentos que são a ele preliminares e que podem ou não justificar a instauração da persecução. (...)

(STJ - APn 843/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 06/12/2017, DJe 01/02/2018)

Art. 9.º do CPP

Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

§ 1.° A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente.

§ 2.° No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas.

§ 3.° Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz.

 

Legislação correlata:

- Vide:

"Art. 51 da Lei de Drogas.  O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto.

Parágrafo único.  Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária."

- Vide: Lei sobre organizações criminosas.

"Art. 22 da Lei n.º 12.850/2013.  Os crimes previstos nesta Lei e as infrações penais conexas serão apurados mediante procedimento ordinário previsto no Decreto-Lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), observado o disposto no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único.  A instrução criminal deverá ser encerrada em prazo razoável, o qual não poderá exceder a 120 (cento e vinte) dias quando o réu estiver preso, prorrogáveis em até igual período, por decisão fundamentada, devidamente motivada pela complexidade da causa ou por fato procrastinatório atribuível ao réu."

- Vide:

"Art. 66 da Lei 5.010/66. O prazo para conclusão do inquérito policial será de 15 dias, quando o indiciado estiver prêso, podendo ser prorrogado por mais 15 dias, a pedido, devidamente fundamentado, da autoridade policial e deferido pelo Juiz a que competir o conhecimento do processo.

Parágrafo único. Ao requerer a prorrogação do prazo para conclusão do inquérito, a autoridade policial deverá apresentar o prêso ao Juiz."

- Vide: 

"Art. 10 da Lei n.º 1.521/51 (Lei de Usura). Terá forma sumária, nos termos do Capítulo V, Título II, Livro II, do Código de Processo Penal, o processo das contravenções e dos crimes contra a economia popular, não submetidos ao julgamento pelo júri.

§ 1º. Os atos policiais (inquérito ou processo iniciado por portaria) deverão terminar no prazo de 10 (dez) dias.

§ 2º. O prazo para oferecimento da denúncia será de 2 (dois) dias, esteja ou não o réu preso.

§ 3º. A sentença do juiz será proferida dentro do prazo de 30 (trinta) dias contados do recebimento dos autos da autoridade policial (art. 536 do Código de Processo Penal).

§ 4º. A retardação injustificada, pura e simples, dos prazos indicados nos parágrafos anteriores, importa em crime de prevaricação (art. 319 do Código Penal)."

Notas:

- Via de regra, em se tratando de réu preso o prazo é de 10 dias. Se for réu solto, o prazo passa para é 30 dias. É chamado prazo impróprio, pois a lei não traz conseqüências para o descumprimento. Tratam-se de prazos processuais, ou seja, não se conta o primeiro dia. Contudo, há que diga que é prazo penal. 

- Obs.: Quando se trata de prazo de prisão, no entanto, o cômputo se dá como prazo penal, incluindo o primeiro dia. Ex.: Qual o melhor horário para ser preso em uma prisão temporária? Um pouco antes da meia-noite, pois transcorridos poucos minutos o indivíduo já terá cumprido um dia de prisão. 

- No caso de réu preso, se ultrapassar esses limites legais, caso reste caracterizado um excesso abusivo, não justificado pelas circunstâncias do delito e ou por pluralidade de réus (por exemplo), será caso de relaxamento da prisão por excesso de prazo, sem prejuízo da continuidade do processo.

Art. 10 do CPP

Art. 11. Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova, acompanharão os autos do inquérito.

Art. 11 do CPP

Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra.

 

Jurisprudência:

01) Impossibilidade de condenação com base apenas na prova colhida no inquérito:

 

CONDENAÇÃO. PROVA. INQUÉRITO.

O acórdão condenatório proferido pelo TJ lastreou-se apenas em provas colhidas no inquérito.

Porém a função do inquérito, como se sabe, é de fornecer elementos tendentes à abertura da ação penal (vide Exposição de Motivos do CPP, arts. 12 e 155, desse mesmo código, este último na redação que lhe deu a Lei n. 11.690/2008), pois, conforme vetusta doutrina, a prova, para que tenha valor, deve ser feita perante o juiz competente, mediante as garantias de direito conferidas aos indiciados e de acordo com as prescrições estabelecidas em lei.

Assim, o inquérito toma feitios de instrução provisória, cabendo à acusação fazer a prova no curso da instrução criminal ou formação da culpa, atenta ao contraditório: é trabalho da acusação transformar os elementos do inquérito em elementos de convicção do juiz.

Dessarte, a condenação deve fundar-se, sobretudo, nos elementos de convicção da fase judicial, o que não ocorreu na hipótese.

Precedentes citados: HC 112.577-MG, DJe 3/8/2009; HC 24.950-MG, DJe 4/8/2008, e HC 56.176-SP, DJ 18/12/2006.

STJ - HC 148.140-RS, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 7/4/2011.

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Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial:

I - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos;

II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público;

III - cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias;

IV - representar acerca da prisão preventiva.

Legislação correlata:

- Vide: Art. 6.º do Código de Processo Penal - Providências ao tomar conhecimento do ilícito.

- Vide anotações na Lei Maria da Penha sobre incumbências da autoridade policial no atendimento à vítima de violência doméstica.

- Vide:

"Art. 6º da Lei n.º 1.521-51. Verificado qualquer crime contra a economia popular ou contra a saúde pública (Capítulo III do Título VIII do Código Penal) e atendendo à gravidade do fato, sua repercussão e efeitos, o juiz, na sentença, declarará a interdição de direito, determinada no art. 69, IV, do Código Penal, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, assim como, mediante representação da autoridade policial, poderá decretar, dentro de 48 (quarenta e oito) horas, a suspensão provisória, pelo prazo de 15 (quinze) dias, do exercício da profissão ou atividade do infrator."

​- Vide: Lei n.º 14.022/2020, que alterou a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

- Vide arts. 311 e seguintes do Código de Processo Penal - Prisão provisória.

Jurisprudência:

01) Indiciamento – Possibilidade de afastamento cautelar de magistrado (servidores) indiciados:

 

INQUÉRITO. AFASTAMENTO CAUTELAR. MAGISTRADOS. (Informativo n.º 439 do STJ)

Componentes do Tribunal Regional Eleitoral e desembargadores (da ativa e aposentado) sofrem investigação para esclarecer fortes indícios de “venda” de decisões judiciais. Nesse contexto, dada a excepcionalidade da hipótese, a Corte Especial, por maioria, entendeu afastar cautelarmente os indiciados de seus cargos (com exceção, evidentemente, do magistrado já aposentado), sem prejuízo do percebimento de seus subsídios. O voto vencido entendia que o afastamento de magistrado apenas pode dar-se com a aceitação da denúncia. Anote-se que, apesar de ser inquérito sujeito ao sigilo, entendeu-se que a deliberação sobre os afastamentos se desse com a presença da audiência.

STJ - Inq 558-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/6/2010.

02) Afastamento cautelar de conselheiro do Tribunal de Contas – Prazo excessivo – Habeas corpus concedido:

 

Medida cautelar de afastamento de cargo público e cabimento de “habeas corpus” - 1

A 2ª Turma iniciou julgamento de “habeas corpus” impetrado em face de decisão do STJ que determinara o afastamento do ora paciente de suas funções de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Amapá, além do impedimento de sua entrada nas dependências da referida corte de contas, a proibição de utilização de veículos e de recebimento de vantagens decorrentes do efetivo exercício no cargo, como passagem aérea, diárias, ajuda de custo, telefone e quaisquer outros bens do tribunal, até a apreciação de denúncia oferecida em seu desfavor.

O impetrante sustenta que: a) a decisão seria nula, visto que o afastamento por prazo indeterminado não teria sido requerido pelo Ministério Público; b) o afastamento do cargo se daria por prazo desproporcional, e, portanto, seria verdadeira antecipação de pena; c) a medida não seria necessária, tendo em conta a conclusão das investigações; e d) o ato coator seria baseado exclusivamente na gravidade do delito.

O Ministro Gilmar Mendes (relator) concedeu a ordem para desconstituir a decisão do STJ no ponto em que fora determinado o afastamento do paciente do cargo, além de impostas outras medidas cautelares.

Primeiramente, rejeitou questão preliminar relativa à suposta inadequação da via eleita em razão de não haver, no caso, ameaça à liberdade de locomoção do paciente. Afirmou que inexistiria divergência teórica quanto ao fato de o “habeas corpus” se destinar a proteger o indivíduo contra qualquer medida restritiva à liberdade de ir, vir e permanecer (CF, art. 5º, LXVIII). Ademais, a jurisprudência do STF seria prevalecente no sentido de que o aludido remédio constitucional teria como escopo a proteção da liberdade de locomoção. Seu cabimento teria parâmetros constitucionalmente estabelecidos, justificando-se a impetração sempre que alguém sofresse, ou se achasse ameaçado de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de ir e vir, por ilegalidade ou abuso de poder. Porém, a despeito da força que essa interpretação teria assumido na sua jurisprudência, o STF, quando do julgamento do HC 90.617/PE (DJe de 7.3.2008), decidira reintegrar magistrado afastado do cargo por período além do razoável por força de decisão em processo criminal. Dada a configuração fática daquele caso — constrangimento ilegal decorrente de mora na prestação jurisdicional no âmbito processual penal; persistência do afastamento cautelar em razão do recebimento da denúncia pelo STJ; e afastamento do paciente por lapso temporal excessivo —, a ação de “habeas corpus” seria a via processual adequada para o pleito. Portanto, apesar das decisões em sentido contrário, se o afastamento imposto decorresse de decisão em processo penal ou investigação criminal, e houvesse dúvida quanto à justeza do tempo, seria cabível o “habeas corpus”, porquanto se trataria, na hipótese, de um tipo de restrição associada a processo criminal ou investigação criminal. Não se trataria, portanto, de usar o referido “writ” constitucional para outro objeto diferente daquilo que a Constituição preconizaria. HC 121089/AP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2.12.2014.  (HC-121089)

Medida cautelar de afastamento de cargo público e cabimento de “habeas corpus” - 2

No mérito, o relator asseverou que o afastamento do paciente do cargo perduraria por mais de quatro anos, tendo-se iniciado em 10.9.2010, interrompido este período por apenas 31 dias. A acusação fora formalizada em 13.4.2012, sem que sua admissão tivesse sido analisada. Apesar da complexidade da investigação e da posterior acusação que levara ao afastamento, este último já perduraria além do aceitável.

No referido precedente — HC 90.617/PE —, consignara-se que o prazo de dois anos, para além do qual o STF teria dado por configurado “excesso de prazo gritante” para prisões, poderia ser transportado para as medidas cautelares de afastamento de cargo ou de função pública. No caso em análise, mesmo que descontada a fase de investigação, o referido prazo estaria ultrapassado. Há mais de dois anos teria sido superada a fase de acusação e resposta na ação penal, a pender a análise da admissibilidade da acusação, e nada indicaria demora imputável à defesa. Além disso, não haveria sequer sinalização de data para julgamento pelo STJ. Ou seja, existiria justo receio de que a medida tendesse a se tornar perene.

Em seguida, pediu vista dos autos a Ministra Cármen Lúcia.

STF - HC 121089/AP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2.12.2014.  (HC-121089)

03) Inquérito policial - Peça informativa - Princípio da ampla defesa - Não aplicação:

 

Notícias do STJ - Publicada em 22/02/2010 - 08h57 – HC 91903 - Decisão:

STJ considera legal o recolhimento de provas contra Gil RugaiA Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a validade do recolhimento de provas técnicas contra Gil Greco Rugai, acusado dos assassinatos do pai e da madrasta, ocorridos em 2004, em São Paulo. A perícia teria comprovado que a marca do chute dado em uma porta do apartamento das vítimas é de um dos pés de Rugai.

No habeas corpus apresentado ao STJ, a defesa do acusado alegou constrangimento ilegal pelo fato de não ter se manifestado oportunamente quando o laudo foi entregue, já depois de iniciada a ação penal. Também questionou o fato de Rugai ter sido submetido a exames (radiografias e ressonância magnética nos pés e tornozelos) no Instituto de Ortopedia e Traumatologia da Universidade de São Paulo (USP). Segundo a defesa, houve cerceamento na elaboração prévia de quesitos defensivos, o que feriu o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Por unanimidade, a Quinta Turma rejeitou todos argumentos da defesa. O relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, esclareceu que o princípio da ampla defesa não cabe na fase de inquérito policial, que se constitui apenas como peça informativa e não probatória; e que apesar de ter sido concluído já com a ação penal em curso, a perícia foi iniciada durante o inquérito.

O ministro ressaltou, ainda, que não há ilegalidade nos exames médicos periciais feitos em Gil Rugai, pois ele esteve o tempo todo acompanhado por sua advogada, que poderia ter lhe orientado a não se submeter a tais exames que visavam confirmar se a marca deixada na porta da sala de TV das vítimas era compatível com o pé do acusado.

Relembre

O estudante foi denunciado pelo homicídio do pai, Luis Carlos Rugai, e da madrasta, Alessandra de Fátima Trotino, supostamente em razão de desentendimentos sobre desfalques na empresa da família, a “Referência Filmes”. Gil Rugai chegou a estar preso entre 2004 e 2006, mas foi colocado em liberdade pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Art. 13 do CPP1
Art. 13-A do CPP

Art. 13-A. Nos crimes previstos nos arts. 148, 149 e 149-A, no § 3.º do art. 158 e no art. 159 do Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e no art. 239 da Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderá requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

Parágrafo único. A requisição, que será atendida no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, conterá: (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

I - o nome da autoridade requisitante; (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

II - o número do inquérito policial; e (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

III - a identificação da unidade de polícia judiciária responsável pela investigação. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

 

Legislação correlata:

- Vide: Art. 6.º do Código de Processo Penal - Ações da autoridade policial ao tomar conhecimento da prática da infração penal.

- Vide: Art. 5.º, inc. XII, da CF/1988 - Quebra de sigilo.

- Vide: Estatuto da Criança e do Adolescente.

- Vide: Dec. n.º 9.603/2018 - Regulamenta a Lei n.º 13.431/2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência.

- Vide: Lei n.º 10.446/2002 - Competência da Polícia Federal para investigar determinados crimes quando houver repercussão interestadual ou internacional.

- Vide: Lei n.º 12.735/2012 - Delegacias digitais.

"Art. 4.º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado."

- Vide: Decreto n.º 10.364/2020 - Promulga o Acordo de Cooperação Estratégica entre a República Federativa do Brasil e o Serviço Europeu de Polícia, firmado em Haia, em 11 de abril de 2017.

​- Vide: Lei n.º 14.022/2020, que alterou a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

Jurisprudência:

01) Requisição de dados cadastrais a operadora de telefonia por delegado de polícia ou membro do Ministério Público - Desnecessidade de ordem judicial - Constitucionalidade da norma:

Notícias do STF - 18/04/2024

STF valida repasse de dados telefônicos, sem autorização judicial, para investigação de crimes graves

Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Edson Fachin, de que são permitidas apenas informações que possibilitem localizar vítimas ou suspeitos, sem quebra de sigilo das comunicações.

Por maioria de votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quinta-feira (18), a constitucionalidade de normas do Código de Processo Penal (CPP) que autorizam delegados de polícia e membros do Ministério Público a requisitarem o repasse de dados cadastrais a operadoras de celular, mesmo sem autorização judicial. Os dados devem ser utilizados exclusivamente em investigações sobre os crimes de cárcere privado, redução à condição análoga à de escravo, tráfico de pessoas, sequestro relâmpago, extorsão mediante sequestro e envio ilegal de criança ao exterior. Também por maioria, o Tribunal validou a regra que permite a requisição, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática para que disponibilizem imediatamente sinais, informações e outros dados que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos desses mesmos delitos. Além disso, o colegiado manteve a eficácia da norma que autoriza a requisição direta dos dados às empresas, pelas autoridades competentes, caso a autorização judicial não seja emitida no prazo de 12 horas. A regra prevê que, para períodos superiores a 30 dias, a ordem judicial será obrigatória.

Acesso irrestrito a dados

A questão foi discutida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5642, apresentada pela Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel). De acordo com a associação, as regras (artigos 13-A e 13-B) do CPP esvaziariam a proteção constitucional à privacidade e ao sigilo das comunicações e dão “verdadeira carta em branco” para que as autoridades possam acessar todos os dados de cidadãos tidos como suspeitos.

Sigilo das comunicações preservado

Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Edson Fachin. Em voto apresentado em junho de 2021, ele observou que a Constituição assegura a inviolabilidade do sigilo das comunicações, mas autoriza a edição de leis que afastem o sigilo para a realização de investigações criminais. No caso específico das normas questionadas, ele observou que a permissão para acesso sem autorização judicial é referente apenas a dados que auxiliem as investigações, como os cadastrais, ou os que possibilitem a localização de vítimas ou suspeitos. No mesmo sentido, ele salientou que a lei restringe os pedidos apenas a crimes graves, expressamente listados na norma.

Processo relacionado: ADI 5642

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=532701)

Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderão requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

§ 1.º Para os efeitos deste artigo, sinal significa posicionamento da estação de cobertura, setorização e intensidade de radiofrequência. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

§ 2.º Na hipótese de que trata o caput, o sinal: (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

I - não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, que dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei; (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

II - deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período; (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

III - para períodos superiores àquele de que trata o inciso II, será necessária a apresentação de ordem judicial. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

§ 3.º Na hipótese prevista neste artigo, o inquérito policial deverá ser instaurado no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado do registro da respectiva ocorrência policial.(Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

§ 4.º Não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade competente requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz. (Incluído pela Lei n.º 13.344, de 2016) (Vigência)

Legislação correlata:

- Vide: Art. 6.º do Código de Processo Penal - Ações da autoridade policial ao tomar conhecimento da prática da infração penal.

- Vide: Decreto n.º 10.364/2020 - Promulga o Acordo de Cooperação Estratégica entre a República Federativa do Brasil e o Serviço Europeu de Polícia, firmado em Haia, em 11 de abril de 2017.

Jurisprudência:

01) Disponibilização de sinais, informações e outros dados - Requisição por delegado de polícia ou membro do Ministério Público - Ausência de manifestação judicial em 12 horas - Desnecessidade de ordem judicial - Constitucionalidade da norma:

Notícias do STF - 18/04/2024

STF valida repasse de dados telefônicos, sem autorização judicial, para investigação de crimes graves

Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Edson Fachin, de que são permitidas apenas informações que possibilitem localizar vítimas ou suspeitos, sem quebra de sigilo das comunicações.

Por maioria de votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quinta-feira (18), a constitucionalidade de normas do Código de Processo Penal (CPP) que autorizam delegados de polícia e membros do Ministério Público a requisitarem o repasse de dados cadastrais a operadoras de celular, mesmo sem autorização judicial. Os dados devem ser utilizados exclusivamente em investigações sobre os crimes de cárcere privado, redução à condição análoga à de escravo, tráfico de pessoas, sequestro relâmpago, extorsão mediante sequestro e envio ilegal de criança ao exterior. Também por maioria, o Tribunal validou a regra que permite a requisição, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática para que disponibilizem imediatamente sinais, informações e outros dados que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos desses mesmos delitos. Além disso, o colegiado manteve a eficácia da norma que autoriza a requisição direta dos dados às empresas, pelas autoridades competentes, caso a autorização judicial não seja emitida no prazo de 12 horas. A regra prevê que, para períodos superiores a 30 dias, a ordem judicial será obrigatória.

Acesso irrestrito a dados

A questão foi discutida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5642, apresentada pela Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel). De acordo com a associação, as regras (artigos 13-A e 13-B) do CPP esvaziariam a proteção constitucional à privacidade e ao sigilo das comunicações e dão “verdadeira carta em branco” para que as autoridades possam acessar todos os dados de cidadãos tidos como suspeitos.

Sigilo das comunicações preservado

Prevaleceu o entendimento do relator, ministro Edson Fachin. Em voto apresentado em junho de 2021, ele observou que a Constituição assegura a inviolabilidade do sigilo das comunicações, mas autoriza a edição de leis que afastem o sigilo para a realização de investigações criminais. No caso específico das normas questionadas, ele observou que a permissão para acesso sem autorização judicial é referente apenas a dados que auxiliem as investigações, como os cadastrais, ou os que possibilitem a localização de vítimas ou suspeitos. No mesmo sentido, ele salientou que a lei restringe os pedidos apenas a crimes graves, expressamente listados na norma.

Processo relacionado: ADI 5642

(Fonte: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=532701)

13-B

Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.

Legislação correlata:

- Vide: Lei n.º 11.340/2006 - Lei Maria da Penha - Medidas protetivas.

​- Vide: Lei n.º 14.022/2020, que alterou a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher e de enfrentamento à violência contra crianças, adolescentes, pessoas idosas e pessoas com deficiência durante a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

14

Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir defensor.  (Acrescentado pela Lei n.º 13.964/2019)

§ 1.º Para os casos previstos no caput deste artigo, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação.

§ 2.º Esgotado o prazo disposto no § 1.º deste artigo com ausência de nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado.

§ 3.º Havendo necessidade de indicação de defensor nos termos do § 2.º deste artigo, a defesa caberá preferencialmente à Defensoria Pública, e, nos locais em que ela não estiver instalada, a União ou a Unidade da Federação correspondente à respectiva competência territorial do procedimento instaurado deverá disponibilizar profissional para acompanhamento e realização de todos os atos relacionados à defesa administrativa do investigado.  (Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)       (Vigência)

§ 4.º A indicação do profissional a que se refere o § 3.º deste artigo deverá ser precedida de manifestação de que não existe defensor público lotado na área territorial onde tramita o inquérito e com atribuição para nele atuar, hipótese em que poderá ser indicado profissional que não integre os quadros próprios da Administração.  (Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)       (Vigência)

§ 5.º Na hipótese de não atuação da Defensoria Pública, os custos com o patrocínio dos interesses dos investigados nos procedimentos de que trata este artigo correrão por conta do orçamento próprio da instituição a que este esteja vinculado à época da ocorrência dos fatos investigados.    (Incluído pela Lei n.º 13.964, de 2019)       (Vigência)

§ 6.º As disposições constantes deste artigo se aplicam aos servidores militares vinculados às instituições dispostas no art. 142 da Constituição Federal, desde que os fatos investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem.

Notas: 

- Vide: Enunciado n.º 05 do GNCCRIM/CNPG: (ART. 14-A, § 1.º) Não obstante a terminologia utilizada no § 1.º, admite-se qualquer forma efetiva de comunicação do investigado acerca da instauração de procedimento investigatório criminal (pessoal, email, carta, whatsapp, SMS ou qualquer outro meio de comunicação), aplicando-se, analogicamente, o teor do § 4.º do artigo 19 da Resolução CNMP n.º 181. (Fonte: https://www.cnpg.org.br/)

- Vide: Enunciado n.º 06 do GNCCRIM/CNPG: (ART. 14-A, § 2.º) O conhecimento da investigação em curso preconizado no art. 14-A não veda que o presidente da investigação delimite o acesso do investigado ou seu defensor aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências (art. 9.º,  §4.º, Res. 181/CNMP). (Fonte: https://www.cnpg.org.br/)

- O artigo trouxe uma inovação ao processo penal, pois determina que deverá ser citado o servidor público (conforme referido no caput) no caso de ser instaurado em seu desfavor um procedimento investigatório. Na hipótese de o investigado não constituir advogado de sua confiança, a lei determina que a autoridade responsável pelo expediente investigatório faça uma comunicação formal (intimação) à instituição que ele estava vinculado ao tempo do fato apurado, a fim de que esta providencie a indicação de defensor.

14-A

Art. 15. Se o indiciado for menor, ser-lhe-á nomeado curador pela autoridade policial.

15

Art. 16. O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia.

16

Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito.

Legislação correlata:

- Acerca do arquivamento do inquérito policial, vide anotações ao art. 28 do CPP.

- Vide: Art. 28-A do CPP - Acordo de não persecução.

17

Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.

 

Jurisprudência:

01) Arquivamento de inquérito em trâmite no STF - Foro por prerrogativa de função - Declinação de competência para Justiça Eleitoral - Crime do art. 350 do Código Eleitoral - Medida não adotada - Investigação sem perspectiva de resolução - Arquivamento pelo próprio STF para evitar violação à duração razoável do processo e à dignidade da pessoa humana:

DIREITO PROCESSUAL PENAL - ARQUIVAMENTO

Declinação de competência e arquivamento de inquérito

A Segunda Turma, por maioria, rejeitou pedido de declinação de competência e determinou o arquivamento de inquérito, na forma do art. 231, § 4º, “e”, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), observado o disposto no art. 18 do Código de Processo Penal (CPP).

Investigava-se a prática do crime previsto no art. 350 do Código Eleitoral (CE), em razão da suposta omissão de doações na prestação de contas de campanha eleitoral. A Procuradoria-Geral da República (PGR) pugnou pela declinação da competência à Justiça Eleitoral, tendo em vista o entendimento adotado na AP 937 QO. O colegiado afirmou que o STF, quando do julgamento da AP 937 QO, alterou entendimento anterior e passou a compreender que a prerrogativa de foro dos parlamentares federais é limitada aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Naquela oportunidade, deliberou-se que a nova linha interpretativa deveria ser aplicada imediatamente aos processos em curso, com a ressalva dos atos já praticados e das decisões anteriormente proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na jurisprudência pretérita. Ainda naquele julgamento, o Plenário decidiu que, terminada a instrução processual, a ação penal deveria ser julgada pelo próprio Tribunal, independentemente de se tratar de hipótese que determinaria a baixa dos autos. Em julgado posterior, esse entendimento foi estendido aos inquéritos (Inq 4.641). Nessa linha, o art. 231, § 4º, “e”, do RISTF, dispõe que o relator deve determinar o arquivamento do inquérito quando verificar a ausência de indícios mínimos de autoria ou materialidade, nos casos em que forem descumpridos os prazos para a instrução. Outrossim, a pendência de investigação, por prazo irrazoável, sem amparo em suspeita contundente, ofende o direito à razoável duração do processo [CF, art. 5º, LXXVIII] e a dignidade da pessoa humana [CF, art. 1º, III]. No caso, após mais de um ano de investigação, não há nenhuma perspectiva de obtenção de prova suficiente da existência do fato criminoso. Apuram-se pagamentos em dinheiro em setembro de 2010. A versão dos colaboradores é de que o dinheiro teria sido entregue em hotel na zona sul de São Paulo. Entretanto, o inquérito sequer conseguiu localizar o estabelecimento no qual o pagamento teria ocorrido. Assim, a declinação da competência em investigação fadada ao insucesso representaria apenas protelar o inevitável, violados o direito à duração razoável do processo e a dignidade da pessoa humana. Vencido o ministro Celso de Mello, que acolheu o pleito da PGR para reconhecer a declinação da competência penal originária do STF e, em consequência, determinar a remessa dos autos à Justiça Eleitoral.

STF - Informativo n.º 912 - Segunda Turma - Inq 4420/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 21.8.2018. (Inq-4420)

02) Arquivamento de inquérito em trâmite no STF - Reforma da decisão para realização de novas diligências - Possibilidade:

Arquivamento de inquérito e novas diligências instrutórias (Informativo n.º 924 do STF - Segunda Turma)

A Segunda Turma, por maioria e com base em voto médio, deu parcial provimento a agravo regimental para reformar a decisão monocrática que arquivou o inquérito com fundamento na ausência de indícios mínimos de autoria ou materialidade, e por descumprimento dos prazos para a instrução do inquérito, conforme previsto no art. 231, § 4º, e, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) (1).

Prevaleceu o voto do ministro Ricardo Lewandowski, que determinou o retorno dos autos ao Parquet para que conclua diligências de caráter instrutório, ainda pendente de execução, no prazo de sessenta dias, sob pena de arquivamento do inquérito, na forma do art. 231, § 4º, e, do RISTF (1), e sem prejuízo do art. 18 do Código de Processo Penal (CPP) (2).

No inquérito, investiga-se o envolvimento de senador em crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro relacionados ao suposto recebimento de vantagens indevidas por meio de empresas contratadas por sociedade de economia mista.

Como resultado das investigações, a Polícia Federal, em relatório, representou pelo arquivamento do inquérito, em razão da falta de prova da existência dos delitos. A Procuradoria-Geral da República (PGR), no entanto, após sucessivas prorrogações do prazo de vista para que apresentasse suas conclusões, requereu apenas a baixa dos autos, com fundamento na diretriz adotada pelo STF no julgamento da AP 937 QO/RJ. Diante desse cenário, o ministro Gilmar Mendes (relator) proferiu decisão para rejeitar o pedido de declinação da competência e determinar o arquivamento do inquérito.

No recurso de agravo, a PGR postulou a reforma da decisão de arquivamento. Arguiu que o trancamento de inquérito apenas pode se dar em hipóteses excepcionais de evidente constrangimento ilegal, o que não ocorreu no caso. No mais, reiterou o pedido de remessa dos autos à Justiça Federal, porque o foro por prerrogativa de função somente alcançaria os atos cometidos por parlamentares durante o exercício do cargo e quando relacionados às funções desempenhadas.

O pedido para prosseguir com as investigações baseou-se em informações bancárias estrangeiras que indicam a evasão de valores supostamente recebidos pelo investigado em esquema de propinas instalado em diretoria de estatal. Essas informações, obtidas por meio de acordo de cooperação jurídica internacional, somente teriam se tornado acessíveis em momento posterior à recomendação de arquivamento do inquérito feita pela autoridade policial.

Para a Turma, é necessário, ao menos, colher-se a posição conclusiva do órgão ministerial acerca do que se contém nos autos, apontando concretamente os novos elementos de prova a serem considerados. O Ministério Público poderá tanto trazer aos autos os documentos obtidos a partir da cooperação internacional, devidamente traduzidos, quanto apresentar suas conclusões.

De posse de manifestação mais objetiva da PGR, com provas suficientes para eventual continuidade das investigações, o STF poderá avaliar se é mesmo o caso de arquivamento ou se a investigação deve prosseguir e em que condições.

Vencidos os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que mantiveram o arquivamento do inquérito. Consideraram que o Judiciário tem o poder e o dever de controlar a investigação preliminar e limitar eventuais abusos na persecução penal, resguardados os direitos e garantias fundamentais.

Para eles, a investigação em análise carece de justa causa para seu prosseguimento, conforme conclusão firmada na própria representação pelo arquivamento do inquérito feita pela autoridade policial. Ainda que declarações de colaboradores sejam suficientes para o início de investigações, tais elementos não podem legitimar persecuções eternas, sem que sejam corroborados por provas independentes.

Os novos elementos probatórios apontados pela acusação dizem respeito a informações que já foram objeto de outro inquérito, há anos arquivado. A declinação da competência em uma investigação que já deveria estar concluída representaria apenas protelar a solução, violando o direito à duração razoável do processo e à dignidade da pessoa humana.

Vencidos parcialmente os ministros Edson Fachin e Celso de Mello, que proveram o agravo para remeter os autos à primeira instância.

(1) RISTF: “Art. 231. (...) § 4º O Relator tem competência para determinar o arquivamento, quando o requerer o Procurador-Geral da República ou quando verificar: (...) e) ausência de indícios mínimos de autoria ou materialidade, nos casos em que forem descumpridos os prazos para a instrução do inquérito ou para oferecimento de denúncia. ”

(2) CPP: “Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. ”

​STF - Inq 4244/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 20.11.2018. (Inq-4244)

18

Art. 19. Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.

Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes. (Redação dada pela Lei n.º 12.681, de 2012)

Nota:

- Vide: Súmula Vinculante 14 do STF - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência da Polícia Judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

20

Art. 21. A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despacho nos autos e somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir.

Parágrafo único. A incomunicabilidade, que não excederá de 03 (três) dias, será decretada por despacho fundamentado do Juiz, a requerimento da autoridade policial, ou do órgão do Ministério Público, respeitado, em qualquer hipótese, o disposto no artigo 89, inciso III, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei n.º 4.215, de 27 de abril de 1963) (Redação dada pela Lei n.º 5.010, de 30.5.1966)

Art. 22. No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição.

 

Art. 23. Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado.

TÍTULO III

DA AÇÃO PENAL

 

Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

§ 1.º No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. (Parágrafo único renumerado pela Lei n.º 8.699, de 27.8.1993)

§ 2.º Seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal será pública. (Incluído pela Lei n.º 8.699, de 27.8.1993)

 

Legislação correlata:

- Vide Lei n.º 8.038/90: Normas procedimentais; rito das ações originárias do STJ e STF.

"Art. 1.º - Nos crimes de ação penal pública, o Ministério Público terá o prazo de 15 (quinze) dias para oferecer denúncia ou pedir arquivamento do inquérito ou das peças informativas. (Vide Lei n.º 8.658, de 1993)"

- Vide: Lei n.º 8.658/1993.

"Art. 1.° As normas dos arts. 1.° a 12, inclusive, da Lei n.° 8.038, de 28 de maio de 1990, aplicam-se às ações penais de competência originária dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, e dos Tribunais Regionais Federais."

- Vide: Art. 109 da Constituição Federal/1988 - Crimes de competência da Justiça Federal.

24

Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

Legislação correlata:

- Vide:

"Irretratabilidade da representação

Art. 102 do CP - A representação será irretratável depois de oferecida a denúncia.  (Redação dada pela Lei n.º 7.209, de 11.7.1984)"

- Vide:

"Art. 16 da Lei Maria da Penha.  Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público."

Nota:

- Sobre retratação da representação, vide anotações ao art. 102 do CP.

Art. 25 CPP

Art. 26. A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial.

Legislação correlata:

- Vide: Decreto n.º 3.688/1941 - Lei das Contravenções Penais.

Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

Art. 27
Art. 28 do CPP

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei.  (Redação dada pela Lei n.º 13.964/2019) (Dispositivo legal suspenso sine die para eficácia, conforme ADI n.º 6.305)  (Vide ADI 6.298)   (Vide ADI 6.300)       (Vide ADI 6.305)

§ 1.º Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica.   (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)

§ 2.º Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios, a revisão do arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial. (Incluído pela Lei n.º 13.964/2019)

Redação anterior:

"Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender."

Legislação correlata:

- Vide: Arts. 17 e 18, ambos do Código de Processo Penal.

"Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito."

"Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia."

- Vide: Código Eleitoral.

"Art. 357. Verificada a infração penal, o Ministério Público oferecerá a denúncia dentro do prazo de 10 (dez) dias.

§ 1.º Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento da comunicação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa da comunicação ao Procurador Regional, e êste oferecerá a denúncia, designará outro Promotor para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.

§ 2.º A denúncia conterá a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

§ 3.º Se o órgão do Ministério Público não oferecer a denúncia no prazo legal representará contra êle a autoridade judiciária, sem prejuízo da apuração da responsabilidade penal.

§ 4.º Ocorrendo a hipótese prevista no parágrafo anterior o juiz solicitará ao Procurador Regional a designação de outro promotor, que, no mesmo prazo, oferecerá a denúncia.

§ 5.º Qualquer eleitor poderá provocar a representação contra o órgão do Ministério Público se o juiz, no prazo de 10 (dez) dias, não agir de ofício."

- Vide: Resolução n.º 181/2017 do CNMP - Dispõe sobre instauração, tramitação e arquivamento do procedimento investigatório criminal a cargo do Ministério Público. Também disciplina a requisição de documentos, oitiva de testemunhas, acesso ao expediente, persecução patrimonial, publicidade dos atos e peças, direito das vítimas, prevê o acordo de não-persecução penal, dentre outros assuntos.

Notas:

- Vide: Súmula 696 do STF – Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.

- Vide: Súmula 524 do STF - Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.

- Vide: Súmula 337 do STJ – É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.

- Vide: Súmula 243 do STJ - O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

Temas relevantes antes da entrada em vigor da Lei n.º 13.964/2019:

- O mesmo procedimento que tínhamos no art. 28 do CPP podia ser adotado caso o juiz não acolhesse a representação do Ministério Público ou do Delegado para aplicar o perdão judicial a acusado-colaborador, com base na Lei n.º 12.850/2013 (Organização Criminosa).

- Se o juiz não concordasse com o pedido de arquivamento (no âmbito da Justiça Estadual), ele aplicava o art. 28 do CPP, e remetia os autos ao Procurador-Geral de Justiça. Quando recebia esses autos o Procurador-Geral de Justiça tinha 4 opções: a) Designar outro promotor para oferecer a denúncia (para maioria da doutrina, esse outro promotor seria uma longa manus do Procurador-Geral de Justiça, então ele ficaria obrigado a oferecer a denúncia; b) Requisitar diligências; c) Oferecer a denúncia; ou d) Insistir no arquivamento.

- Princípio da Devolução: Conforme estava expresso no art. 28 do CPP em sua redação pretérita, decorria da possibilidade de o juiz devolver as peças ao Procurador-Geral de Justiça, ao qual compete a decisão final sobre o oferecimento ou não da denúncia. Neste caso, o magistrado exercia uma função anômala de fiscal do princípio da obrigatoriedade. Obs.: Sempre foi questionável essa fiscalização pelo juiz, pois a sua recusa em arquivar poderia apontar para um prejulgamento, com condenação do acusado no futuro.

Jurisprudência:

 

01) Absolvição sumária por atipicidade da conduta não se confunde com arquivamento:

 

Suspensa ação penal contra envolvido em acidente de trânsito com vítima fatal:

Notícias do STF - Publicada quinta-feira, 08 de julho de 2010

Processo penal em curso na 1.ª Vara Criminal de Pinheiros (SP) contra C.M.M. teve o trâmite suspenso pelo ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão ocorreu no Habeas Corpus (HC) 104095, impetrado pela defesa do estudante, envolvido em um acidente de trânsito ocorrido na capital de São Paulo e que resultou em uma vítima fatal. O acidente se deu na madrugada de 27 de abril do ano passado, quando os automóveis conduzidos pelo estudante, um Audi A6, e pela vítima (supostamente alcoolizada, segundo laudo necroscópico), colidiram na Avenida Marginal Pinheiros, na capital paulista. O caso foi investigado pelo 89º Distrito Policial da capital. A defesa argumenta que o processo foi arquivado “por falta de elementos suficientes à persecução penal”, mas que, depois, a família da vítima constituiu advogado e apresentou uma “suposta testemunha” que teria atestado que o estudante conduzia seu veículo acima da velocidade permitida para a via e que teria causado o acidente. A partir daí, o inquérito policial foi desarquivado e o estudante foi denunciado pelo Ministério Público paulista por homicídio culposo (sem intenção de matar). A defesa argumentou que o desarquivamento do inquérito seria indevido, “em razão da inexistência de provas novas e, ainda, porque o arquivamento havia sido determinado por conta da atipicidade da conduta”.

Concessão

Conforme o ministro Marco Aurélio, ao decretar o arquivamento dos autos, o juízo teria cometido uma impropriedade porque citou, na decisão, o artigo 18 do Código de Processo Penal (CPP), e a fundamentou com base em outro dispositivo, o artigo 386, também do CPP. “Não coabitam o mesmo teto jurídico a atipicidade e a regra do artigo 18 referido”, disse. O ministro ressaltou que a segurança jurídica deve ser observada e explicou que o artigo 386, incisos III e IV, preceitua que o juiz absolverá o réu quando o fato não constituir infração penal ou estiver provado não haver concorrido para a infração. O artigo 18 do mesmo Código revela ser possível o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária por falta de base para a denúncia. As investigações somente podem ser reabertas se a autoridade policial tiver notícias de outras provas. De acordo com o relator, a decisão do magistrado é contraditória, pois se refere à absolvição sumária do envolvido, com base no artigo 18 do CPP. “Costumo dizer que decisão genérica não atende à exigência constitucional atinente à fundamentação”, salientou. A motivação, conforme o ministro Marco Aurélio, teria se dado nos termos do parecer do MP. “Assim, também adentrou o campo da incongruência, lançando, a um só tempo, dado relativo à absolvição sumária do envolvido e a ressalva, com esta incompatível, quanto ao disposto no artigo 18 do Código de Processo Penal”, disse. Segundo o ministro, “a referência, pura referência, sem elementos maiores, de modo contraditório, ao artigo 18 do Código de Processo Penal, não infirma o que assentado no tocante à atipicidade”. Dessa forma, o ministro Marco Aurélio deferiu a liminar para suspender, até o julgamento de Habeas Corpus em trâmite no Tribunal de Justiça de São Paulo, a ação penal ajuizada contra o estudante perante a 1ª Vara Criminal do Foro Regional de Pinheiros, comarca da capital, no estado de São Paulo.

 

DECISÃO INQUÉRITO – ARQUIVAMENTO – INFRAÇÃO PENAL – CONCLUSÃO SOBRE A ATIPICIDADE – RESSALVA DO ARTIGO 18 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – PROCESSO – AÇÃO PENAL – SOBRESTAMENTO – HABEAS CORPUS – LIMINAR DEFERIDA. 1. A Assessoria prestou as seguintes informações: Consta da inicial que o paciente, em 27 de abril de 2009, envolveu-se em acidente automobilístico, vindo a falecer Luiz Ferreira Alves. Instaurado inquérito policial, concluiu-se pela atipicidade da conduta, porquanto revelado que a vítima estava embriagada e trafegava em baixa velocidade, ziguezagueando. O procedimento foi arquivado (folha 90 do apenso 1). Familiares da vítima, no entanto, constituíram advogado, indicaram testemunha e apresentaram laudo elaborado por perito particular, cuja conclusão indicava o paciente como responsável pelo acidente em razão de suposto excesso de velocidade. O Ministério Público estadual preconizou o desarquivamento dos autos. A autoridade policial procedeu a nova investigação e, com base nos elementos probatórios produzidos, foi oferecida denúncia imputando ao paciente a prática de homicídio culposo: de modo imprudente, ele teria conduzido o veículo Audi A6 com desatenção, não percebendo a presença do automóvel da vítima que seguia à frente, na faixa de rolamento, tendo invadido parte da referida pista, colidindo com a traseira do veículo guiado pela vítima. Por entender indevido o desarquivamento do inquérito e estar submetido a constrangimento ilegal em virtude do ajuizamento da ação penal, a defesa impetrou habeas no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo visando ao trancamento porque a reabertura do inquérito - arquivado sob o fundamento da atipicidade da conduta - teria implicado violação ao princípio da coisa julgada material. O pedido de liminar, circunscrito à determinação de sobrestamento do processo-crime, não foi acolhido (folha 47). A defesa do paciente formalizou idêntica medida no Superior Tribunal de Justiça, com as mesmas causas de pedir e pedidos. O Ministro Arnaldo Esteves Lima, a quem foi distribuído o Habeas Corpus nº 168.676-SP, indeferiu liminarmente o pleito formulado na inicial, assentando a manifesta incompetência da Corte para conhecer e julgar a pretensão, tendo em conta o óbice previsto no Verbete nº 691 da Súmula do Supremo (folha 69). Neste processo, os impetrantes sustentam cuidar-se de hipótese na qual se admite a relativização do enunciado do Verbete nº 691 da Súmula deste Tribunal, por entender ser ilegal o ato mediante o qual determinado o desarquivamento do inquérito e o consequente ajuizamento da ação penal. Reiterando as causas de pedir, requerem a concessão de liminar, visando o sobrestamento da Ação Penal nº 969/2007, em curso no Juízo da 1ª Vara Criminal do Foro Regional de Pinheiros, Comarca da Capital, Estado de São Paulo, até o julgamento do habeas em curso no Tribunal de Justiça – de nº 990.10.174813-4. No mérito, pleiteiam a confirmação da medida acauteladora que vier a ser deferida. 2. Observem a segurança jurídica. O artigo 386, incisos III e IV, preceitua que o juiz absolverá o réu quando o fato não constituir infração penal ou estar provado não haver concorrido para a infração. O artigo 18 do mesmo Código revela possível o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária por falta de base para a denúncia, abrindo-se margem a novas investigações se a autoridade policial tiver notícias de outras provas: Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. No caso, deu-se o arquivamento tendo em conta a manifestação do Ministério Público, do titular da ação penal, de folhas 88 e 89 do apenso 1. Na peça, consignou-se a versão segundo a qual o abalroamento teria sido inevitável porquanto o veículo em que estava a vítima trafegava em zigue-zague na pista, com velocidade reduzida. Apontou-se que o depoimento do paciente fora corroborado pelos relatos de cidadãos. Mencionou-se também o laudo necroscópico, que revelou haver álcool etílico no organismo da vítima, o que estaria a reforçar a narração dos fatos. Não teriam sido localizadas testemunhas presenciais destes. Então, formulou-se o pedido de arquivamento dos autos do inquérito nestes termos: “[...] em razão do fato descrito não ser típico, inexistindo, portanto, elementos suficientes a persecução penal [...]” (folha 89). Mas fez-se a promoção, como que polivalente, mediante a seguinte cláusula: “[...] sempre com a ressalva do artigo 18 do Código de Processo Penal”. Em síntese, após o Ministério Público afirmar que o fato descrito não seria típico, aspecto a levar à absolvição sumária do réu, aludiu o órgão ao artigo 18 do Código de Processo Penal. E o Juízo, em pronunciamento de simplicidade franciscana, endossou essa óptica: “Acolho a manifestação do digno representante do Ministério Público e determino, em consequência, o arquivamento dos autos, observadas as formalidades legais, ressalvado o disposto no artigo 18 do CPP” (folha 90). Costumo dizer que decisão genérica não atende à exigência constitucional atinente à fundamentação. Na espécie, o Juízo remeteu, em termos de premissas, em termos de economia processual, à manifestação do Ministério Público. Assim, também adentrou o campo da incongruência, lançando, a um só tempo, dado relativo à absolvição sumária do envolvido e a ressalva, com esta incompatível, quanto ao disposto no artigo 18 do Código de Processo Penal. Ora, não coabitam o mesmo teto jurídico a atipicidade e a regra do artigo 18 referido. Prevalece a óptica decorrente da explicitação dos fundamentos na peça do Ministério Público. Prevalece a visão de o fato descrito não ser típico, o que gera a absolvição, conforme já registrado, presente o artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal. A referência, pura referência, sem elementos maiores, de modo contraditório, ao artigo 18 do Código de Processo Penal não infirma o que assentado no tocante à atipicidade. 3. Defiro a medida acauteladora na forma em que pleiteada, ou seja, para suspender, até o julgamento do Habeas Corpus nº 990.10.174813-4, em tramitação no Tribunal de Justiça, o processo revelador da ação penal ajuizada contra o paciente, de nº 969/2007, em curso no Juízo da 1ª Vara Criminal do Foro Regional de Pinheiros, Comarca da Capital, Estado de São Paulo. 4. Colham o parecer da Procuradoria Geral da República. 5. Publiquem. Brasília – residência –, 22 de junho de 2010, às 10h45. Ministro MARCO AURÉLIO Relator
(STF - HC 104095, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 22/06/2010, publicado em DJe-118 DIVULG 28/06/2010 PUBLIC 29/06/2010)

 

02) Desarquivamento de inquérito policial no qual havia sido reconhecida excludente de ilicitude – Prova substancialmente nova – Possibilidade – Inexistência de coisa julgada material:

 

Desarquivamento de Inquérito Policial e Excludente de Ilicitude

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus no qual pleiteado o trancamento de ação penal instaurada a partir do desarquivamento de inquérito policial, em que reconhecida excludente de ilicitude. No caso, o citado inquérito apurava homicídio imputado ao paciente, delegado de polícia, e a outros policiais, sendo arquivado a pedido do Ministério Público do Estado do Espírito Santo, que reputara configurado o estrito cumprimento do dever legal. Passados dez anos da decisão judicial, fora instalado, pelo parquet, o Grupo de Trabalho para Repressão ao Crime Organizado - GRCO naquela unidade federativa — que dera origem, posteriormente, a Comissões Parlamentares de Inquérito em âmbito estadual e nacional —, cujos trabalhos indicariam que o paciente e os demais policiais não teriam agido em estrito cumprimento do dever legal, mas sim supostamente executado a vítima (“queima de arquivo”). A partir disso, novas oitivas das mesmas testemunhas arroladas no inquérito arquivado foram realizadas e o órgão ministerial, concluindo pela caracterização de prova substancialmente nova, desarquivara aquele procedimento, o que fora deferido pelo juízo de origem e ensejara o oferecimento de denúncia. A impetração alegava que o arquivamento estaria acobertado pelo manto da coisa julgada formal e material, já que reconhecida a inexistência de crime, incidindo o Enunciado 524 da Súmula do STF (“Arquivado o inquérito policial, por despacho do Juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.”). HC 95211/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 10.3.2009.

​Desarquivamento de Inquérito Policial e Excludente de Ilicitude - 2

O Min. Ricardo Lewandowski suscitou questão de ordem no sentido de que os autos fossem deslocados ao Plenário, porquanto transpareceria que as informações a